Chella,
filha de Cheyk. dos Orelhas Negras, tinha se adiantado para
reconhecer o terreno, e foi ela quem trouxe a notícia sobre o
exército na encruzilhada.
- Pelas
fogueiras, digo que são vinte mil homens - ela disse. - Os
estandartes são vermelhos, com um leão dourado.
- Seu
pai? - perguntou Bronn.
- Ou meu
irmão Jaime - Tyrion respondeu. - Saberemos em breve - examinou seu
andrajoso bando de salteadores: quase trezentos Corvos de Pedra,
Irmãos da Lua, Orelhas Negras e Homens Queimados, e estes eram
apenas a semente do exército que esperava cultivar. Gunthor, filho
de Gurn, andava ainda recrutando os outros clãs. Perguntou a si
mesmo o que o senhor seu pai acharia deles, com suas peles e pedaços
de aço roubado. A bem da verdade, ele próprio não sabia o que
achar. Seria seu comandante ou seu prisioneiro? Durante a maior parte
do tempo, parecia ser um pouco de ambos. - Pode ser melhor que eu
desça sozinho - sugeriu.
- Melhor
para Tyrion, filho de Tywin - disse Ulf, que falava pelos Irmãos da
Lua. Shagga apertou as sobrancelhas, o que era uma visão
assustadora.
- Shagga,
filho de Dolf, não gosta disto. Shagga irá com o homem-rapaz, e se
o homem-rapaz mente, Shagga lhe cortará o membro viril...
- ... e o
dará de comer às cabras, já sei - disse Tyrion num tom fatigado. -
Sagga, eu voltarei, dou a minha palavra como Lannister.
- E por
que deveríamos confiar na sua palavra? - Chella era uma mulher
pequena e dura, reta como um rapaz, e não era nada tola. - Os
senhores das terras baixas já mentiram antes aos clãs.
- Você
me magoa, Chella - disse Tyrion. - E eu que pensava que nos tínhamos
tornado tão bons amigos. Mas seja como quiser. Virá comigo, e
também Shagga e Cronn pelos Corvos de Pedra, Ulf pelos Irmãos da
Lua e Timett, filho de Timett, pelos Homens Queimados - os homens dos
clãs trocaram olhares cautelosos à medida que os ia nomeando. - Os
outros ficarão aqui até que os mande chamar. Tentem não se matar
ou mutilar uns aos outros enquanto eu estiver fora.
Esporeou
o cavalo e afastou-se a trote, não lhes deixando escolha que não
fosse segui-lo ou ficar para trás. Uma ou outra coisa para ele
estava bem, bastava que não se sentassem para conversar durante um
dia e uma noite. Era este o problema dos clãs; tinham a ideia
absurda de que a voz de todos os homens devia ser ouvida em conselho,
e por isso discutiam sem fim sobre tudo. Até as mulheres eram
autorizadas a falar. Pouco admirava que se tivessem passado centenas
de anos desde a última vez que ameaçaram o Vale com algo mais que
uma incursão ocasional. Tyrion pretendia mudar isso.
Bronn o
acompanhou. Atrás deles, depois de uma rápida sessão de resmungos,
os cinco homens dos clãs seguiram-nos em seus pequenos cavalos, umas
coisas magricelas que pareciam pôneis e subiam vertentes pedregosas
como cabras. Os Corvos de Pedra iam juntos, e Chella e Ulf também se
mantinham perto um do outro, uma vez que os Irmãos da Lua e os
Orelhas Negras tinham laços fortes entre si. Timett, filho de
Timett, ia só. Todos os clãs das Montanhas da Lua temiam os Homens
Queimados, que flagelavam a carne com fogo para provar sua coragem e
(segundo os outros) assavam bebês em seus banquetes. E mesmo os
outros Homens Queimados temiam Timett, que arrancara o próprio olho
esquerdo com uma faca incandescente quando chegou à idade adulta.
Tyrion deduzira que era mais habitual que um rapaz arrancasse a fogo
um mamilo, um dedo ou (se fosse realmente bravo, ou realmente louco)
uma orelha. Os outros Homens Queimados ficaram tão atemorizados pela
sua escolha de um olho que imediatamente o nomearam Mão Vermelha, o
que parecia ser algum tipo de chefe de guerra.
