quinta-feira, 25 de julho de 2013

5 - JON


Havia momentos - não muitos, mas alguns - em que Jon Snow ficava feliz por ser um bastardo. Enquanto enchia uma vez mais sua taça de vinho de um jarro que ia passando, deu-se conta de que aquele poderia ser um desses momentos. Voltou a se instalar no seu lugar ao banco, entre os escudeiros mais novos, e bebeu. O sabor doce e frutado do vinho estival encheu-lhe a boca e trouxe-lhe um sorriso aos lábios.
O ar no Salão Grande de Winterfell estava nevoento de fumo e pesado com os cheiros de carne assada e pão acabado de cozer. As grandes paredes de pedra do salão estavam adornadas com estandartes. Bianco, dourado, carmesim: o lobo gigante de Stark, o veado coroado de Baratheon, o leão de Lannister. Um cantor tocava harpa e recitava uma balada, mas nesta ponta do salão quase não se conseguia ouvir sua voz acima do rugir do fogo, do clangor de pratos e taças de peltre, e do burburinho grave de uma centena de conversas ébrias.
Estava-se na quarta hora do banquete de boas-vindas oferecido ao rei. Os irmãos e irmãs de Jon tinham sido postos junto dos filhos do rei, por baixo da plataforma elevada onde o Senhor e a Senhora Stark recebiam o rei e a rainha. Em honra da ocasião, o senhor seu pai iria sem dúvida permitir a cada filho um copo de vinho, mas não mais que isso. Ali, nos bancos, não havia ninguém para impedir que Jon bebesse tanto quanto sua sede exigisse.
E estava descobrindo que tinha uma sede de homem, para a áspera satisfação dos jovens que o rodeavam e que o incentivavam a cada vez que esvaziava um copo. Eram boa companhia, e Jon apreciava as histórias que contavam, histórias de batalha, de cama e de caça. Tinha certeza de que os companheiros eram mais divertidos do que a prole do rei.
Saciou sua curiosidade a respeito dos visitantes quando estes entraram. A procissão passara a não mais de um pé do local que lhe fora atribuído no banco, e Jon deitara um forte e demorado olhar em todos eles.
O senhor seu pai viera à frente, acompanhando a rainha. Ela era tão bela como os homens diziam. Uma tiara cravejada de joias brilhava entre os seus longos cabelos dourados, e as esmeraldas que continha combinavam perfeitamente com o verde de seus olhos. O pai de Jon a ajudou a subir os degraus que levavam ao tablado e indicou-lhe o caminho até seu lugar, mas a rainha nunca chegou sequer a olhar para ele. Mesmo com catorze anos, Jon era capaz de ver para lá do seu sorriso.
A seguir veio o próprio Rei Robert, trazendo a Senhora Stark pelo braço. O rei foi uma grande desilusão para Jon. O pai falara dele com frequência: o inigualável Robert Baratheon, demônio do Tridente, o mais feroz guerreiro do reino, um gigante entre os príncipes. Jon viu apenas um homem gordo, com o rosto vermelho sob a barba, transpirando através de suas sedas. Caminhava como um homem meio embriagado.
Depois vieram os filhos. Primeiro o pequeno Rickon, dominando a longa caminhada com toda a dignidade que um rapazinho de três anos era capaz de reunir. Jon teve de incentivá-lo a seguir quando parou ao seu lado. Logo atrás veio Robb, vestido de lã cinzenta ornamentada de branco, as cores dos Stark. Trazia pelo braço a Princesa Myrcella. Era uma pequena menina, com quase oito anos, o cabelo feito uma cascata de caracóis dourados sob uma rede cravejada de joias, Jon reparou nos olhares acanhados que ela dirigia a Robb enquanto passavam por entre as mesas e no modo
tímido como lhe sorria. Decidiu que a menina era insípida. Robb nem tinha o bom--senso de notar quão estúpida ela era, e sorria como um tolo.
Suas meias-irmãs acompanhavam os príncipes reais. Arya tinha como par o roliço jovem Tommen, cujos cabelos louro-esbranquiçados eram mais longos que os dela. Sansa, dois anos mais velha, puxava o príncipe real, Joffrey Baratheon. Ele tinha doze anos, menos que Jon ou Robb, mas era mais alto que qualquer um deles, para sua grande frustração.
