segunda-feira, 8 de julho de 2013

POLLYANNA - Capítulo I - Miss Polly



Naquela manhã de junho, Miss Polly Harrington entrou em sua cozinha um pouco apressada. Ela normalmente não fazia movimentos precipitados. Especialmente ela, que se orgulhava de seus modos educados. Mas hoje estava com pressa – estava realmente muito apressada.
Nancy, que lavava os pratos na pia, olhou para ela com surpresa. Ela trabalhava na casa de Miss Polly havia apenas dois meses, mas já sabia que a sua patroa nunca tinha pressa.
– Nancy!
– Sim, senhora – respondeu Nancy, alegremente, sem interromper a lavagem de um jarro.
– Nancy! – agora a voz de Miss Polly soava mais áspera. – Quando eu estiver falando com você, eu quero que você pare o seu trabalho e ouça o que estou dizendo.
Nancy ficou corada e largou imediatamente o jarro, quase o deixando cair, o que não ajudou em nada em sua postura.
– Sim, senhora, já vou – gaguejou ela, endireitando o jarro e virando-se rapidamente. – Eu só estava fazendo o meu trabalho, pois a senhora me disse, hoje de manhã, para terminar logo com a louça.
A patroa franziu as sobrancelhas.
– Está bem, Nancy. Eu não pedi explicações. Só quero que preste atenção.
– Sim, senhora – Nancy abafou um suspiro. Ela estava imaginando se alguma vez conseguiria agradar àquela mulher. Nancy nunca havia trabalhado fora antes. Porém, sua mãe estava doente e enviuvara recentemente, com três filhos pequenos, além da própria Nancy. A jovem se viu obrigada a fazer algo para ajudar no sustento da família e ficou muito contente em encontrar um lugar na cozinha da mansão, situada no alto da colina. Nancy tinha vindo de Corners, uma vila a seis quilômetros dali. Ela sabia que Miss Polly Harrington era a única dona da velha propriedade dos Harrington, e uma das mais ricas moradoras da cidade. Isto fora há dois meses. Agora ela conhecia Miss Polly como uma senhora carrancuda, que fazia cara feia se uma faca caísse no chão ou se uma porta batesse, mas que nunca sorria, mesmo quando as facas e as portas ficavam imóveis.
– Quando você acabar o trabalho da manhã – disse Miss Polly – pode limpar o quartinho que dá para a escada do sótão e faça a cama. Varra, limpe o quarto e, depois, retire as caixas e as malas.
– Sim, senhora. E, por favor, onde ponho as coisas que vou retirar de lá?
– Na parte da frente do sótão. – Miss Polly hesitou um momento e depois prosseguiu: – Eu acho bom já lhe contar, Nancy. A minha sobrinha, Miss Pollyanna Whittier, vem viver comigo. Tem onze anos e vai dormir naquele quarto.
– Uma menina, aqui, Miss Harrington? Que bom! – exclamou Nancy, pensando na alegria que eram as suas irmãs na sua casa em Corners.
– Bom, essa não seria exatamente a palavra que eu usaria – respondeu Miss Polly com rigor. – Contudo, pretendo fazer o melhor que puder. Sou uma boa pessoa e conheço meus deveres.
Nancy ficou com o rosto vermelho.
– Com certeza, senhora. Eu só pensei que uma menina aqui poderia trazer um pouco de alegria.
– Obrigada – murmurou, secamente, a senhora. – No entanto, eu não posso dizer que vejo alguma necessidade disso.
– Mas, com certeza, a senhora quer bem a filha da sua irmã – se arriscou Nancy, sentindo que, de alguma maneira, devia preparar as boas vindas para essa pequena estranha.
Miss Polly levantou arrogantemente o queixo.
– Realmente, Nancy, justo por ter tido uma irmã suficientemente tola para casar e colocar, sem necessidade, mais uma criança nesse mundo, que já está bem cheio, é que eu não vejo por que razão eu mesma devo ter que cuidar dela. Entretanto, como já disse, conheço meus deveres. E vê se limpa bem os cantos, Nancy – concluiu ela com severidade, saindo da cozinha.

