segunda-feira, 8 de julho de 2013

POLLYANNA - Capítulo XII - As senhoras da Caridade



O almoço, ao meio dia, foi uma refeição silenciosa. Esse era o dia da reunião das senhoras da Caridade. Pollyanna até tentou falar, mas não conseguiu porque, nas quatro vezes que tentou, teve de se interromper por quase dizer “contente”, sempre se atrapalhando muito. Na quinta vez, Miss Polly abanou a cabeça impacientemente.
– Se você tem alguma coisa a dizer, diga logo. Use quantos “contentes” quiser, não fique aí gaguejando.
Pollyanna alegrou-se.
– Ah, muito obrigada. É muito difícil não pronunciar aquela palavra, joguei durante tanto tempo aquele jogo.
– Jogou o quê? – perguntou a tia Polly.
– Aquele jogo, o do papai... – Pollyanna interrompeu-se novamente, com um incômodo rubor nas faces, quando se viu novamente em terreno proibido.
Miss Polly enrugou a testa e não disse nada. Durante o restante da refeição não falaram mais nada. Logo a seguir, Miss Polly telefonou para a mulher do pastor comunicando que não poderia estar presente na reunião das senhoras da Caridade, naquela tarde, devido a uma dor de cabeça. Quando a tia subiu para o seu quarto e fechou a porta, Pollyanna tentou ter pena da dor de cabeça, mas não pode deixar de se sentir contente pelo fato da tia não poder estar presente quando ela fosse apresentar o caso de Jimmy Bean às senhoras da Caridade. Ela não podia se esquecer que tia Polly tinha chamado o Jimmy de “pequeno pedinte”, e ela não queria que a tia repetisse isso diante das senhoras da Caridade.
Pollyanna sabia que as senhoras da Caridade reuniam-se às duas da tarde na capela, junto à igreja, a pouco mais de meio quilômetro da sua casa. Planejou a sua partida de modo a chegar lá um pouco antes das três da tarde.
– Quero que estejam todas lá – disse para si mesma, – senão pode acontecer que justamente a que não esteja presente seja a única disposta a aceitar o Jimmy. Além disso, duas horas sempre quer dizer três para as senhoras da Caridade.
Calma e confiante, Pollyanna subiu os degraus da capela, abriu a porta e entrou no vestíbulo. Da sala principal vinha um murmúrio confuso de vozes femininas. Com uma ligeira hesitação, Pollyanna abriu  a porta. As vozes acalmaram-se com a surpresa. Pollyanna avançou timidamente. Agora que tinha chegado o momento, sentia-se muito envergonhada. Afinal, estes rostos meio estranhos não eram os das suas senhoras da Caridade.
– Como estão as senhoras? – perguntou, educadamente. – Eu sou Pollyanna Whittier, creio que algumas das senhoras me conhecem, ainda que eu não conheça todas vocês.
Agora, o silêncio era quase total. Algumas das senhoras não conheciam a extraordinária sobrinha de sua colega, embora quase todas já tivessem ouvido falar dela. Naquele momento, nenhuma delas encontrava nada para dizer.
– Vim aqui expor um caso – balbuciou Pollyanna, após alguns segundos, utilizando, inconscientemente, as palavras que seu pai usava.
Ouviu-se um sussurro geral.
– Foi sua tia que mandou você? – perguntou Mrs. Ford, esposa do pastor.
Pollyanna corou um pouco.
– Não, eu vim por conta própria. Estou acostumada a tratar com as senhoras da Caridade. Foram elas que me criaram junto com o meu pai.
Uma delas riu histericamente e a mulher do pastor franziu a testa.
– Sim, querida, o que é?
– É por causa de Jimmy Bean – suspirou Pollyanna. – Ele não tem casa. Mora no orfanato que está cheio e ele acha que não o querem lá. Por isso quer uma família. Quer alguém que seja uma família para ele, que tome conta dele. Tem dez anos e vai fazer onze. Pensei que alguma das senhoras pudesse tomar conta dele.
– Pensou? – murmurou uma voz, quebrando a pausa de espanto que se seguiu às palavras de Pollyanna.
Com olhos ansiosos, Pollyanna percorreu o círculo de rostos em torno dela.
– Ah, me esqueci de dizer! Ele quer trabalhar – acrescentou ela, ansiosamente.
O silêncio manteve-se. Depois, friamente uma ou duas das senhoras começaram a interrogá-la. Algum tempo depois, tinham a história completa e começaram a conversar umas com as outras, animadamente, mas sem grande contentamento.
Pollyanna ouvia com ansiedade crescente. Ela não entendia algumas coisas que diziam. No entanto, percebeu que nenhuma das mulheres presentes tinha uma casa para dar a Jimmy, embora cada uma delas pensasse que uma das outras devia ficar com ele, visto que várias não tinham crianças pequenas em casa. Porém, não havia nenhuma que estivesse disposta a ficar com ele. A mulher do pastor sugeriu então que talvez, em conjunto, pudessem assumir a responsabilidade do seu sustento e educação, enviando menos dinheiro este ano para as crianças da longínqua Índia.
Várias senhoras falaram e algumas ao mesmo tempo, ainda mais alto e de modo mais desagradável do que antes. Diziam que a associação delas era famosa pelas doações que faziam às missões na Índia e várias diziam que seria uma pena se este ano dessem menos dinheiro. Pollyanna voltou a não entender muito bem o que estavam dizendo, mas parecia que o importante era que o nome de uma associação rival não aparecesse no lugar delas, numa certa lista, mas Pollyanna devia ter entendido mal! Era tudo muito confuso e pouco agradável, de maneira que Pollyanna ficou satisfeita quando se viu de novo lá fora, respirando ar puro. Mas, ao mesmo tempo, estava muito triste porque sabia que ia ser muito difícil dizer ao Jimmy, no dia seguinte, que as senhoras da Caridade tinham decidido que era preferível enviar dinheiro para os meninos da Índia do que criar um menino da sua própria cidade. E a razão para isso era o fato de que não iriam ser “mencionadas em primeiro lugar numa tal lista”, segundo tinha dito a senhora alta de óculos.
Pollyanna pensava que, evidentemente, era bom enviar dinheiro para os países mais pobres e não queria que elas deixassem de enviar, mas tinham agido como se os meninos daqui não tivessem importância e só fossem dignos de cuidado os meninos dos países distantes. Apesar de tudo, pensava que as senhoras deveriam preferir ver Jimmy Bean crescer do que um simples relatório!

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