Príncipe Joffrey tinha os cabelos da irmã e os profundos olhos verdes da mãe. Uma espessa mata de caracóis louros caía para lá de sua gargantilha dourada e da alta gola de veludo. Sansa parecia radiante enquanto caminhava a seu lado, mas Jon não gostou dos lábios mal-humorados de Joffrey nem do modo aborrecido e desdenhoso com que avaliou o Salão Grande de Winterfell.
Interessou-lhe mais o par que veio a seguir: os irmãos da rainha, os Lannister de Rochedo Casterly. O Leão e o Duende; não havia forma de confundi-los. Sor Jaime Lannister era gêmeo da Rainha Cersei; alto e dourado, com flamejantes olhos verdes e um sorriso que cortava como uma faca. Trajava seda carmesim, botas negras de cano alto, um manto de cetim negro. No peito da túnica, o leão de sua Casa estava bordado em fio de ouro, rugindo em desafio. Chamavam-lhe Leão de Lannister na sua presença e "Regicida" às suas costas. Jon sentiu dificuldade em desviar o olhar do homem. É este o aspecto que um rei deve ter, pensou consigo mesmo quando o príncipe passou por ele.
Então viu o outro, bamboleando ao lado do irmão, meio escondido pelo seu corpo. Tyrion Lannister, o mais novo dos filhos de Lorde Tywin e de longe o mais feio. Tudo o que os deuses tinham dado a Cersei e Jaime negaram a Tyrion. Era um anão, com metade da altura do irmão, lutando para acompanhar seu passo sobre pernas atrofiadas. A cabeça era grande demais para o corpo, com uma cara animalesca esborrachada por baixo de uma sobrancelha saliente. Um olho verde e um negro espreitavam sob uma cascata de cabelos corredios e tão louros que pareciam brancos. Jon o observou fascinado.
O último dos grandes senhores a entrar foi seu tio, Benjen Stark, da Patrulha da Noite, e o protegido do pai, o jovem Theon Greyjoy. Benjen dirigiu a Jon um sorriso caloroso quando passou por ele. Theon o ignorou por completo, mas nisso nada havia de novo. Depois de todos se terem sentado, foram feitos brindes, dados e devolvidos agradecimentos e, então, deu-se início ao festim. Jon começara a beber nesse momento e ainda não parara.
Algo roçou sua perna sob a mesa. Ele viu olhos vermelhos que o encaravam.
- Outra vez com fome? - perguntou. Ainda havia meia galinha com mel no centro da mesa. Jon esticou o braço para arrancar uma perna, mas depois teve uma ideia melhor. Espetou uma faca na ave inteira e a deixou escorregar para o chão por entre as pernas. Fantasma a atacou em silêncio selvagem. Não tinham permitido aos irmãos e irmãs que trouxessem seus lobos para o banquete, mas naquela ponta do salão havia mais rafeiros do que Jon conseguia contar, e ninguém dissera uma palavra sobre seu cachorro. Disse a si próprio que também nisto era afortunado.
Seus olhos ardiam. Jon os esfregou furiosamente, amaldiçoando o fumo. Engoliu outro trago de vinho e observou seu lobo gigante devorando a galinha. Cães moviam-se por entre as mesas, perseguindo as criadas.
Um deles, uma cadela preta vira-lata com longos olhos amarelos, detectou o cheiro da galinha. Parou e meteu-se por baixo do banco para obter uma parte. Jon observou o confronto. A cadela soltou uma rosnadela profunda e aproximou-se. Fantasma ergueu os olhos quentes e rubros, em silêncio, e se fixou nela. A cadela soltou um desafio irado.
Tinha três vezes seu tamanho, mas Fantasma não se afastou. Ergueu-se sobre ela e abriu a boca, mostrando as presas. A cadela ficou tensa, ladrou uma vez mais, e depois pensou melhor a respeito da luta. Virou-se e escapuliu, com um último latido desafiador para salvar o orgulho. Fantasma voltou a prestar atenção à refeição,
Jon sorriu e esticou o braço para lhe acariciar o pelo branco. O lobo gigante olhou para ele, deu-lhe uma dentadinha gentil na mão e novamente pôs-se a comer.