– Sim senhora – suspirou Nancy, apanhando novamente o jarro, agora já meio seco, tanto que ela teria que lavá-lo de novo.
Em seu próprio quarto, Miss Polly pegou mais uma vez a carta que havia recebido dois dias antes, vinda de uma distante cidade no oeste, e que tinha sido uma desagradável surpresa para ela. A carta estava endereçada a “Miss Polly Harrington, Beldingsville, Vermont” e dizia o seguinte:
Prezada senhora: lamento informá-la de que o reverendo John Whittier faleceu duas semanas atrás, deixando uma filha única com onze anos de idade. Ele não deixou praticamente nada, salvo alguns livros, pois, como a senhora certamente sabe, ele era pastor de uma pequena paróquia e tinha um salário muito miserável.
Suponho que ele era marido da sua falecida irmã. Antes de morrer, ele deu a entender que, apesar do relacionamento entre as famílias não ser o melhor, ele pensou que pela memória da sua irmã a senhora talvez quisesse cuidar da criança e levá-la para morar entre os seus outros parentes do leste.
É por essa razão que estou lhe escrevendo.
Quando receber essa carta, a menina estará pronta para partir, e, se puder ficar com ela, agradeceríamos muito que a senhora nos confirmasse imediatamente, visto que há um casal indo em breve para o leste, e eles poderiam levá-la até Boston e colocá-la no trem para Beldingsville.
Naturalmente, a senhora será informada do dia e horário da chegada de Pollyanna.
Aguardando sua resposta favorável, subscrevemo-nos.
Respeitosamente,
Jeremiah O. White
Com um olhar carrancudo, Miss Polly dobrou a carta e a colocou no envelope. Ela havia respondido no dia anterior, dizendo que naturalmente ficaria com a criança. Ela sabia perfeitamente bem qual era o seu dever – por mais desagradável que fosse a situação.
Sentada com a carta nas mãos, os seus pensamentos voltaram-se para sua irmã Jenny, a mãe da criança, e até a época em que ela, com vinte anos, tinha teimado em casar com o jovem pastor, apesar da oposição de todos. Havia um homem bastante rico que a desejava, e a família preferia este no lugar do pastor. Mas Jenny não cedera. O homem, embora tivesse mais dinheiro, era mais velho, enquanto o pastor tinha a cabeça cheia de ideais e de entusiasmo, bem como um coração cheio de amor. Jenny, muito naturalmente, tinha preferido estes atributos. Casou-se com o pastor e foi para o sul como a esposa de um missionário.
A ruptura foi inevitável. Miss Polly recordava-se bem, apesar de ter apenas quinze anos. Na época era a mais nova, e a família tinha mais o que fazer do que pensar numa esposa de missionário. Jenny tinha escrito algum tempo depois, comunicando o nascimento de sua filha Pollyanna, assim chamada em homenagem às suas irmãs Polly e Anna. Tinha tido outros bebês, que morreram. Foi a última vez que Jenny escreveu e, alguns anos depois, tinha chegado a notícia do seu falecimento, através de uma carta lacônica do próprio pastor, enviada de uma pequena cidade do oeste.
Entretanto, o tempo não havia parado para os moradores da mansão na colina. Miss Polly, com os olhos postos no vale que se estendia à sua frente, refletiu nas mudanças que aqueles vinte e cinco anos haviam trazido.
Ela agora já tinha 40 anos e estava completamente só no mundo. O pai, a mãe e as irmãs, todos tinham morrido. Desde há alguns anos ela era a única dona da casa e dos milhares de dólares deixados pelo pai. Existiam algumas pessoas que lamentavam abertamente a sua vida solitária, aconselhando–a a cultivar amigos e companhias, mas ela rejeitava todos os conselhos. Não era solitária, dizia ela. Gostava de estar assim.
Gostava da tranquilidade. E, agora...
Miss Polly levantou-se com a testa franzida e a boca cerrada. Claro que estava satisfeita, considerava-se uma mulher de bem e não só conhecia o seu dever, como também tinha força de caráter suficiente para cumpri-lo.
Mas – POLLYANNA! – que nome ridículo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

NÃO DÊ SPOILERS!
Encontrou algum erro ortográfico no texto? Comente aqui para que possa arrumar :)
Se quer comentar e não tem uma conta no blogger ou google, escolha a opção nome/url e coloque seu nome. Nem precisa preencher o url.
Comentários anônimos serão ignorados