Foi Hyle
Hunt quem insistiu para que levassem as cabeças.
- Tarly
há de querê-las para as muralhas.
- Não
temos alcatrão - Brienne observou. - A carne apodrecerá. Deixe-as -
não queria viajar através da penumbra verde dos pinhais com as
cabeças dos homens que matara.
Hunt não
lhe deu ouvidos. Ele mesmo cortou o pescoço dos mortos, atou as três
cabeças pelos cabelos e pendurou-as na sela. Brienne não teve
alternativa exceto fazer de conta que não estavam lá, mas, por
vezes, especialmente à noite, conseguia sentir os olhos mortos em
suas costas, e uma vez sonhou que as ouvia murmurar umas com as
outras.
O tempo
estava frio e úmido na Ponta da Garra Rachada quando caminharam
sobre os próprios passos no sentido inverso. Em alguns dias chovia,
em outros ameaçava chover. Nunca se sentiam quentes. Até quando
acampavam, era difícil encontrar madeira seca suficiente para uma
fogueira.
Quando
chegaram aos portões de Lagoa da Donzela, uma hoste de moscas os
seguia, um corvo comera os olhos de Shagwell, e Pyg e Timeon estavam
cobertos de vermes. Brienne e Podrick havia muito tinham se
acostumado a seguir cem metros à frente de Hunt, para manter o
cheiro da decomposição bem atrás. Sor Hyle afirmava ter perdido
todo o sentido do olfato.
-
Enterre-os - dizia-lhe Brienne sempre que acampavam para a noite, mas
Hunt não devia nada à teimosia. O mais certo é que ele diga a
Lorde Randyll que matou os três.
Para sua
honra, porém, o cavaleiro não fez nada disso.
- O
escudeiro gago atirou uma pedra - disse, quando ele e Brienne foram
levados à presença de Tarly no pátio do castelo de Mooton. As
cabeças tinham sido apresentadas a um sargento da guarda, a quem foi
ordenado que as limpasse, alcatroasse e montasse por cima do portão.
- A espadachim fez o resto.
- Todos
os três? - Lorde Randyll estava incrédulo.
- Lutando
daquela maneira, podia ter matado mais três.
- E
encontrou a garota Stark? - perguntou Tarly a Brienne.
- Não,
senhor.
- Em vez
disso matou umas tantas ratazanas. Gostou?
- Não,
senhor.
- É um a
pena. Bem, provou um pouco de sangue. Demonstrou seja o que for que
queria demonstrar. É hora de tirar essa cota de malha e de voltar a
vestir roupas apropriadas. Há navios no porto. Um deles terá de
parar em Tarth. Quero você nele.
-
Obrigada, senhor, mas não.
O rosto
de Lorde Tarly sugeria que não havia nada que lhe agradasse mais do
que espetar a cabeça de Brienne num espigão e colocá-la por cima
dos portões de Lagoa da Donzela com Timeon, Pyg e Shagwell.
-
Pretende prosseguir com essa loucura?
-
Pretendo encontrar a Senhora Sansa.
- Se me
permite, senhor - disse Sor Hyle - eu a vi lutar com os Saltimbancos.
Ela é mais forte do que a maioria dos homens, e também é rápida...
- A
espada é rápida - interrompeu Tarly. - É esta a natureza do aço
valiriano. Mais forte do que a maioria dos homens? Sei. É uma
aberração da natureza, longe de mim negá-lo.
Homens
como ele nunca gostarão de mim, pensou Brienne, não importa o que
eu faça.
- Senhor,
pode ser que Sandor Clegane saiba da garota. Se conseguisse
encontrá-lo...
- Clegane
tornou-se fora da lei. Agora acompanha Beric Dondarrion, ao que
parece. Ou não, as histórias variam. Mostre-me onde eles estão
escondidos, e de bom grado lhes rasgarei a barriga, lhes puxarei as
entranhas para fora e as queimarei. Enforcamos dúzias de fora da
lei, mas os chefes ainda nos escapam. Clegane, Dondarrion, o
sacerdote vermelho, e agora uma mulher chamada Coração de Pedra...
como é que você propõe encontrá-los, se eu não consigo?