- Este é um dos lobos gigantes de que tanto ouvi falar? - perguntou perto dele uma voz familiar.
Jon ergueu seus olhos, feliz, quando tio Ben lhe pôs a mão na cabeça e desalinhou seus cabelos tanto quanto ele fizera com os pelos do lobo.
- Sim - disse. - Chama-se Fantasma.
Um dos escudeiros interrompeu a história obscena que estava contando para abrir lugar na mesa para o irmão de seu senhor. Benjen Stark escarranchou-se no banco com pernas longas e tirou a taça de vinho da mão de Jon.
- Vinho de verão - disse depois de provar. - Não há nada tão doce. Quantas taças já bebeu, Jon?
Jon sorriu.
Ben Stark soltou uma gargalhada.
- Tal como eu temia. Ah, bem, Acho que era mais novo do que você da primeira vez que fiquei verdadeira e sinceramente bêbado - surrupiou de uma travessa próxima uma cebola assada que pingava molho de carne e mordeu-a. A cebola estalou.
O tio de Jon tinha feições angulosas e era descarnado como um penhasco, mas havia sempre uma sugestão de riso em seus olhos azul-acinzentados. Vestia-se de negro, como era próprio de um homem da Patrulha da Noite. Hoje trajava um rico veludo negro, com grandes botas de couro e um cinto largo com fivela de prata. Uma pesada corrente de prata curvava-se em torno do seu pescoço. Benjen observou Fantasma, divertido, enquanto comia a cebola.
- Um lobo muito sossegado - observou.
- Não é como os outros - disse Jon. - Nunca solta um som. Foi por isso que o chamei Fantasma. Por isso e porque é branco. Os outros são todos escuros, cinzentos ou pretos.
- Ainda há lobos gigantes para lá da Muralha. Ouvimo-los nas nossas patrulhas - Benjen Stark olhou longamente para Jon. - Não costuma comer à mesa dos seus irmãos?
- Na maior parte das ocasiões - respondeu Jon em voz monocórdia. - Mas hoje a Senhora Stark pensou que poderia ser um insulto para a família real se um bastardo se sentasse entre eles.
- Estou vendo - o tio olhou por sobre o ombro para a mesa elevada na outra ponta do salão. - Meu irmão não parece muito festivo hoje.
Jon também notara. Um bastardo tinha de aprender a reparar nas coisas, a ler a verdade que as pessoas escondiam por trás dos olhos. Seu pai observava todas as cortesias, mas havia nele uma rigidez que Jon raramente vira antes. Pouco falava, olhando o salão com olhos cobertos, sem nada ver. A dois lugares de distância, o rei estivera toda a noite bebendo muito. O rosto largo estava corado por trás da barba negra.
Fizera muitos brindes, rira sonoramente com todas as brincadeiras e atacara todos os pratos como um faminto, mas, ao seu lado, a rainha parecia tão fria como uma escultura de gelo.
- A rainha também está zangada - disse Jon ao tio com uma voz calma e baixa. - Meu pai levou o rei às criptas esta tarde. A rainha não queria que ele fosse.
Benjen deitou a Jon um olhar cauteloso e avaliador,
- Não deixa passar muitas coisas, não é, Jon? Podíamos fazer uso de um homem como você na Muralha.
Jon inchou de orgulho.
- Robb é um lanceiro mais forte que eu, mas sou melhor espadachim, e Hullen diz que me sento num cavalo tão bem como qualquer outro no castelo.
- Notáveis realizações.
- Leve-me consigo quando regressar à Muralha - disse Jon com súbita precipitação. - Meu pai me dará licença para ir se lhe pedir, eu sei que dará.
Tio Benjen estudou seu rosto com cuidado.
- A Muralha é um lugar duro para um rapaz, Jon.
- Sou quase um homem feito - Jon protestou. - Vou fazer quinze anos no próximo dia do meu nome, e Meistre Luwin diz que os bastardos crescem mais depressa que as outras crianças.
- Isso é verdade - disse Benjen, retorcendo a boca para baixo.
Tomou a taça de Jon, encheu-a de um jarro que encontrou ali perto e bebeu um longo gole.
- Daeren Targaryen tinha só quinze anos quando conquistou Dorne - disse Jon. O Jovem Dragão era um dos seus heróis.
