O som foi
o mais tênue dos clincs, um raspar de aço em pedra. Levantou a
cabeça das patas, escutando, farejando a noite. A chuva do anoitecer
tinha despertado uma centena de cheiros adormecidos, tornando-os de
novo maduros e fortes. Grama e espinheiros, amoras silvestres
rachadas no chão, lama, minhocas, folhas apodrecendo, uma ratazana
que se arrastava pelos arbustos. Detectou o odor negro e felpudo da
pelagem do irmão e o forte e penetrante cheiro acobreado do esquilo
que tinha matado. Outros esquilos deslocavam-se pelos galhos sobre a
sua cabeça, cheirando a pelo molhado e a medo, raspando a casca das
árvores com suas pequenas garras. O barulho soara um pouco como
aquilo.
Voltou a
ouvi-lo, clinc, e raspar. Aquele som fê-lo levantar-se. As orelhas
espetaram-se e a cauda se ergueu. Uivou, um grito longo, profundo e
tremente, um uivo para acordar os adormecidos, mas as pilhas de rocha
do homem estavam escuras e mortas. Uma noite parada e úmida, uma
noite daquelas que empurram os homens para dentro de seus buracos. A
chuva tinha parado, mas os homens ainda se escondiam da umidade,
amontoados junto aos fogos em suas cavernas de pedra empilhada.
O irmão
chegou, deslizando por entre as árvores, deslocando-se quase tão
silenciosamente como outro irmão de que tinha uma vaga lembrança,
de muito tempo atrás, o que era branco com olhos de sangue. Os olhos
deste eram lagoas de sombras, mas o pelo na parte de trás do pescoço
estava eriçado. Também tinha ouvido os sons, e compreendia que
significavam perigo.
Dessa
vez, o clinc e o raspar foram seguidos por um som de arrastar e pelas
batidas rápidas e suaves de pés descalços em pedra. O vento trouxe
a mais ligeira lufada de um cheiro de homem que não conhecia.
Estranho. Perigo. Morte.
Correu na
direção do som, com o irmão correndo a seu lado. As tocas de pedra
ergueram-se à frente deles, com paredes escorregadias e úmidas.
Mostrou os dentes, mas o homem de rocha não ligou para ele. Um
portão erguia-se até bem alto, com uma serpente de ferro preta
enrolada em volta de barras e do umbral. Quando se atirou contra o
portão, ele estremeceu e a serpente tiniu, deslizou e aguentou.
Através das barras conseguia olhar pela longa cova de pedra que
corria entre os muros até o campo pedregoso que ficava na outra
ponta, mas não havia forma de passar.
Podia
forçar o focinho entre as barras, mas nada mais do que isso. Muitas
tinham sido as vezes que o irmão tentara quebrar entre os dentes os
ossos negros do portão, mas estes não se partiam. Tinham tentado
escavar por baixo deles, mas havia aí grandes pedras planas, meio
cobertas por terra e folhas caídas.
Rosnando,
começou a andar de um lado para o outro diante do portão, e depois
atirou-se de novo contra ele. Moveu-se um pouco e o atingiu.
Trancado, alguma coisa sussurrou. Acorrentado. A voz que não ouvia,
o odor sem cheiro. As outras passagens também estavam fechadas. Onde
se abriam portas nos muros de rocha do homem, a madeira era grossa e
forte. Não existia saída.
Existe,
disse o sussurro, e pareceu poder ver a sombra de uma grande árvore
coberta de agulhas, nascendo inclinada da terra negra e elevando-se
até dez vezes a altura de um homem. Mas, quando olhou em volta, não
estava lá. Do outro lado do bosque sagrado, a árvore sentinela,
rápido, rápido... Através das sombras da noite chegou um grito
abafado, abruptamente interrompido.
Depressa,
muito depressa, rodopiou e saltou na direção das árvores, com
folhas úmidas restolhando sob as patas, galhos chicoteando-o quando
passava correndo por eles. Ouvia o irmão seguindo-o de perto.