- Senhor,
eu... - não tinha nenhuma boa resposta para lhe dar. - Tudo que
posso fazer é tentar.
- Então
tente. Tem a sua carta, não precisa da minha permissão, mas eu a
dou mesmo assim. Se tiver sorte, tudo que ganhará com seu esforço
serão assaduras da sela. Caso contrário, talvez Clegane lhe permita
viver, depois de ele e sua matilha acabarem de violá-la. Pode
rastejar de volta a Tarth com o bastardo de um cão na barriga.
Brienne
ignorou aquilo.
- Se me
permite a pergunta, quantos homens acompanham Cão de Caça?
- Seis,
sessenta ou seiscentos. Parece que depende da pessoa a quem se
pergunta - Randyll Tarly estava claramente farto da conversa, e
começou a virar-lhe as costas.
- Se o
meu escudeiro e eu pudermos suplicar por sua hospitalidade até...
-
Suplique o que quiser. Não os tolerarei sob o meu telhado.
Sor Hyle
Hunt deu um passo adiante.
- Se me
permite a ousadia, julgava que o telhado ainda era de Lorde Mooton.
Tarly
lançou ao cavaleiro um olhar venenoso.
- Mooton
tem a coragem de um verme. Não me fale de Mooton. Quanto a você,
senhora, diz-se que seu pai é um bom homem. Se assim é, tenho pena
dele. Há homens que são abençoados com filhos, outros, com filhas.
Nenhum homem merece ser amaldiçoado com alguém como você. Viva ou
morra, Senhora Brienne, mas não regresse à Lagoa da Donzela
enquanto eu governar aqui.
As
palavras são vento, Brienne disse a si mesma. Não podem machucá-la.
Deixe-as passar por você como água.
"Às
suas ordens, senhor”, tentou dizer, mas Tarly foi-se embora antes
de ela conseguir articular as palavras. Saiu do pátio como uma
sonâmbula, sem saber para onde ir.
Sor Hyle
pôs-se a seu lado.
- Há
estalagens.
Brienne
balançou a cabeça. Não queria conversa com Hyle Hunt.
-
Lembra-se do Ganso Fedorento?
Seu manto
ainda guardava o fedor do lugar.
- Por
quê?
-
Encontre-se comigo lá amanhã, ao meio-dia. Meu primo Alyn foi um
dos homens enviados para encontrar o Cão de Caça. Eu falo com ele.
- E por
que faria isso?
- Por que
não? Se tiver sucesso onde Alyn falhou, poderei atormentá-lo com
isso durante anos.
Ainda
havia estalagens em Lagoa da Donzela; Sor Hyle não se enganara.
Contudo, algumas tinham sido incendiadas durante um ou outro saque, e
assim continuavam, e aquelas que restavam estavam cheias até
rebentar com homens da hoste de Lorde Tarly. Ela e Podrick
visitaram-nas todas naquela tarde, mas não havia camas disponíveis
em nenhuma.
- Sor?
Senhora? - disse Podrick no momento em que o sol se punha. - Há
navios. Navios têm camas. Camas de rede. Ou beliches.
Os homens
de Lorde Randyll ainda patrulhavam as docas, tantos como as moscas
que tinham esvoaçado em volta das cabeças dos três Saltimbancos
Sangrentos, mas seu sargento conhecia Brienne de vista e os deixou
passar. Os pescadores locais prendiam amarras para a noite e
anunciavam a captura do dia, mas o interesse dela centrava-se nos
navios maiores que percorriam as águas tempestuosas do mar estreito.
Havia meia dúzia no porto, embora um deles, uma galeota chamada
Filha do Titã, estivesse atirando as amarras para o cais a fim de
zarpar com a maré da noite. Ela e Podrick Payne fizeram a ronda aos
navios que ficaram. O mestre da Garota de Vila Gaivota tomou Brienne
por uma prostituta e lhes disse que seu navio não era um bordel, e
um arpoeiro de um baleeiro ibenês ofereceu-se para lhe comprar o
garoto, mas encontraram melhor sorte em outros navios. Comprou uma
laranja para Podrick no Caminhante do Mar, uma coca vinda de
Vilavelha, via Tyrosh, Pentos e Valdocaso.