-
Pergunto a mim mesmo o que o rei deles queimou - dissera Tyrion a
Bronn quando ouviu a história. Sorrindo, o mercenário agarrara a
virilha... mas até Bronn mantinha um respeitoso cuidado com a língua
perto de Timett. Se um homem era suficientemente louco para destruir
o próprio olho, era pouco provável que se mostrasse gentil para com
os inimigos.
Vigias
distantes espreitavam de torres de pedra solta quando o grupo desceu
pelo sopé dos montes, e uma vez Tyrion viu um corvo levantando voo.
Onde a estrada de altitude se retorcia entre dois afloramentos
rochosos, chegaram ao primeiro ponto fortificado. Um muro baixo de
terra com um metro e vinte de altura fechava a estrada, e uma dúzia
de soldados com atiradeiras guarnecia os pontos altos. Tyrion fez
seus homens parar fora do alcance e se dirigiu sozinho para a
muralha.
- Quem
comanda aqui? - gritou.
O capitão
foi rápido para surgir, e ainda mais rápido para providenciar uma
escolta a Tyrion quando reconheceu o filho do seu senhor. Passaram a
trote por campos enegrecidos e fortificações queimadas, até as
terras do rio e o Ramo Verde do Tridente. Tyrion não viu cadáveres,
mas o ar estava cheio de corvos e gralhas-pretas; tinha havido luta
ali, e recentemente.
A meia
légua da encruzilhada, tinha sido erigida uma barricada de estacas
aguçadas, guarnecida por lanceiros e arqueiros. Atrás dessa linha,
o acampamento estendia-se até perder de vista. Finos pilares de
fumaça erguiam-se de centenas de fogueiras para cozinhar; homens
vestidos de cota de malha sentavam-se à sombra de árvores e
amolavam suas lâminas; estandartes familiares ondulavam em mastros
enfiados no terreno lamacento.
Um grupo
de cavaleiros avançou ao seu encontro quando se aproximaram das
estacas. O cavaleiro que os liderava usava uma armadura prateada com
ametistas encravadas e um manto listrado de púrpura e prata. Seu
escudo mostrava o símbolo do unicórnio, e um corno em espiral com
sessenta centímetros de comprimento projetava-se da testa de seu
elmo em forma de cabeça de cavalo. Tyrion puxou as rédeas para
saudá-lo.
- Sor
Flement.
Sor
Flement Brax ergueu o visor.
-Tyrion -
disse, espantado. - Senhor, todos temíamos que estivesse morto,
ou... - olhou incerto para os homens dos clãs. - Estes... seus
companheiros...
- Amigos
de peito e vassalos leais - disse Tyrion. - Onde poderei encontrar o
senhor meu pai?
- Usa a
estalagem no entroncamento como abrigo.
Tyrion
soltou uma gargalhada. A estalagem no entroncamento! Talvez os deuses
afinal fossem justos.
- Desejo
vê-lo de imediato.
- Às
suas ordens, senhor - Sor Flement virou o cavalo e gritou ordens.
Três
filas de estacas foram arrancadas do chão para abrir um buraco na
linha. Tyrion o atravessou com o grupo. O acampamento de Lorde Tywin
espalhava-se ao longo de léguas. A estimativa de Chella de vinte mil
homens não podia estar muito longe da verdade. Os plebeus acampavam
a céu aberto, mas os cavaleiros possuíam tendas e alguns dos
grandes senhores tinham erigido pavilhões grandes como casas. Tyrion
vislumbrou o touro vermelho dos Prester, o javali malhado de Lorde
Crakehall, a árvore ardente de Marbrand, o texugo de Lynden.
Cavaleiros chamavam-no enquanto ele ia passando a meio galope, e
homens de armas embasbacavam-se perante os homens dos clãs, em
evidente espanto.
Shagga
respondia-lhes também abrindo a boca; com toda certeza nunca tinha
visto tantos homens, cavalos e armas em sua vida. Os outros
salteadores da montanha faziam melhor trabalho em manter uma
expressão neutra, mas Tyrion não tinha dúvidas de que estavam tão
cheios de espanto como Shagga. Cada vez melhor. Quanto mais
impressionados estivessem com o poder dos Lannister, mais fácil
seria comandá-los.