Mergulharam sob a árvore-coração e em torno da lagoa fria, através
dos arbustos de amoras silvestres, sob um emaranhado de carvalhos,
freixos e espinheiros, até o outro lado do bosque... e ali estava
ela, a sombra que ele vislumbrara sem ver, a árvore inclinada
apontada para os telhados. Sentinela, disse o pensamento. Lembrou-se
então de como era escalá-la. Agulhas por todo o lado, arranhando
seu rosto nu e caindo por sua nuca abaixo, seiva pegajosa nas mãos,
o aguçado cheiro de pinheiro que exalava. Era uma árvore fácil
para um garoto subir, inclinada como estava, torta, com os galhos tão
próximos uns dos outros que quase faziam uma escada, levando até o
telhado. Rosnando, farejou em volta da base da árvore, levantou uma
perna e marcou-a com um jato de urina. Um galho baixo roçou em seu
rosto, ele abocanhou-o, torcendo e puxando até que a madeira estalou
e se quebrou. Tinha a boca cheia de agulhas e do sabor amargo da
seiva. Sacudiu a cabeça e rosnou. O irmão sentou-se sobre os
quartos traseiros e ergueu a voz num uivo ululante, uma canção
negra de pesar. O caminho não era caminho algum. Eles não eram
esquilos, nem crias de homem, não podiam serpentear pelos troncos de
árvores acima, agarrando-se com suaves patas cor-de-rosa e pés
desajeitados. Eram corredores, caçadores, vagabundos.
Do outro
lado da noite, para lá da pedra que os cercava, os cães acordaram e
começaram a latir. Primeiro um, e logo outro, e depois todos, um
grande clamor. Eles também tinham sentido aquilo; o cheiro de
inimigos e medo. Uma fúria desesperada o preencheu, quente como a
fome. Afastou-se do muro com um salto, e penetrou nas árvores com
mais saltos, o pelo cinzento salpicado pelas sombras de galhos e
folhas... e então virou-se e correu de volta. Os pés voaram,
levantando folhas úmidas e agulhas de pinheiro, e por um momento era
um caçador, e um grande veado fugia à sua frente, conseguia vê-lo,
cheirá-lo, e correu em plena perseguição. O cheiro do medo fez seu
coração trovejar e saliva escorrer por suas mandíbulas. Chegou à
árvore inclinada em grandes passos e atirou-se pelo tronco acima,
com as garras arranhando a casca em busca de apoio. Saltou para cima,
para cima, dois saltos, três, quase sem parar, até se encontrar
entre os galhos mais baixos. Ramos emaranharam-se em seus pés e
chicotearam seus olhos, agulhas verde-acinzentadas espalharam-se
quando abriu caminho por entre elas, mordendo-as. Foi forçado a
diminuir o ritmo. Algo se prendeu ao seu pé e ele o libertou,
rosnando. O tronco estreitou-se por baixo dele, e tornou-se mais
íngreme, quase vertical, e úmido. A casca rasgava-se como pele
quando tentava prender nela as garras. Estava a um terço do caminho,
a metade, a mais da metade, o telhado estava quase ao seu alcance...
e então pôs um pé na madeira molhada e sentiu-o escorregar em sua
curvatura, e de repente estava deslizando, tropeçando. Uivou de medo
e fúria, caindo, caindo, e contorceu-se enquanto o chão
aproximava-se rapidamente, decidido a quebrá-lo...
Então,
Bran deu por si de novo na cama em seu solitário quarto da torre,
emaranhado nas mantas, respirando com força.
-Verão -
gritou. - Verão - seu ombro parecia doer, como se tivesse caído
sobre ele, mas
sabia que
era apenas o fantasma do que o lobo estava sentindo. Jojen disse a
verdade. Sou um lobisomem.
Ouvia lá
fora os tênues latidos de cães. O mar chegou. Flui sobre as
muralhas, tal como Jojen viu. Bran agarrou a barra sobre sua cabeça
e puxou-se, gritando por ajuda. Ninguém veio, e após um momento
lembrou-se de que ninguém viria. Tinham tirado a guarda de sua
porta. Sor Rodrik necessitara de todos os homens em idade de lutar em
que pudesse pôr as mãos, e Winterfell fora deixado apenas com uma
guarnição simbólica.
Os outros
tinham partido havia oito dias, seiscentos homens de Winterfell e dos
castros mais próximos. Cley Cerwyn seguia com mais trezentos, para
se juntar a eles durante a marcha, e Meistre Luwin mandara corvos à
frente deles, convocando recrutas de Porto Branco, das terras
acidentadas e até de lugares localizados nas profundezas da mata de
lobos. Praça de Torrhen estava sob o ataque de um monstruoso chefe
de guerra qualquer chamado Dagmer Boca Rachada.