- A
seguir é Vila Gaivota - disse-lhe o capitão - e daí dobramos os
Dedos e rumamos a Vilirmãs e Porto Branco, se as tempestades
deixarem. Aqui o Caminhante é um navio limpo, não tem tantos ratos
como a maioria, e vamos ter a bordo ovos frescos e manteiga
recém-preparada. A senhora está à procura de passagem para o
norte?
- Não -
ainda não. Sentia-se tentada, mas...
Enquanto
se dirigiam ao cais seguinte, Podrick saltou de um pé para o outro e
disse:
- Sor?
Senhora? E se a senhora fosse para casa? Minha outra senhora, quero
dizer. Sor. A Senhora Sansa.
-
Incendiaram a casa dela.
- Mesmo
assim. É onde estão seus deuses. E os deuses não morrem.
Os deuses
não morrem, mas as garotas sim.
- Timeon
era um homem cruel e um assassino, mas não me parece que tenha
mentido sobre Cão de Caça. Não podemos ir para o norte até termos
certeza. Haverá outros navios.
Na ponta
oriental do porto finalmente encontraram abrigo para a noite a bordo
de uma galé mercante maltratada pelo mar, chamada Senhora de Myr.
Estava bastante adernada, depois de ter perdido o mastro e metade da
tripulação numa tempestade, mas o dono não tinha a quantia de que
necessitava para repará-la, de modo que ficou feliz por aceitar
algumas moedas de Brienne e permitir que ela e Pod partilhassem uma
cabine vazia.
Tiveram
uma noite agitada. Brienne acordou por três vezes. Uma quando a
chuva começou e outra com um rangido que a fez pensar que Lesto Dick
se aproximava pé ante pé para matá-la. Da segunda vez acordou de
faca na mão, mas não era nada. Na escuridão da pequena e apertada
cabine, precisou de um momento para se lembrar de que Lesto Dick
estava morto. Quando finalmente voltou a adormecer, sonhou com os
homens que matara. Dançavam em volta dela, troçando, dando-lhe
beliscões enquanto ela os golpeava com a espada. Fez todos eles em
tiras sangrentas, mesmo assim continuaram a formigar em volta dela...
Shagwell, Timeon e Pyg, sim, mas também Randyll Tarly, e Vargo Hoat,
e Ronnet Vermelho Connington. Ronnet tinha uma rosa entre os dedos.
Quando lhe apresentou a rosa, Brienne cortou-lhe a mão.
Acordou
transpirando, e passou o resto da noite encolhida sob o manto,
ouvindo a chuva tamborilar no convés sobre sua cabeça. Foi uma
noite violenta. De tempos em tempos ouvia o som de trovões distantes
e pensava no navio bravosiano que zarpara na maré da noite.
Na manhã
seguinte, redescobriu o Ganso Fedorento, acordou sua desmazelada
proprietária e pagou-lhe por umas salsichas gordurentas, pão frito,
meia taça de vinho, um jarro de água fervida e duas taças limpas.
A mulher olhou Brienne com o canto dos olhos enquanto punha a água
para ferver.
- Você é
a grandalhona que foi com Lesto Dick. Estou me lembrando. Ele enganou
você?
- Não.
-
Violou-a?
- Não.
- Roubou
seu cavalo?
- Não.
Foi morto por três fora da lei.
- Fora da
lei? - a mulher parecia mais curiosa do que perturbada. - Sempre
achei que o Dick ia acabar pendurado, ou mandado para a Muralha.
Comeram o
pão frito e metade das salsichas. Podrick Payne empurrou a sua para
baixo com água com sabor de vinho, enquanto Brienne embalava uma
taça de vinho aguado e perguntava a si mesma por que teria vindo.