- Uma conquista que durou um verão - o tio ressaltou. - Seu Rei Rapaz perdeu dez mil homens na conquista do lugar e outros cinquenta ao tentar mantê-lo. Alguém devia ter-lhe dito que a guerra não é um jogo - bebeu outro gole de vinho. - Além disso - disse, limpando a boca - Daeren Targaryen tinha só dezoito anos quando morreu. Ou será que se esqueceu dessa parte?
- Não me esqueço de nada - vangloriou-se Jon. O vinho o estava deixando ousado. Tentou sentar-se muito ereto para parecer mais alto. - Quero servir na Patrulha da Noite, tio.
Tinha refletido sobre o assunto longa e duramente, deitado na cama à noite enquanto os irmãos dormiam à sua volta. Robb um dia herdaria Winterfell, comandaria grandes exércitos enquanto Protetor do Norte. Bran e Rickon seriam vassalos de Robb e governariam castros em seu nome. As irmãs, Arya e Sansa, se casariam com os herdeiros de outras grandes Casas e iriam para o sul como senhoras dos seus próprios castelos. Mas a que lugar podia um bastardo aspirar?
- Não sabe o que está pedindo, Jon. A Patrulha da Noite é uma irmandade juramentada. Não temos famílias. Nenhum de nós será algum dia pai. Somos casados com o dever. Nossa amante é a honra.
- Um bastardo também pode ter honra - disse Jon. - Estou pronto para prestar o juramento.
- Você é um rapaz de catorze anos - disse Benjen. - Não é um homem. Ainda não. Até ter conhecido uma mulher, não pode compreender o que estará deixando para trás.
- Isto não me interessa! - Jon respondeu ardentemente.
- Mas poderia se interessar se soubesse a que me refiro - disse Benjen. - Se soubesse o que o juramento lhe custará, estaria menos ansioso por pagar o preço, filho.
Jon sentiu a ira crescer no peito.
- Não sou seu filho! - Benjen Stark pôs-se em pé.
- Maior é a pena - pôs uma mão no ombro de Jon. - Venha ter comigo depois de ter sido pai de alguns bastardos seus e veremos então como se sente.
Jon estremeceu.
- Nunca serei pai de um bastardo - disse com cuidado. - Nunca! - cuspiu a palavra como se fosse veneno.
De súbito, percebeu que a mesa caíra em silêncio e que todos o estavam olhando. Sentiu que as lágrimas começavam a jorrar por trás de seus olhos e pôs-se em pé.
- Devo me retirar - disse, com o resto de sua dignidade. Virou-se e fugiu antes que o vissem chorar. Devia ter bebido mais vinho do que se dera conta. Seus pés emaranhavam-se debaixo do corpo quando tentou sair do salão e cambaleou de lado, esbarrando numa criada, atirando ao chão um jarro de vinho com especiarias. Gargalhadas trovejaram por todo o lado à sua volta, e Jon sentiu lágrimas quentes nas bochechas. Alguém tentou equilibrá-lo, mas ele saiu com violência daquelas mãos e correu meio cego para a porta. Fantasma o seguiu de perto para a noite.
O pátio estava silencioso e vazio. Uma sentinela solitária estava bem no alto, nas ameias da muralha interior, bem enrolada no manto contra o frio. O homem parecia aborrecido e infeliz ao apertar-se ali, sozinho, mas Jon teria rapidamente trocado de lugar com ele. Além da sentinela, o castelo estava escuro e deserto. Jon vira certa vez um castro abandonado, um lugar lúgubre onde nada se movia além do vento e as pedras mantinham o silêncio acerca de quem ali vivera. Hoje, Winterfell lembrava-lhe esse dia.
Os sons de música e cantos derramavam-se pelas janelas abertas em suas costas. Eram as últimas coisas que Jon queria ouvir. Limpou as lágrimas na manga da camisa, furioso por tê-las deixado fluir, e virou-se para ir embora.
- Rapaz - chamou uma voz.
Jon voltou-se.
Tyrion Lannister estava sentado na saliência por cima da porta do grande salão, assemelhando-se por completo a uma gárgula. O anão sorriu-lhe.
- Esse animal é um lobo?
- Um lobo gigante - disse Jon. - Chama-se Fantasma - pôs-se a olhar o homenzinho, de súbito esquecido do desapontamento. - O que faz aí? Por que não está no banquete?