A Velha
Ama dizia que ele não podia ser morto, que um dia um inimigo havia
cortado sua cabeça ao meio com um machado, mas Dagmer era tão feroz
que se limitara a unir de novo as duas metades, segurando-as até
sarar. Poderia Dagmer ter ganhado? Praça de Torrhen ficava a muitos
dias de viagem de Winterfell, mas, mesmo assim...
Bran
puxou-se para fora da cama, deslocando-se de barra em barra até
chegar às janelas. Os dedos atrapalharam-se um pouco ao abrir as
venezianas. O pátio estava vazio, e todas as janelas que conseguia
ver estavam negras. Winterfell dormia.
- Hodor!
- gritou para baixo, o mais alto que pôde. Hodor estaria dormindo
acima dos estábulos, mas se gritasse com força suficiente talvez
ouvisse, ele ou alguém. - Hodor, vem depressa! Osha! Meera, Jojen,
alguém! - Bran pôs as mãos em volta da boca. - HOOOOODOOOOOR!
Mas
quando a porta se abriu com estrondo atrás de si, o homem que entrou
não era ninguém que ele conhecesse. Usava um justilho de couro com
discos de ferro sobrepostos a ele, e trazia uma adaga numa mão e um
machado preso às costas.
- O que
você quer? - Bran perguntou, com medo. - Este é o meu quarto. Saia
daqui.
Theon
Greyjoy seguiu o homem para dentro do quarto.
- Não
vamos lhe fazer mal, Bran.
- Theon?
- Bran sentiu-se tonto de alívio. - Foi Robb que o enviou? Ele
também está aqui?
- Robb
está longe. Não pode ajudá-lo agora.
-
Ajudar-me? - sentia-se confuso. - Não me assuste, Theon.
- Agora
sou Príncipe Theon. Somos ambos príncipes, Bran. Quem sonharia com
tal coisa? Mas eu tomei seu castelo, meu príncipe.
-
Winterfell? - Bran sacudiu a cabeça. - Não, não podia fazer isso.
-
Deixe-nos, Werlag - o homem com a adaga se retirou. Theon sentou-se
na cama. - Mandei quatro homens escalarem as muralhas com pequenos
ganchos de abordagem e cordas, e eles abriram uma porta falsa para o
resto entrar. Meus homens estão tratando dos seus agora mesmo.
Garanto-lhe, Winterfell é meu.
Bran não
compreendia.
- Mas
você era protegido do pai.
- E agora
você e o seu irmão são meus protegidos. Assim que a luta acabar,
meus homens vão reunir o resto do seu povo e levá-lo para o Grande
Salão. Você e eu vamos falar com eles. Você vai lhes dizer que me
rendeu Winterfell, e ordenar-lhes que sirvam e obedeçam ao seu novo
senhor tal como faziam com o antigo.
- Não
farei isso - Bran respondeu. - Lutaremos contra você e vamos
expulsá-lo. Nunca me rendi, não pode me obrigar a dizer que fiz
isso.
- Isso
não é uma brincadeira, Bran, portanto, não se faça de garotinho
comigo, não tolerarei. O castelo é meu, mas essas pessoas ainda são
suas. Se o príncipe quiser mantê-las a salvo, é bom que faça o
que lhe é dito - levantou-se e se dirigiu à porta. - Alguém virá
vesti-lo e levá-lo ao Grande Salão. Pense cuidadosamente no que
quer dizer.
A espera
fez com que Bran se sentisse ainda mais impotente. Ficou sentado no
banco da janela, olhando para torres escuras e muralhas negras como a
sombra. Uma vez pensou ouvir gritos vindos de trás do Salão dos
Guardas, e algo que podia ser sido o estrondo de espadas, mas não
tinha as orelhas de Verão para escutar, nem seu focinho para
cheirar. Acordado, continuo quebrado, mas quando durmo, quando sou o
Verão, posso correr, lutar, escutar e cheirar.
Esperava
que Hodor viesse até ele, ou talvez uma das criadas, mas quando a
porta voltou a se abrir, era Meistre Luwin trazendo uma vela.
- Bran,
você... sabe o que aconteceu? Foi-lhe dito? - o homem tinha a pele
aberta por cima do olho esquerdo e corria sangue por esse lado de seu
rosto.