A
estalagem e seus estábulos estavam muito parecidos com o que ele
recordava, embora pouco restasse da aldeia além de pedras derrubadas
e fundações enegrecidas. Fora erigida uma forca no pátio, e o
corpo que dela pendia estava coberto de corvos. Quando Tyrion se
aproximou, levantaram voo, guinchando e batendo as asas negras.
Desmontou e olhou de relance para o que restava do cadáver. As aves
tinham-lhe comido os lábios, os olhos e a maior parte das bochechas,
deixando arreganhados os dentes manchados de vermelho, num hediondo
sorriso.
- Um
quarto, uma refeição e um jarro de vinho, foi tudo o que lhe pedi -
disse ao cadáver com um suspiro de censura.
Rapazes
emergiram hesitantemente dos estábulos para tratar de seus cavalos.
Shagga não queria entregar o seu.
- O rapaz
não roubará sua égua - garantiu-lhe Tyrion. - Só quer dar-lhe um
pouco de aveia e água, e escovar-lhe o pelo - o pelo de Shagga
também precisava de uma boa escovada, mas mencioná-lo teria
demonstrado pouco tato. - Tem a minha palavra, não farão mal ao
cavalo.
Irritado,
Shagga largou as rédeas.
- Este é
o cavalo de Shagga, filho de Dolf - rugiu para o cavalariço.
- Se ele
não o devolver, arranca-lhe o membro viril e o dá de comer às
cabras - sugeriu Tyrion. - Desde que consiga encontrar alguma.
Um par de
guardas domésticos, usando mantos carmesins e elmos encimados por
leões, encontrava-se sob a tabuleta da estalagem, de ambos os lados
da porta. Tyrion reconheceu o capitão.
- Meu
pai?
- Na sala
comum, senhor.
- Meus
homens querem comer e beber - disse-lhe Tyrion. - Trata disso - e
entrou na estalagem, ali estava seu pai.
Tywin
Lannister, Senhor de Rochedo Casterly e Protetor do Oeste, tinha
cinquenta e poucos anos, mas era duro como um homem de vinte. Mesmo
sentado, era alto, com pernas longas, ombros largos e barriga lisa.
Os braços finos estavam envolvidos por músculos. Quando os cabelos
dourados, antes espessos, começaram a cair, ordenara ao barbeiro que
lhe rapasse a cabeça; Lorde Tywin não acreditava em meias medidas.
Também escanhoava o queixo e o bigode, mas conservava as suíças,
dois grandes matagais de rijos pelos dourados que lhe cobriam a maior
parte das bochechas, das orelhas à maxila. Os olhos eram
verde-claros salpicados de ouro. Um bobo mais tolo que a maioria
certa vez dissera brincando que até a merda de Lorde Tywin era
salpicada de ouro. Havia quem dissesse que o homem ainda estava vivo,
enterrado bem fundo nas entranhas de Rochedo Casterly.
Sor Kevan
Lannister, o único irmão sobrevivente do pai, partilhava um jarro
de cerveja com Lorde Tywin quando Tyrion entrou na sala comum. O tio
era corpulento e estava perdendo cabelo, com uma barba amarela
cortada curta que seguia a linha do maciço maxilar. Sor Kevan foi o
primeiro a vê-lo.
- Tyrion
- disse, surpreso.
- Tio -
disse Tyrion, fazendo uma reverência. - E o senhor meu pai. Que
prazer encontrá-los aqui.
Lorde
Tywin não se mexeu da cadeira, mas lançou ao filho anão um longo
olhar perscrutador,
- Vejo
que os rumores sobre seu falecimento eram infundados.
- Lamento
desapontá-lo, pai - disse Tyrion. - Não há necessidade de saltar
da cadeira e vir me abraçar, não desejo que se canse - atravessou a
sala até a mesa onde eles estavam, agudamente consciente do modo
como as pernas deformadas o faziam oscilar a cada passo. Sempre que
os olhos do pai caíam sobre ele, ficava desconfortavelmente
consciente de todas as suas deformidades e imperfeições. - Foi
amável de sua parte ir à guerra por mim - disse, enquanto subia em
uma cadeira e se servia de uma taça da cerveja do pai,
- Segundo
vejo as coisas, foi você quem começou isto - respondeu Lorde Tywin.
- Seu irmão Jaime nunca teria se submetido docilmente a ser
capturado por uma mulher.