- Está demasiado quente, demasiado ruidoso e bebi demasiado vinho - disse o anão. -Aprendi há muito que se considera má-educação vomitar por cima do irmão. Posso ver o seu lobo mais de perto?
Jon hesitou, mas depois concordou devagar.
- Consegue descer daí ou devo ir buscar uma escada?
- Ah, que se dane - disse o homenzinho. Atirou-se da saliência para o ar vazio. Jon sobressaltou-se, depois viu com um temor respeitoso como Tyrion Lannister rodopiou numa bola apertada, aterrissou ligeiro sobre as mãos e depois volteou para trás, caindo em pé.
Fantasma afastou-se dele com receio.
O anão sacudiu o pó e soltou uma gargalhada.
- Creio que assustei seu lobo. Minhas desculpas.
- Não está assustado - disse Jon. Ajoelhou-se e chamou seu lobo. - Fantasma, vem cá. Anda. Isso mesmo.
A cria de lobo aproximou-se e encostou o focinho no rosto de Jon, mas manteve um olho cuidadoso em Tyrion Lannister, e, quando o anão estendeu a mão para lhe fazer uma festa, afastou-se e mostrou os caninos num rosnado silencioso.
- É tímido, não é? - observou Lannister.
- Senta, Fantasma - ordenou Jon. - Isso mesmo. Quieto - ergueu os olhos para o anão. - Pode tocá-lo agora. Ele não se mexerá até que eu lhe diga para fazê-lo. Eu o tenho treinado.
- Compreendo - disse o Lannister. Esfregou o pelo branco como a neve entre as orelhas de Fantasma e disse: - Bonito lobo.
- Se eu não estivesse aqui, ele rasgaria sua garganta - disse Jon. Ainda não era bem verdade, mas viria a ser.
- Nesse caso, é melhor que fique por perto - disse o anão. Inclinou a cabeça grande demais rara um lado e observou Jon com seus olhos desiguais. - Chamo-me Tyrion Lannister.
- Eu sei - disse Jon. Ergueu-se. Em pé, era mais alto que o anão. Mas isto o fazia sentir-se estranho.
- E você é o bastardo de Ned Stark, não é?
Jon sentiu-se atravessado por uma sensação de frio. Apertou os lábios e não disse nada.
- Eu o ofendi? - disse Lannister. - Perdão. Os anões não têm de ter tato. Gerações de bobos Tiriegados conquistaram para mim o direito de me vestir mal e de dizer qualquer maldita coisa que me venha à cabeça - ele sorriu. - Mas você é o bastardo.
-Lorde Eddard Stark é meu pai - admitiu Jon rigidamente.
Lannister estudou-lhe o rosto.
- Sim - disse. - Consigo ver. Você tem em si mais do Norte que seus irmãos.
- Meios-irmãos - Jon corrigiu. O comentário do anão o agradara, mas tentou não mostrar.
- Deixe-me lhe dar um conselho, bastardo - disse Lannister. - Nunca se esqueça de quem é, porque é certo que o mundo não se lembrará. Faça disso sua força. Assim, não poderá ser nunca a sua fraqueza. Arme-se com esta lembrança, e ela nunca poderá ser usada para magoá-lo.
Jon não estava com disposição de ouvir conselhos de ninguém.
- Que sabe você de ser um bastardo?
- Todos os anões são bastardos aos olhos dos pais.
- Você é filho legítimo de Lannister.
- Ah, sou? - respondeu o anão, sarcástico. - Vá dizer isso ao senhor meu pai. Minha mãe morreu ao dar-me à luz, e ele nunca teve certeza.
- Nem sequer sei quem foi minha mãe - disse Jon.
- Uma mulher qualquer, sem dúvida. A maior parte delas é isso - dirigiu a Jon um sorriso tristonho. - Lembre-se disto, rapaz. Todos os anões serão bastardos, mas nem todos os bastardos precisam ser anões - e, com aquelas palavras, virou as costas e regressou vagarosamente ao banquete, assobiando uma canção. Quando abriu a porta, a luz vinda de dentro atirou sua sombra bem definida pelo pátio afora e, só por um momento, Tyrion Lannister ergueu-se alto como um rei.  

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