Hyle Hunt não era um verdadeiro cavaleiro. Seu rosto honesto era só
uma máscara de saltimbanco. Não preciso de sua ajuda, não preciso
de sua proteção, e não preciso dele, disse a si mesma. Ele
provavelmente nem sequer virá. Dizer-me para nos encontrarmos aqui
foi só mais uma brincadeira.
Estava se
levantando para ir embora quando Sor Hyle chegou.
-
Senhora. Podrick - olhou de relance as taças, os pratos e as
salsichas meio comidas que esfriavam numa poça de gordura, e disse:
- Deuses, espero que não tenha comido a comida deste lugar.
- O que
comemos não lhe diz respeito - Brienne respondeu. - Encontrou seu
primo? O que foi que ele lhe disse?
- Sandor
Clegane foi visto pela última vez em Salinas, no dia do ataque.
Depois cavalgou para oeste, ao longo do Tridente.
Brienne
franziu as sobrancelhas.
- O
Tridente é um rio comprido.
- Sim,
mas não me parece que nosso cão tenha vagueado até muito longe da
foz. Westeros perdeu o encanto que tinha para ele, ao que parece. Em
Salinas andava à procura de um navio - Sor Hyle tirou um rolo de
pele de ovelha da bota, afastou as salsichas, e o desenrolou.
Revelou-se um mapa. - Cão de Caça matou três dos homens do irmão
na velha estalagem junto ao entroncamento, aqui. Liderou o ataque a
Salinas, aqui - tamborilou em Salinas com o dedo. - Pode estar
encurralado. Os Frey estão aqui em cima nas Gêmeas, Darry e
Harrenhal ficam para o sul, do outro lado do Tridente, a oeste tem os
Blackwood e os Bracken em guerra, e Lorde Randyll está aqui em Lagoa
da Donzela. A estrada de altitude até o Vale está fechada pela
neve, ainda que conseguisse passar pelos clãs da montanha. Para onde
haveria um cão de ir?
- Se ele
estiver com Dondarrion...?
- Não
está. Alyn tem certeza disso. Os homens de Dondarrion também andam
à procura dele. Espalharam o rumor de que pretendiam enforcá-lo
pelo que fez em Salinas. Não participaram nisso. Lorde Randyll anda
dizendo que participaram na esperança de virar os plebeus contra
Beric e sua irmandade. Nunca apanhará o senhor do relâmpago
enquanto o povo continuar a protegê-lo. E há um outro bando,
liderado pela tal mulher, Coração de Pedra... amante de Lorde
Beric, de acordo com uma história. Ela supostamente foi enforcada
pelos Frey, mas Dondarrion a beijou e devolveu-a à vida, e agora ela
não pode morrer, assim como ele - Brienne examinou o mapa.
- Se
Clegane foi visto pela última vez em Salinas, esse seria o lugar
certo para encontrar seu rasto.
- Alyn
disse que já não resta ninguém em Salinas, a não ser um velho
cavaleiro escondido em seu castelo.
- Mesmo
assim, seria um lugar para começar.
- Há um
homem - disse Sor Hyle. - Um septão. Ele atravessou meu portão um
dia antes de vocês aparecerem. O nome dele é Meribald. Nascido e
criado no rio, e serviu ali a vida toda. Parte amanhã para fazer seu
circuito, e visita sempre Salinas. Devíamos ir com ele.
Brienne
ergueu vivamente o olhar.
-
Devíamos?
- Eu vou
com você.
- Não,
não vai.
- Bem, eu
vou com o Septão Meribald até Salinas. Você e Podrick podem ir
para onde bem quiserem.
- Lorde
Randyll ordenou que me seguisse outra vez?
- Ele
ordenou que ficasse longe de você. Lorde Randyll é de opinião que
você talvez se beneficiasse de uma boa e rija violação.
- Então
por que haveria de seguir comigo?
- É isso
ou voltar aos deveres do portão.
- Se o
seu senhor ordenou...
- Ele já
não é o meu senhor.
Aquilo a
surpreendeu.
-
Abandonou seu serviço?
- Sua
senhoria informou-me de que já não tinha necessidade da minha
espada, nem da minha insolência. Vai dar no mesmo. Daqui em diante,
desfrutarei da vida aventurosa de um cavaleiro andante... se bem que,
no caso de encontrarmos Sansa Stark, imagino que seremos bem
recompensados.