- Theon
veio aqui. Disse que Winterfell agora era dele.
O meistre
apoiou a vela e limpou o sangue da bochecha.
-
Atravessaram o fosso a nado. Escalaram as muralhas com ganchos e
cordas. Desceram molhados e pingando, de aço na mão - sentou-se na
cadeira junto à porta, enquanto mais sangue escorria. - Alebelly
estava no portão, surpreenderam-no no torreão e mataram-no. Haynead
também está ferido. Tive tempo para enviar dois corvos antes de
irromperem em meus aposentos. A ave para Porto Branco conseguiu
escapar, mas abateram a outra com uma flecha - o meistre fitou as
esteiras. - Sor Rodrik levou demasiados de nossos homens, mas eu sou
tão culpado quanto ele. Nunca previ esse perigo, nunca...
Jojen o
previu, pensou Bran.
- É
melhor que me ajude a me vestir.
- Sim, é
verdade - na pesada arca reforçada com ferro que se encontrava aos
pés da cama de Bran o meistre encontrou roupas de baixo, calções e
uma túnica. - É o Stark em Winterfell, e o herdeiro de Robb. Tem de
parecer principesco - juntos, vestiram-no de forma condizente com um
senhor.
- Theon
quer que eu entregue o castelo - disse Bran enquanto o meistre
prendia o manto com sua presilha favorita de prata e azeviche, em
forma de cabeça de lobo.
- Não há
vergonha nisso. Um senhor deve proteger o seu povo. Lugares cruéis
geram povos cruéis, Bran, lembre-se disso ao lidar com esses homens
de ferro. O senhor seu pai fez o que pôde para amaciar Theon, mas
temo que tenha sido pouco, e tarde demais.
O homem
de ferro que veio buscá-lo era atarracado, de tronco volumoso, com
uma barba negra como carvão que cobria metade de seu peito. Carregou
o rapaz com bastante facilidade, embora não parecesse contente com a
tarefa. O quarto de Rickon ficava meia espiral mais abaixo. O
garotinho de quatro anos estava rabugento por ter sido acordado.
- Quero
minha mãe. Quero minha mãe. E também o Cão Felpudo.
- Sua mãe
está longe, meu príncipe - Meistre Luwin puxou um roupão sobre a
cabeça da criança. - Mas eu estou aqui, e Bran também - deu a mão
a Rickon e levou-o para a rua.
Embaixo,
encontraram Meera e Jojen sendo tirados do quarto por um homem careca
cuja lança era um metro mais alta do que ele. Quando Jojen olhou
para Bran, seus olhos eram lagoas verdes cheias de tristeza. Outros
homens de ferro tinham acordado os Frey.
- Seu
irmão perdeu seu reino - disse o Pequeno Walder a Bran. - Agora não
é nenhum príncipe, só um refém.
- E você
também - Jojen retrucou e eu, e todos nós.
- Ninguém
estava falando com você, papa-rãs.
Um dos
homens de ferro seguiu à frente deles, levando uma tocha, mas a
chuva tinha recomeçado e rapidamente a apagou. Enquanto se
apressavam em cruzar o pátio, conseguiam ouvir os lobos gigantes
uivando no bosque sagrado. Espero que Verão não tenha se machucado
ao cair da árvore.
Theon
Greyjoy estava sentado no cadeirão dos Stark. Tirara o manto. Sobre
uma fina camisa de cota de malha usava uma capa negra ornamentada com
a lula gigante dourada da sua Casa. As mãos pousavam nas cabeças de
lobo esculpidas nas extremidades dos largos braços de pedra do
cadeirão.
- Theon
está sentado na cadeira de Robb - disse Rickon,
- Quieto,
Rickon - Bran conseguia sentir a ameaça que os rodeava, mas seu
irmão era jovem demais. Alguns archotes tinham sido acendidos e fogo
ardia na lareira grande, mas a maior parte do salão permanecia nas
trevas. Não havia lugar para sentar, com os bancos empilhados junto
às paredes, e o pessoal do castelo estava em pé, em pequenos
grupos, sem se atrever a falar. Viu a Velha Ama, abrindo e fechando a
boca sem dentes. Hayhead foi trazido por dois dos outros guardas, com
uma atadura manchada de sangue enrolada em volta do tronco nu. Poxy
Tim chorava desconsoladamente, e Beth Cassei gritava de medo.
