segunda-feira, 8 de julho de 2013

POLLYANNA - Capítulo XVIII - Os prismas



Depois que os dias quentes de agosto passaram, Pollyanna começou a ir com mais frequência ao casarão da colina de Pendleton. Contudo, ela achava que suas visitas não estavam tendo o sucesso esperado. Não que o homem desse mostras de que não a queria ali. Antes pelo contrário, muitas vezes ele a chamava. Mas quando ela estava lá ele não parecia ficar mais contente com a presença dela. Pelo menos, era isso que Pollyanna pensava.
Ele conversava com ela, é verdade, e mostrava muitas coisas bonitas e interessantes: livros, gravuras e outros objetos curiosos. Mas continuava a lamentar-se sobre o seu desamparo e a protestar contra as regras e as arrumações impostas pelos empregados indesejados. Parecia realmente gostar de ouvir Pollyanna falar e, assim, ela falava muito. Pollyanna gostava muito de falar, mas nunca sabia se, no momento seguinte, não ia, encontrá-lo com aquele olhar de sofrimento no rosto que sempre a atormentava. E nunca sabia ao certo se essa expressão provinha do que ela havia dito.
Quanto a ensiná-lo a jogar o jogo do contente, Pollyanna nunca viu uma oportunidade, nem mesmo quando pensava que ele estava lhe dando atenção. Tentou, por duas vezes, ensiná-lo, mas não conseguiu passar do princípio, das coisas que o pai dela costumava dizer. Nas duas vezes, John Pendleton mudou bruscamente o rumo da conversa.
Pollyanna já não tinha dúvidas de que John Pendleton havia sido namorado de sua tia Polly e, com todas as forças do seu coração, desejava um dia poder trazer felicidade àquelas duas vidas miseravelmente solitárias.
Ela não sabia como poderia conseguir isso. Conversava com Mr. Pendleton sobre a tia e ele escutava, por vezes educadamente, por vezes irritado, mas frequentemente com um sorriso estranho nos lábios habitualmente sisudos. Ela falava à tia sobre Mr. Pendleton, ou melhor, tentava falar sobre ele, porque Miss Polly normalmente não a escutava muito. Quase sempre encontrava um motivo para mudar de assunto. No entanto, ela também fazia isso frequentemente quando Pollyanna falava de outras pessoas, como, por exemplo, do doutor Chilton. Pollyanna atribuía isto ao fato do doutor Chilton tê-la visto no solário com a rosa no cabelo e o xale nos ombros. Realmente, a tia parecia particularmente amargurada com o doutor Chilton, como Pollyanna veio a descobrir no dia em que ficou de cama com uma grande gripe.
– Se não melhorar durante a noite mando chamar o médico – disse tia Polly.
– Manda? Então vou fazer força para ficar pior, pois gostaria muito que o doutor Chilton viesse me ver!
Pollyanna ficou surpresa com a expressão no rosto da tia.
– Não será o doutor Chilton, Pollyanna – disse Miss Polly, gravemente. – O doutor Chilton não é o médico da nossa família. Se piorar, mando chamar o doutor Warren.
Pollyanna não piorou e por isso não foi necessário chamar o doutor Warren. Nessa noite, ela disse à tia:
– Gosto muito do doutor Warren, mas prefiro o doutor Chilton e acho que ele ficaria magoado se não o chamasse. Afinal ele não tem culpa de tê-la visto quando a penteei no outro dia, tia Polly – concluiu ela, tristonha.
– Chega, Pollyanna! Eu realmente não quero discutir o doutor Chilton, nem os seus sentimentos – respondeu Miss Polly rispidamente.
Pollyanna olhou para ela com um olhar triste, depois deu um grande suspiro.
— Gosto muito de vê-la com as faces coradas como agora, tia Polly, mas também gostaria muito de arrumar o seu cabelo se... por que é que não deixa, tia Polly? — mas a tia já tinha ido embora.
Foi num dia de manhã, no final de agosto, quando Pollyanna visitava John Pendleton, que ela descobriu o reflexo de um arco-íris no travesseiro dele e ficou encantada.
– Olhe, Mr. Pendleton é um arco-íris bebê, um arco-íris de verdade! Veio visitá-lo! – exclamou ela batendo palmas. – Mas como ele é bonito! Como terá entrado?
O homem riu com pouca vontade. John Pendleton não estava muito bem disposto naquela manhã.
– Eu acho que deve ter entrado pelo vidro do termômetro que está na janela – disse, com ar cansado. – O sol bate nele durante toda manhã.