- Esta é
uma das coisas em que diferimos, Jaime e eu. Ele também é mais
alto, talvez tenha notado.
O pai
ignorou o aparte.
- A honra
da nossa Casa estava em causa. Não tive alternativa que não fosse
ir para a guerra. Ninguém derrama impunemente sangue Lannister.
- Ouça-me
rugir - disse Tyrion, sorrindo, as palavras Lannister. - A bem da
verdade, nenhuma gota do meu sangue chegou a ser derramada, embora
estivesse perto disso uma ou duas vezes, Morrec e Jyck foram mortos.
- Suponho
que vá querer novos homens.
- Não se
incomode, pai, adquiri alguns homens meus - experimentou um gole da
cerveja. Era marrom e cheia de levedura, tão espessa que quase se
conseguia mastigá-la. Muito boa, realmente. Uma pena que o pai
tivesse enforcado a estalajadeira. - Como anda a sua guerra?
Foi o tio
quem respondeu.
-
Bastante bem, até aqui. Sor Edmure tinha espalhado pequenas
companhias ao longo das fronteiras para parar as nossas incursões, e
o senhor seu pai e eu conseguimos destruir, pouco a pouco, a maior
parte antes que conseguissem se reagrupar.
- Seu
irmão tem se coberto de glória - disse o pai. - Esmagou os lordes
Vance e Piper no Dente Dourado e defrontou o poderio conjunto dos
Tully à sombra das muralhas de Correrrio. Os senhores do Tridente
foram postos em fuga. Sor Edmure Tully foi feito cativo, com muitos
de seus cavaleiros e vassalos. Lorde Blackwood levou alguns
sobreviventes para Correrrio, onde Jaime os tem sob cerco. O resto
fugiu para suas próprias terras.
- Seu pai
e eu temos vindo marchando contra um deles de cada vez - disse Sor
Kevan. -Com Lorde Blackwood fora. Corvarbor caiu de imediato, e a
Senhora Whent rendeu Harrenhal por falta de homens para defender o
castelo. Sor Gregor incendiou os Piper e os Bracken...
-
Deixando-os sem oposição? - disse Tyrion.
- Não
totalmente - disse Sor Kevan. - Os Mallister ainda detêm Guardamar e
Walder Frey põe em ordem seus recrutas nas Gêmeas.
- Não
importa - disse Lorde Tywin. - Frey só se põe em campo quando o
cheiro da vitória paira no ar, e tudo o que cheira agora é a ruína.
E a Jason Mallister falta força para lutar sozinho. Uma vez tomado
Correrrio por Jaime, ambos dobrarão o joelho bastante depressa. A
menos que os Stark e os Arryn avancem para nos confrontar, esta
guerra está ganha.
- Não me
preocuparia muito com os Arryn se estivesse em seu lugar - disse
Tyrion. - Os Stark são outra coisa. Lorde Eddard...
- ... é
nosso refém - disse o pai. - Não comandará exércitos enquanto
apodrece numa masmorra sob a Fortaleza Vermelha.
- Não -
concordou Sor Kevan - mas o filho convocou os vassalos e está em
Fosso Cailin com uma tropa forte em volta dele.
- Nenhuma
espada é forte até ser temperada - declarou Lorde Tywin. - O rapaz
Stark é uma criança. Sem dúvida que gosta bastante do som das
trombetas de guerra e de ver suas bandeiras esvoaçarem ao vento,
mas, no fim das contas, tudo se resume a trabalho de carniceiro.
Duvido que tenha estômago para tanto.
Tyrion
pensou que as coisas tinham se tornado interessantes enquanto
estivera longe.
- E o que
faz nosso destemido monarca enquanto todo este "trabalho de
carniceiro" se desenrola? - quis saber. - Como foi que minha
adorável e persuasiva irmã levou Robert a concordar com o
aprisionamento de seu querido amigo Ned?
- Robert
Baratheon está morto - seu pai respondeu. - Seu sobrinho reina em
Porto Real.
Aquilo
apanhou mesmo Tyrion de surpresa.
- Minha
irmã, quer dizer - bebeu outro gole de cerveja. O reino seria um
lugar muito diferente com Cersei a governar no lugar do marido.
- Se tem
intenção de se tornar útil, dou-lhe um comando - seu pai
continuou. - Marq Piper e Karyl Vance andam à solta na nossa
retaguarda, saqueando as terras ao longo do Ramo Vermelho.
