segunda-feira, 8 de julho de 2013

POLLYANNA - Capítulo XX - Ainda mais surpreendente



Nos domingos de manhã, usualmente, Pollyanna costumava ir à igreja e à catequese. À tarde, ia passear com Nancy. Ela tinha planejado um passeio desses para depois de sua visita a Mr. John Pendleton, mas no caminho para casa, depois da catequese, o doutor Chilton passou por ela em sua charrete e parou.
– Posso lhe dar uma carona até em casa, Pollyanna? Preciso falar com você. Estava indo justamente para lá. Mr. Pendleton pede encarecidamente que vá vê-lo esta tarde. Diz que é muito importante.
Pollyanna logo respondeu que sim, toda contente.
– Sim, eu sei que é muito importante. Eu vou.
O médico olhou para ela surpreendido.
– É, mas não sei se devia deixar você ir. Parece que ontem você perturbou mais do que acalmou o meu paciente.
Pollyanna riu.
– Ah, não foi por minha causa, foi por causa da tia Polly.
O médico se virou, num impulso.
– Sua tia Polly?
Pollyanna deu um pequeno salto no banco.
– Sim, é muito engraçado, é como numa história. Eu vou contar. Ele disse para não falar nada, mas não deve se importar se o senhor souber. Ele não queria é que ela soubesse.
– Ela?
– Sim, a tia Polly. E é claro que ele mesmo prefere esclarecer tudo em vez de outra pessoa. Os namorados são assim.
– Os namorados? – ao dizer esta palavra, o cavalo parou bruscamente como se a mão que segurava as rédeas as tivessem puxado com força.
– Sim, a história é essa. Eu não sabia, até que Nancy me contou. Ela disse que a tia Polly tinha tido um namorado há muitos anos, mas eles brigaram. No início, ela não sabia quem era, mas acabamos descobrindo. É Mr. Pendleton.
O médico descontraiu-se um pouco. A mão que segurava as rédeas caiu abandonada no colo.
– Oh! Não sabia – disse ele, calmamente.
Pollyanna continuou. Contudo, eles já estavam próximos do solar dos Harrington.
– Sim, eu estou muito contente. Mr. Pendleton me pediu para ir morar com ele, mas está claro que não posso deixar a tia Polly, depois dela ter sido tão boa para mim. Depois ele me contou tudo sobre a mulher que sempre desejou e que ainda a quer. E eu fiquei tão contente! Porque, é claro que se ele agora quiser fazer as pazes, tudo ficará bem e a tia Polly e eu iremos viver lá ou então ele irá morar conosco. Claro que a tia Polly ainda não sabe e ainda não combinamos bem as coisas. Acho que é por isso que ele quer me ver esta tarde.
O médico sentou-se de repente. Em seu rosto desenhava-se um sorriso estranho.
– Sim, posso imaginar que é isso mesmo que Mr. John Pendleton quer – disse ele enquanto fazia o cavalo parar diante da entrada.
– Não é a tia Polly que está ali na janela? – gritou Pollyanna. Mas um segundo depois acrescentou: – Não, não é. Mas parecia ela!
– Não, ela não está lá – disse o médico. O sorriso tinha desaparecido dos seus lábios.
Naquela tarde Pollyanna encontrou um John Pendleton nervoso esperando por ela.
– Pollyanna – começou ele, de imediato –, durante toda a noite procurei entender tudo o que me disse ontem sobre eu querer a tia Polly durante todos estes anos. O que é que você queria dizer com aquilo?
– Porque como vocês foram namorados, eu fiquei muito contente porque o senhor ainda gostava dela.
– Namorados! Eu e a sua tia?
Perante a surpresa manifestada na voz do homem, Pollyanna abriu muito os olhos.
– Foi isso que a Nancy disse!
O homem deu uma risada.
– Ah, sim! Receio dizer que essa Nancy não sabe de nada.
– Então não foram namorados? — perguntou Pollyanna, aflita.
– Nunca!
– Então as coisas não são como nos livros? – Não houve resposta. O homem tinha o olhar fixo na janela.
– Mas que pena! Estava tudo correndo tão bem – disse Pollyanna, quase soluçando. – Eu estava tão contente em vir morar aqui com a tia Polly.
– E agora não quer mais vir? – perguntou o homem, sem virar a cabeça.
– Claro que não! Eu sou da tia Polly.
O homem se virou quase furioso.
– Antes de você ser dela, Pollyanna, você era da sua mãe. E foi a sua mãe que eu quis, há muitos anos.
– A minha mãe?
– Sim. Não tinha a intenção de lhe contar, mas talvez assim seja melhor. – John Pendleton tinha ficado muito pálido. Falava com evidente dificuldade. Pollyanna, assustada, com os olhos e a boca muito abertos, olhava para ele fixamente.