– Mas é tão bonito, Mr. Pendleton! É o sol que faz isso? Se o termômetro fosse meu, eu o deixava pendurado no sol o dia inteiro.
– Pobre termômetro! – disse o homem, rindo. – E como saberíamos a temperatura se o termômetro ficasse pendurado no sol o dia todo?
– Eu não me importaria – respondeu Pollyanna, fascinada com as lindas cores do arco-íris sobre o travesseiro. – Como se as pessoas se importassem se pudessem viver o tempo todo num arco-íris!
O homem riu. Observava com curiosidade o rosto embevecido de Pollyanna. De repente lhe ocorreu um novo pensamento e tocou a campainha.
– Nora – chamou ele, quando a empregada apareceu à porta, – traga-me um daqueles candelabros que estão em cima da lareira, na sala da frente.
– Sim, senhor – murmurou a mulher, um pouco surpreendida. Logo estava de volta. Um tinir musical invadiu o quarto enquanto ela se dirigia para a cama. Vinha dos prismas suspensos no candelabro antigo que ela segurava.
– Obrigado. Pode deixá-lo aqui. Agora arranje um fio e prenda-o no varão das cortinas, naquela janela. Abra as cortinas e passe o fio de um lado a outro da janela. É tudo, obrigado – disse ele, depois dela ter seguido as suas instruções.
Quando a empregada deixou o quarto ele olhou sorridente para Pollyanna, que estava admirada.
– Agora, por favor, me traga o candelabro, Pollyanna.
Segurando-o com ambas as mãos, ela o trouxe até a cama com cuidado. Ele começou, então, a retirar os prismas um a um, até que na cama, lado a lado, encontravam-se doze prismas.
– Agora minha querida, leve-os até lá e pendure-os naquele fio da janela. Se você realmente quer viver num arco-íris, vamos fazer um onde possa viver!
Pollyanna ainda não tinha pendurado nem três dos prismas na janela banhada pelo sol e já via uma amostra do que ia acontecer. Estava tão entusiasmada que mal controlava os dedos trêmulos, inclusive tendo dificuldade para pendurar os restantes. Quando concluiu a tarefa, deu um passo para trás e gritou, encantada.
Aquele quarto suntuoso e sombrio tinha se transformado num conto de fadas. Por todo o lado viam-se reflexos dançantes vermelhos e verdes, violeta e laranja, amarelos e azuis. As paredes, o chão, a mobília, até a cama, estavam iluminados com aqueles bonitos pedacinhos de cor.
– Oh, que lindo! Até parece que o próprio sol está querendo jogar o jogo, não acha? – disse ela, esquecendo-se que Mr. Pendleton não podia saber do que é que ela estava falando. – Quem me dera ter muitos iguais a eles! Gostaria muito de poder dá-los à tia Polly, a Mrs. Snow e a muitas outras pessoas. Iriam ficar muito contentes! Se a tia Polly vivesse num arco-íris como este, acho que ela ficaria tão contente que não conseguiria evitar de bater as portas. Não acha?
Mr. Pendleton riu.
– Bom, do que me lembro da sua tia, suponho que seria preciso mais do que uns prismas no sol para que a alegria dela a fizesse bater as portas. Mas, me diga, que jogo é esse?
Pollyanna hesitou. Depois respirou fundo e disse:
– Ah, me esqueci. O senhor não conhece o jogo.
– E porque você não me conta como é?
Foi desta vez que Pollyanna conseguiu. Contou tudo desde o princípio, desde as muletas que vieram no lugar da boneca. E, enquanto falava, não olhava para ele. Os olhos extasiados continuavam fixos nas cores dos prismas balançando ao sol.
– E é tudo. Agora já sabe porque eu disse que o sol estava tentando jogar esse jogo.
Durante alguns segundos, fez-se silêncio. Depois ouviu-se uma voz baixa vinda da cama:
– Talvez, mas ainda acho que o mais belo dos prismas é você, Pollyanna.
– Mas eu não consigo refletir essas cores lindas quando o sol bate em mim, Mr. Pendleton!
– Não consegue? — sorriu o homem. E Pollyanna, observando o rosto dele, viu, admirada, que ele tinha os olhos marejados de lágrimas.
– Não – disse ela. Passado um minuto, acrescentou, cabisbaixa: – Receio que o sol em mim só faça sardas. A tia Polly diz que é o sol que as faz!
O homem riu um pouco. Pollyanna olhou outra vez para ele, pois o riso tinha soado quase como um soluço.

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