Ouro e
terras, é tudo que ele vê nisto.
-
Pretendo salvar a garota, não vendê-la. Fiz um juramento.
- Eu não
me lembro de tê-lo feito.
- É por
isso que não virá comigo.
Partiram
na manhã seguinte, ao nascer do sol.
Era uma
estranha procissão: Sor Hyle montado num corcel cor de avelã e
Brienne em sua grande égua cinzenta, Podrick Payne escarranchado em
seu cavalo malhado de dorso curvado, e o Septão Meribald caminhando
ao lado deles, com seu cajado, indicando o caminho a um pequeno burro
e a um grande cão. O burro levava uma carga tão pesada que Brienne
sentiu certo temor de que lhe quebrasse o dorso.
- Comida
para os pobres e famintos das terras fluviais - disse-lhes o Septão
Meribald aos portões de Lagoa da Donzela. - Sementes, nozes e fruta
seca, mingau de aveia, farinha, pão de cevada, três queijos
amarelos da estalagem perto do Portão do Bobo, bacalhau salgado para
mim, carneiro salgado para o Cão... oh, e sal. Cebolas, cenouras,
nabos, duas sacas de feijão, quatro de cevada e nove de laranjas.
Tenho um fraquinho por laranjas, confesso. Comprei estas de um
marinheiro, e temo que sejam as últimas que comerei até a
primavera.
Meribald
era um septão sem septo, apenas um degrau acima de um irmão
mendicante na hierarquia da Fé. Havia centenas como ele, um bando
esfarrapado cuja humilde tarefa era se arrastar de uma aldeia
minúscula como cocô de mosca para a seguinte, conduzindo serviços
sagrados, celebrando casamentos e perdoando pecados. Esperava-se que
aqueles que visitava o alimentassem e lhe fornecessem abrigo, mas a
maioria era tão pobre quanto ele, e Meribald não podia permanecer
muito tempo num lugar sem causar dificuldades aos seus hóspedes.
Estalajadeiros bondosos deixavam-no por vezes dormir em suas cozinhas
ou estábulos, e havia septerias e castros, e até alguns castelos,
onde sabia que lhe seria dada hospitalidade. Onde não havia lugares
assim por perto, dormia sob as árvores ou dentro de sebes.
- Há
muitas boas sebes nas terras fluviais - dizia Meribald. - As velhas
são as melhores. Nada bate uma sebe com cem anos. Dentro de uma
dessas, um homem pode dormir tão aconchegado quanto numa estalagem,
e com menos medo de pulgas.
O septão
não sabia ler nem escrever, como confessou alegremente na estrada,
mas conhecia uma centena de preces diferentes e podia recitar de
memória longas passagens da Estrela de Sete Pontas, o que era tudo
que bastava nas aldeias. Tinha o rosto marcado por cicatrizes e a
pele queimada pelo vento, uma mecha de espessos cabelos grisalhos,
rugas nos cantos dos olhos. Embora fosse um homem grande, com um
metro e oitenta, tinha um modo de se inclinar para a frente ao
caminhar que o fazia parecer muito mais baixo. Suas mãos eram
grandes e exibiam uma textura de couro, com os nós dos dedos
vermelhos e sujeira debaixo das unhas, e ele tinha os maiores pés
que Brienne alguma vez vira, nus, negros e duros como chifres.
- Não
uso sapato há vinte anos - disse ele a Brienne, - No primeiro ano,
tinha mais bolhas do que dedos nos pés, e as solas sangravam como
porcos sempre que caminhava por pedra dura, mas rezei, e o Sapateiro
no Céu transformou-me a pele em couro.
- Não há
nenhum sapateiro no céu - Podrick protestou.
- Há,
sim, moço... embora talvez o conheça por outro nome. Diga-me, de
qual dos sete deuses gosta mais?
- Do
Guerreiro - Podrick respondeu, sem um momento de hesitação.
Brienne
pigarreou.