– Eu amava muito a sua mãe, mas ela não me amava e, algum tempo depois, partiu com o seu pai. Só então percebi o quanto gostava dela. Parecia que o mundo inteiro se desfazia entre os meus dedos e... Bem, isso não interessa! Durante muitos anos, fui um velho antipático e rabugento, embora ainda nem tenha feito sessenta anos. Então, um dia, como um dos prismas que você gosta, você apareceu dançando na minha vida e salpicando o meu velho e sombrio mundo com o ouro da sua própria alegria. Depois de um tempo foi que descobri quem era aquela menina e pensei em não ver você nunca mais. Não queria me lembrar da sua mãe. Mas... Você já sabe o resto. Estou sempre desejando a sua visita, e agora quero que esteja sempre comigo. Pollyanna, quer vir morar comigo?
– Mas, Mr. Pendleton, tem a tia Polly...
Os olhos de Pollyanna ficaram marejados de lágrimas. O homem fez um gesto impaciente.
– E eu? Como eu posso ficar contente com as coisas se você me abandona? Foi só depois da sua chegada que comecei a ficar meio contente por viver. Mas se eu tivesse você aqui como filha, ficaria muito contente com tudo e também procuraria fazê-la contente. E não haveria nenhum desejo seu que não fosse satisfeito. Todo o meu dinheiro, até o último centavo seria para fazê-la feliz.
Pollyanna olhou escandalizada.
– Mr. Pendleton, como se eu pudesse deixar que gastasse comigo todo o dinheiro que economizou para os países pobres!
O homem ficou vermelho. Ia começar a falar, quando Pollyanna continuou:
– Além disso, uma pessoa com tanto dinheiro como o senhor não precisa de mim para ficar contente com as coisas. Pode, com esse dinheiro, fazer as pessoas felizes, de tal modo que o senhor mesmo não deixará de ficar feliz! Pense só nesses prismas que deu a Mrs. Snow e a mim e na moeda de ouro que deu a Nancy no aniversário dela e...
– Sim, mas isso não interessa – interrompeu o homem. Ele estava, agora, com o rosto muito vermelho, e não é de se surpreender, pois não era por dar coisas aos outros que John Pendleton tinha ficado conhecido no passado. – Tudo isso é um absurdo. Eu não dei nada para ninguém e o que dei foi por sua causa. Foi você que deu essas coisas, e não eu! E isso só vem demonstrar ainda mais como eu preciso de você – disse ele, procurando adoçar o tom da sua voz. – Se eu alguma vez jogar o jogo do contente, Pollyanna, é você que vai jogá-lo comigo.
A menina franziu a testa.
– A tia Polly tem sido tão boa para mim... – começou ela, mas foi interrompida bruscamente por ele.
Aquela velha irritação tinha voltado a transparecer no rosto dele. A impaciência de quem não suportava qualquer contrariedade tinha feito parte da natureza de John Pendleton por tanto tempo que ele não conseguia contê-la.
– Sem dúvida que ela tem sido boa para você! Mas ela não quer você nem a metade do que eu quero – contra-argumentou ele.
– Mas, Mr. Pendleton, ela está tão contente por ter...
– Contente! – interrompeu o homem, perdendo completamente a paciência. – Tenho certeza que Miss Polly não sabe ficar contente com nada! Ela faz apenas o seu dever. É uma mulher muito cumpridora dos seus deveres e eu já tive a experiência do seu “dever”. Reconheço que, nos últimos quinze ou vinte anos, não fomos propriamente grandes amigos, mas eu a conheço. Todos a conhecem. Ela é do tipo de não ficar “contente” com nada. Ela não é capaz. Quanto a morar comigo, pergunte e veja se ela não deixa. E, minha querida menina, eu a quero muito! – concluiu ele, quase chorando.
Pollyanna levantou-se com um longo suspiro.
– Está bem, vou perguntar – disse, pensativamente. – Não é que eu não gostaria de viver com o senhor, Mr. Pendleton... – mas não concluiu a frase. Houve um momento de silêncio e depois acrescentou: – Bem, de qualquer modo, estou satisfeita por não ter dito nada para ela ontem, porque eu pensava que ela também iria querer.
John Pendleton fez um sorriso forçado.
– Sim, de fato, Pollyanna, acho que foi melhor não ter falado nada para ela.
– É, foi bom, só falei para o médico, e é claro que para ele não faz mal.
– Para o médico! – gritou John Pendleton, virando-se repentinamente. – Mas não foi para o doutor Chilton, foi?
– Sim, hoje, quando ele veio me dizer que o senhor queria falar comigo.
– Bem, menos mal... – murmurou o homem, deixando-se cair na cadeira. Depois se endireitou, manifestando um súbito interesse: – E o que o doutor Chilton disse? – perguntou.
Pollyanna franziu a testa pensativamente.
– Não me lembro bem. Não disse grande coisa. Ah, ele disse que podia imaginar muito bem porque o senhor queria me ver.
– Ah, ele disse isso! – respondeu John Pendleton.
E Pollyanna ficou pensando porque ele havia dado aquela súbita e estranha gargalhada.

Um comentário:

  1. Olha eu adorei a sua postagem ... Mas eu estava procurando a resenha desse capítulo ! Mesmo assim Obrigada ! - Maria Luiza .

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