- O que
temos aqui? - perguntou Theon, referindo-se aos Reed e aos Frey.
- Estes
são protegidos da Senhora Catelyn, ambos com o nome de Walder Frey -
explicou Meistre Luwin. - E este é Jojen Reed e a irmã Meera, filho
e filha de Howland Reed da Atalaia da Água Cinzenta, que vieram
renovar os votos de lealdade a Winterfell.
- Alguns
diriam que a hora foi mal escolhida - Theon replicou - embora não
para mim. Aqui estão e aqui ficarão - liberou o cadeirão. - Traga
o príncipe para cá, Lorren - o homem da barba negra soltou Bran na
pedra como se fosse um saco de aveia.
Ainda
havia pessoas sendo trazidas para o Grande Salão, incitadas com
gritos e cabo de lanças, Gage e Osha vieram das cozinhas, manchados
com a farinha da produção do pão matinal. Mikken, arrastaram entre
pragas. Farlen entrou coxeando, lutando para apoiar Palia. O vestido
dela tinha sido rasgado de cima a baixo; segurava-o com um punho
fechado e caminhava como se cada passo fosse uma agonia. Septão
Chayle correu para ajudar, mas um dos homens de ferro o jogou ao
chão.
O último
homem a ser obrigado a cruzar as portas foi o prisioneiro Fedor, cujo
mau cheiro o precedeu, acre e pungente. Bran sentiu o estômago
revirar-se com o cheiro que ele exalava.
-
Encontramos este trancado numa cela de torre - anunciou o homem que o
trazia, um jovem imberbe de cabelo ruivo e roupa encharcada, sem
dúvida um daqueles que tinham atravessado o fosso a nado. - Diz que
o chamam de Fedor.
- Não
sou capaz de imaginar por quê - Theon respondeu, sorrindo. - Cheira
sempre assim tão mal, ou acabou agora mesmo de foder um porco?
- Num
fodi ninguém desde que me apanharam, senhor. Meu nome verdadeiro é
Heke. Tava ao serviço do Bastardo do Forte do Pavor até que os
Stark meteram uma flecha nas suas costas, como presente de casamento.
Theon
achou aquilo divertido.
- Com
quem foi que ele se casou?
- Com a
viúva de Hornwood, senhor.
- Aquela
velha? Estava cego? Tem umas tetas que são como odres de vinho
vazios, secas e mirradas.
- Ele num
casou com ela pelas tetas, senhor.
Os homens
de ferro fecharam com estrondo as grandes portas ao fundo do salão.
Do cadeirão, Bran conseguia ver cerca de vinte. Ele provavelmente
deixou alguns guardas nos portões e no arsenal. Mesmo assim, não
podiam ser mais do que trinta.
Theon
levantou as mãos para pedir silêncio.
- Todos
me conhecem...
- Pois é,
conhecemos como o saco de bosta fumegante que é! - gritou Mikken
antes de o careca atingi-lo com a ponta romba da lança na barriga e
depois bater em seu rosto com o cabo.
O
ferreiro caiu de joelhos e cuspiu um dente.
- Mikken,
fique quieto - Bran tentou soar austero e senhorial, como Robb quando
dava uma ordem, mas foi traído pela voz e as palavras saíram num
guincho estridente.
- Escute
seu pequeno fidalgo, Mikken - Theon alertou. - Tem mais juízo do que
você.
Um bom
senhor protege o seu povo, recordou Bran a si mesmo.
- Rendi
Winterfell a Theon.
- Mais
alto, Bran. E chame-me de príncipe.
Bran
levantou a voz.
-
Entreguei Winterfell ao Príncipe Theon. Todos devem fazer o que ele
ordenar.
- O diabo
que faço! - Mikken berrou novamente.
Theon
ignorou a explosão.
- Meu pai
pôs na cabeça a velha coroa de sal e rocha, e declarou-se Rei das
Ilhas de Ferro. Reclama também o norte, por direito de conquista.
São todos seus súditos.
- Vá
tomar no cu - Mikken limpou o sangue da boca. - Eu sirvo aos Stark,
não a uma lula traiçoeira qualquer que... Aah - A ponta romba da
lança atirou-o de cabeça contra o chão de pedra.