- No
Entardecer, o septão de meu pai sempre disse que não havia mais do
que um deus.
- Um deus
com sete aspectos. É verdade, senhora, e tem razão em fazer notar
isso, mas o mistério dos Sete Que São Um não é fácil de entender
para a gente simples, e se eu sou alguma coisa simples, falo de sete
deuses - Meribald voltou-se de novo para Podrick. - Nunca conheci um
garoto que não adorasse o Guerreiro. Mas eu sou velho e, como velho,
adoro o Ferreiro. Sem o seu trabalho, o que defenderia o Guerreiro?
Todas as vilas têm um ferreiro, e todos os castelos também. Fazem
os arados de que precisamos para plantar as nossas culturas, os
pregos que usamos para construir os nossos navios, as ferraduras para
proteger os cascos de nossos fiéis cavalos, as brilhantes espadas de
nossos senhores. Ninguém podia duvidar do valor de um ferreiro, por
isso batizamos um dos Sete em sua honra, mas podíamos perfeitamente
ter lhe chamado Lavrador ou Pescador, Carpinteiro ou Sapateiro.
Aquilo em que ele trabalha não importa. O que importa é que
trabalha. O Pai governa, o Guerreiro luta, o Ferreiro labuta, e
juntos fazem tudo aquilo que é legítimo que um homem faça. Tal
como o Ferreiro é um aspecto da divindade, o Sapateiro é um aspecto
do Ferreiro. Foi ele quem ouviu as minhas preces e me curou os pés.
- Os
deuses são bons - disse Sor Hyle numa voz seca - mas para que
incomodá-los, quando podia simplesmente ter ficado com os sapatos?
- Andar
descalço era a minha penitência. Até os santos septões podem ser
pecadores, e a minha carne era tão fraca quanto a carne pode ser.
Era jovem e cheio de vitalidade, e as garotas... Um septão pode
parecer galante como um príncipe se for o único homem que se
conhece que já esteve a mais de uma milha de nossa aldeia. Eu
recitava-lhes coisas da Estrela de Sete Pontas. O Livro da Donzela
era o que funcionava melhor. Oh, eu era um homem perverso antes de
tirar os sapatos. Envergonha-me pensar em todas as donzelas que
deflorei.
Brienne
moveu-se desconfortavelmente na sela, recordando o acampamento à
sombra das muralhas de Jardim de Cima e a aposta que Sor Hyle e os
outros tinham feito para ver quem primeiro conseguia dormir com ela.
- Andamos
à procura de uma donzela - confidenciou Podrick Payne. - Uma donzela
bem-nascida de treze anos, com cabelos ruivos.
- Pensava
que procurava um fora da lei.
- Também
- Podrick admitiu.
- A maior
parte dos viajantes faz o possível para evitar homens assim - disse
o Septão Meribald - mas vocês andam à procura deles.
- Só
procuramos um fora da lei -disse Brienne. - O Cão de Caça.
- Foi o
que Sor Hvle me contou. Que os Sete os protejam, filha. Diz-se que
ele deixa um rastro de bebês assassinados e donzelas violentadas por
onde passa. Ouvi chamarem-no Cão Louco de Salinas. O que gente boa
iria querer de tal criatura?
- A
donzela de que Podrick falou pode estar com ele.
- De
verdade? Então temos de rezar pela pobre garota.
E por
mim, pensou Brienne, uma prece também por mim. Pedi à Velha para
erguer a lâmpada e me levar até a Senhora Sansa, e ao Guerreiro
para dar força ao meu braço, para que eu possa protegê-la. Mas não
disse aquelas palavras em voz alta; não as diria onde Hyle Hunt
pudesse ouvi-las e zombar de sua fraqueza de mulher.