Tyrion
soltou um tsc.
- Que
descaramento deles responder lutando. Em circunstâncias normais,
ficaria feliz por punir tanta falta de educação, pai, mas a verdade
é que tenho negócios mais prementes em outro local.
- Ah,
sim? - Lorde Tywin não parecia surpreso. - Também temos um par de
ideias tardias de Ned Stark que tentam se tornar uma maçada
atormentando meus destacamentos logísticos, Beric Dondarrion, um
jovem fidalgote qualquer com ilusões de valor. Tem com ele aquela
caricatura gorda de um sacerdote, aquele que gosta de pôr fogo na
espada. Acha que poderia tratar deles enquanto foge? Sem estragar
demais o serviço?
Tyrion
limpou a boca com as costas da mão e sorriu.
-Pai,
aquece-me o coração pensar que poderia me confiar... o quê, vinte
homens? Cinquenta? Está seguro de poder dispensar tantos assim? Bem,
não importa. Se encontrar Thoros e Lorde Beric, espancarei ambos -
desceu da cadeira e bamboleou até o aparador, onde uma rodela de
queijo fresco raiado estava rodeada de frutas. - Mas primeiro tenho
algumas promessas minhas a cumprir - disse, enquanto cortava um
pedaço. - Preciso de três mil elmos e outras tantas camisas de cota
de malha, mais espadas, lanças, pontas de lança em aço, maças,
machados de batalha, manoplas, gorjais, grevas, placas de peito,
carroças para transportar isso tudo...
A porta
atrás dele abriu-se com estrondo, tão violentamente que Tyrion
quase deixou cair o queijo. Sor Kevan saltou do banco, praguejando,
enquanto o capitão da guarda atravessou a sala voando e foi de
encontro à lareira.
Enquanto
caía sobre as cinzas frias, com o elmo de leão torto, Shagga partiu
a espada do homem em duas num joelho grosso como um tronco de árvore,
atirou os pedaços ao chão e entrou pesadamente na sala comum. Foi
precedido pelo fedor que exalava, mais forte que o do queijo e
avassalador naquele espaço fechado,
- Pequeno
capa-vermelha - rosnou - da próxima vez que desembainhar o aço
contra Shagga, filho de Dolf, cortarei seu membro viril e o assarei
numa fogueira.
- O quê?
Nada de cabras? - disse Tyrion, dando uma dentada no queijo.
Os outros
homens dos clãs seguiram Shagga para a sala comum, com Bronn entre
eles. O mercenário encolheu tristemente os ombros na direção de
Tyrion.
- E quem
são vocês? - perguntou Lorde Tywin, frio como a neve.
-
Seguiram-me até em casa, pai - explicou Tyrion. - Posso ficar com
eles? Não comem muito.
Ninguém
estava sorrindo.
- Com que
direito, seus selvagens, se intrometem em nossos concílios? - exigiu
saber Sor Kevan.
-
Selvagens, homem das planícies? - Cronn bem poderia se parecer com
um se estivesse lavado. - Somos homens livres, e os homens livres,
por direito, tomam parte em todos os concílios de guerra.
- Qual
deles é o senhor dos leões? - perguntou Chella.
- São os
dois velhos - anunciou Timett, filho de Timett, que ainda não tinha
visto seu vigésimo ano.
A mão de
Sor Kevan caiu sobre o cabo da espada, mas o irmão pousou dois dedos
em seu pulso e o segurou. Lorde Tywin parecia imperturbável.
- Tyrion,
esqueceu a boa educação? Seja amável e nos apresente os nossos...
honrados hóspedes.
Tyrion
lambeu os dedos.
- Com
prazer - respondeu. - A bela donzela é Chella, filha de Cheyk, dos
Orelhas Negras.
- Não
sou donzela coisa nenhuma - protestou Chella. - Meus filhos já somam
ao todo cinquenta orelhas.