- Os
ferreiros têm braços fortes e cabeças fracas - Theon observou. -
Mas se o resto de vocês me servir tão lealmente como serviram Ned
Stark, vão me achar um senhor tão generoso como poderiam querer.
Apoiado
nas mãos e joelhos, Mikken cuspiu sangue. Por favor, não faça
isso, desejou Bran, mas o ferreiro gritou:
- Se acha
que vai manter o norte com este bando ridículo de...
O careca
enfiou a ponta da lança na parte de trás do pescoço de Mikken. Aço
deslizou através de carne e saiu por sua garganta com um jorro de
sangue. Uma mulher gritou, e Meera envolveu Rickon nos braços. Foi
em sangue que se afogou, pensou Bran, atordoado. No seu próprio
sangue.
- Quem
mais tem alguma coisa a dizer? - Theon Greyjoy perguntou.
- Hodor
hodor hodor hodor - gritou Hodor, de olhos esbugalhados.
- Alguém
tenha a bondade de calar esse imbecil.
Dois
homens de ferro começaram a espancar Hodor com a parte de trás das
lanças. O cavalariço caiu de joelhos, tentando se defender com as
mãos.
- Serei
um senhor tão bom para vocês como Eddard Stark foi - Theon levantou
a voz para ser ouvido sobre o som de madeira batendo em carne. - Mas,
se me traírem, irão desejar não tê-lo feito. E não achem que os
homens que aqui veem são todo o meu poder. Praça de Torrhen e
Bosque Profundo também serão em breve nossos, e meu tio está
subindo pela Lança de Sal para capturar Fosso Cailin, Se Robb Stark
conseguir esmagar os Lannister, pode reinar como Rei do Tridente
daqui em diante, mas é a Casa Greyjoy quem possui o Norte agora.
- Os
senhores do Stark vão dar trabalho - gritou o homem chamado Fedor. -
Aquele porco inchado de Porto Branco, por exemplo, e também os Umber
e os Karstark. Vai precisar de homens. Liberte-me, e serei seu.
Theon o
avaliou por um momento.
- E mais
esperto do que perfumado, mas eu não conseguiria suportar o fedor.
- Bom -
disse Fedor - podia me lavar um pouco. Se tivesse livre.
- Um
homem de raro bom-senso - Theon sorriu. - Dobre o joelho.
Um dos
homens de ferro entregou uma espada a Fedor, e ele a depositou aos
pés de Theon e jurou obediência à Casa Greyjoy e ao Rei Balon.
Bran não conseguia ver aquilo. O sonho verde estava se tornando
realidade.
- Senhor
Greyjoy! - Osha avançou, passando ao lado do corpo de Mikken. -
Também fui trazida para cá cativa. O senhor estava lá no dia em
que fui capturada.
Pensei
que fosse uma amiga, pensou Bran, ferido.
- Preciso
de guerreiros - Theon declarou - não de empregadinhas de cozinha.
- Foi
Robb Stark quem me pôs nas cozinhas. Durante quase um ano, tenho
andado polindo panelas, raspando gordura e aquecendo as palhas para
esse aí - ela lançou um olhar a Gage. - Estou farta. Volte a pôr
uma lança em minha mão.
- Tenho
uma lança para você aqui mesmo - disse o careca que tinha matado
Mikken, e agarrou a virilha, rindo.
Osha
enfiou o joelho ossudo entre suas pernas.
- Guarde
essa coisinha mole e rosa para si - arrancou a lança de suas mãos e
usou o cabo para desequilibrá-lo. - Eu fico com a madeira e o ferro
- o careca ficou se contorcendo no chão enquanto os outros corsários
enchiam o ar com uma tempestade de gargalhadas.
Theon riu
com os outros.
- Servirá
- disse. - Fique com a lança; Stygg pode encontrar outra. Agora
dobre o joelho e jure.
Quando
ninguém mais avançou para entrar ao seu serviço, foram mandados
embora com um aviso para fazerem seu trabalho e não criarem
problemas. A Hodor foi atribuída a tarefa de levar Bran de volta à
cama. Sua aparência estava feia devido ao espancamento, com o nariz
inchado e um olho fechado.
- Hodor -
soluçou por entre lábios rachados enquanto levantava Bran com
enormes braços fortes e mãos ensanguentadas e o levava de volta
através da chuva.
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