Com o
Septão Meribald a pé e seu burro tão carregado, o progresso foi
lento ao longo de todo aquele dia. Não seguiram pela estrada
principal para oeste, o caminho que Brienne outrora percorrera com
Sor Jaime, quando vieram em sentido contrário e foram encontrar
Lagoa da Donzela saqueada e cheia de cadáveres. Em vez disso,
dirigiram-se para noroeste, seguindo a costa da Baía dos Caranguejos
por uma trilha tortuosa que era tão pequena que não aparecia em
nenhum dos preciosos mapas de pele de ovelha de Sor Hyle. Os íngremes
montes, os negros pântanos e as florestas de pinheiros da Ponta da
Garra Rachada não se viam em parte alguma daquele lado de Lagoa da
Donzela. As terras por onde viajavam eram baixas e úmidas, uma
região selvagem de dunas de areia e pântanos de água salgada sob a
vasta abóbada azul-acinzentada do céu. A estrada tendia a
desaparecer por entre os juncos e as lagoas de maré, apenas para
voltar a aparecer uma milha mais à frente; Brienne sabia que sem
Meribald certamente já teriam se perdido. O chão era frequentemente
pouco estável, de modo que havia lugares em que o septão avançava
sozinho, sondando o terreno com o cajado para se assegurar de que
havia apoio suficiente. Não se viam árvores por léguas ao redor,
só o mar, o céu e a areia.
Nenhuma
terra poderia ser mais diferente de Tarth, com suas montanhas e
quedas-d'água, seus prados de altitude e vales ensombrados, mas
Brienne achou que aquele lugar tinha sua própria beleza.
Atravessaram uma dúzia de lentos cursos de água, repletos de rãs e
de grilos, viram andorinhas-do-mar flutuando muito acima da baía,
ouviram o chamado dos borrelhos entre as dunas. Uma vez, uma raposa
cruzou seu caminho e pôs o cão de Meribald a latir como louco.
E também
havia pessoas. Algumas viviam entre os juncos, em casas feitas de
lama e palha, enquanto outras pescavam na baía em pequenos barcos de
couro e construíam as casas sobre instáveis estacas de madeira nas
dunas. A maior parte parecia viver só, longe da vista de qualquer
habitação humana além da sua. Pareciam ser, na maior parte, um
povo reservado, mas perto do meio-dia o cão desatou de novo a latir,
e três mulheres emergiram dos juncos para dar a Meribald um cesto de
vime cheio de amêijoas. Em troca, o septão deu uma laranja a cada
uma, embora as amêijoas fossem no mundo tão comuns como lama, e as
laranjas raras e valiosas. Uma das mulheres era muito velha, outra
estava pesada com uma criança na barriga, e a terceira era uma
garota tão fresca e bonita como uma flor na primavera. Quando
Meribald as levou consigo para escutar seus pecados, Sor Hyle soltou
um risinho e disse:
-
Dir-se-ia que os deuses caminham conosco... pelo menos a Donzela, a
Mãe e a Velha - Podrick pareceu tão espantado que Brienne teve de
lhe dizer que não, que eram só três mulheres dos pântanos.
Mais
tarde, quando retomaram a viagem, ela se virou para o septão e
disse:
- Essas
pessoas vivem a menos de um dia de viagem de Lagoa da Donzela, e no
entanto a guerra não as tocou.
- Têm
pouco que se toque, senhora. Seus tesouros são conchas, pedras e
barcos de couro, suas melhores armas são facas de ferro
enferrujadas. Nascem, vivem, amam, morrem. Sabem que Lorde Mooton
governa suas terras, mas poucos foram os que alguma vez o viram, e
Correrrio e Porto Real não passam de nomes para eles.
- E, no
entanto, conhecem os deuses - Brienne retrucou. - Isto é obra sua,
me parece. Há quanto tempo percorre as terras fluviais?
- Fará
quarenta anos em breve - disse o septão, e o cão soltou um sonoro
latido. - De Lagoa da Donzela a Lagoa da Donzela, meu circuito demora
meio ano, e às vezes mais, mas não direi que conheço o Tridente.
Vislumbro os castelos dos grandes senhores só a distância, mas
conheço as vilas francas e os castros, as aldeias pequenas demais
para terem nome, as sebes e os montes, os regatos onde um homem com
sede pode beber e as grutas onde pode se abrigar. E também conheço
as estradas que o povo usa, os trilhos tortos e lamacentos que não
aparecem em mapas de pergaminho - soltou um risinho. - E é bom que
conheça. Meus pés percorreram dez vezes cada milha.