- Que
somem outras cinquenta - Tyrion bamboleou para longe dela. - Este é
Cronn, filho de Coratt. Shagga, filho de Dolf, é aquele que se
parece com um Rochedo Casterly de cabelos. São Corvos de Pedra. Aqui
está Ulf, filho de Umar, dos Irmãos da Lua, e aqui, Timett, filho
de Timett, Mão Vermelha dos Homens Queimados. E este é Bronn, um
mercenário sem nenhuma fidelidade em especial. Já mudou de lado
duas vezes no breve período em que o conheço; o senhor e ele vão
se entender maravilhosamente, pai - para Bronn e para os homens dos
clãs, disse: - Apresento-lhes o senhor meu pai, Tywin, filho de
Tytos, da Casa Lannister, Senhor de Rochedo Casterly, Protetor do
Oeste, Escudo de Lannisporto, e antiga e futura Mão do Rei.
Lorde
Tywin ergueu-se, digno e correto.
- Mesmo
no Oeste conhecemos a intrepidez dos clãs guerreiros das Montanhas
da Lua. Que os traz do alto de suas terras, senhores?
- Cavalos
- disse Shagga.
- A
promessa de seda e aço - disse Timett, filho de Timett.
Tyrion se
preparara para contar ao senhor seu pai como propunha reduzir o Vale
de Arryn a um deserto fumegante, mas não lhe foi dada essa
possibilidade. A porta abriu-se de novo com estrondo. O mensageiro
deu uma olhadela rápida e estranha aos homens dos clãs de Tyrion
enquanto caía sobre o joelho perante Lorde Tywin.
- Senhor,
Sor Addam pede-me para avisar que a tropa Stark desce pelo talude.
Lorde
Tywin Lannister não sorriu. Ele nunca sorria, mas Tyrion aprendera a
ler o prazer do pai mesmo assim, e ele ali estava, em seu rosto.
- Então
o lobinho está deixando a toca para vir brincar entre os leões -
disse, numa voz de calma satisfação. - Magnífico. Regresse para
junto de Sor Addam e diga-lhe para se retirar. Não deverá dar
combate aos nortenhos até chegarmos, mas quero que lhes atormente os
flancos e os atraia mais para o sul.
- Será
feito conforme ordena - o mensageiro respondeu e se retirou.
- Aqui
estamos bem situados - fez notar Sor Kevan. - Perto do rio raso e
rodeados de fossos e lanças. Se vierem para o sul, pois que venham e
se quebrem contra nós.
- O rapaz
pode esperar ou perder a coragem quando vir nossos números -
respondeu Lorde Tywin. - Quanto mais depressa quebrarmos os Stark,
mais depressa estarei livre para lidar com Stannis Baratheon. Que
rufem os tambores para o agrupamento, e envie uma mensagem a Jaime
dizendo-lhe que marcho contra Robb Stark.
- Às
suas ordens - disse Sor Kevan.
Tyrion
observou com um fascínio sombrio quando o senhor seu pai se virou em
seguida para os meio selvagens homens dos clãs.
- Dizem
que os homens dos clãs de montanha são guerreiros sem medo.
- Dizem a
verdade - respondeu Cronn, dos Corvos de Pedra.
- E as
mulheres também - acrescentou Chella.
-
Acompanhem-me contra os meus inimigos e terão tudo o que meu filho
lhes prometeu, e mais ainda - disse-lhes Lorde Tywin.
- Pagará
com a nossa própria moeda? - disse Ulf, filho de Umar. - Por que
necessitaríamos da promessa do pai, quando temos a do filho?
- Nada
disse sobre necessidade - respondeu Lorde Tywin. - Minhas palavras
eram uma cortesia, nada mais. Não precisam se juntar a nós. Os
homens das terras de inverno são feitos de ferro e gelo, e até meus
cavaleiros mais corajosos temem defrontá-los.
Ah, mas
que habilidade, pensou Tyrion, com um sorriso torto.
- Os
Homens Queimados nada temem. Timett, filho de Timett, acompanhará os
leões.
- Onde
quer que os Homens Queimados forem, os Corvos de Pedra estarão lá
primeiro - declarou acaloradamente Cronn. - Também vamos.
- Shagga,
filho de Dolf, lhes cortará os órgãos viris e os dará de comer
aos corvos.
- Vamos
acompanhá-lo, senhor leão - concordou Chella, filha de Cheyk - mas
só se seu filho meio-homem vier conosco. Comprou o ar que respira
com promessas. Até termos o aço que nos prometeu, sua vida nos
pertence.
Lorde
Tywin virou os olhos semeados de ouro para o filho.
- Alegria
- disse Tyrion com um sorriso resignado.
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