As
estradas secundárias são aquelas que os fora da lei usam, e as
grutas seriam belos locais para homens foragidos se esconderem. Uma
ponta de desconfiança levou Brienne a perguntar a si mesma se Sor
Hyle conheceria aquele homem tão bem quanto pensava.
- Isso
tudo dá uma vida solitária, septão.
- Os Sete
estão sempre comigo - disse Meribald - e tenho o meu fiel criado, e
o Cão.
- Seu cão
tem nome? - Podrick Payne qui saber.
- Deve
ter - disse Meribald - mas não é meu. Ele não.
O cão
latiu e abanou a cauda. Era uma criatura enorme e hirsuta, pelo menos
sessenta quilos de cão, mas amigável.
- A quem
pertence? - o rapaz perguntou novamente.
- Ora, a
si mesmo, e aos Sete. Quanto ao nome, não me disse qual é.
Chamo-lhe Cão.
- Oh -
era evidente que Podrick não sabia o que pensar de um cão chamado
Cão. O garoto ruminou aquilo durante algum tempo, após o que disse:
- Eu tinha um cão quando era pequeno. Dei-lhe o nome de Herói.
- E era?
- E era o
quê?
- Um
herói.
- Não.
Mas era um bom cão. Morreu.
- O Cão
mantém-me a salvo nas estradas, mesmo em tempos tão penosos como
estes. Nem lobos nem os fora da lei se atrevem a me molestar quando o
Cão está ao meu lado - o septão franziu as sobrancelhas. - Os
lobos tornaram-se terríveis nos últimos tempos. Há lugares onde um
homem sozinho faria bem em encontrar uma árvore para dormir. Ao
longo de toda a vida, a maior alcateia que vi tinha menos de uma
dúzia de lobos, mas a grande alcateia que percorre agora o Tridente
chega a centenas.
- Você
os encontrou? - perguntou Sor Hyle.
- Fui
poupado disso, que os Sete me protejam, mas ouvi-os à noite, e mais
de uma vez. Tantas vozes... um som capaz de gelar o sangue de um
homem. Até pôs o Cão a tremer, e ele matou uma dúzia de lobos -
afagou a cabeça do cão. - Há quem diga que são demônios. Dizem
que a alcateia é liderada por uma loba monstruosa, uma sombra
furtiva, sinistra, cinzenta e enorme. Dizem que houve quem a visse
derrubar um auroque sozinha, que nenhuma armadilha ou laço consegue
prendê-la, que não teme nem o aço, nem o fogo, que mata qualquer
lobo que tente montá-la, e não devora nenhuma carne que não seja
humana.
Sor Hyle
Hunt riu.
- Agora
conseguiu, septão. Os olhos do pobre Podrick estão tão grandes
como ovos cozidos.
- Não
estão nada - Podrick replicou, indignado. O Cão latiu.
Naquela
noite, montaram um acampamento frio nas dunas. Brienne mandou Podrick
percorrer a costa a fim de encontrar alguma madeira trazida pelo mar
para fazer uma fogueira, mas ele voltou de mãos vazias, com lama até
os joelhos.
- A maré
desceu, sor. Senhora. Não há água, só lamaçais.
- Fique
longe da lama, garoto - aconselhou Septão Meribald. - A lama não
gosta de estranhos. Se caminhar pelo lugar errado, ela se abre e
engole você.
- É só
lama - Podrick insistiu.
- Até
encher sua boca e começar a entrar pelo seu nariz. Então é a morte
- sorriu para tirar o gelo das palavras. - Limpe essa lama e venha
comer um gomo de laranja, jovem.
O dia
seguinte foi mais do mesmo. Quebraram o jejum com bacalhau salgado e
mais gomos de laranja, e estavam a caminho antes de o sol ter tempo
de se erguer por completo, com um céu cor-de-rosa por trás e um
púrpura adiante. O Cão seguiu à frente, farejando cada agrupamento
de canas e parando de vez em quando para urinar num deles; parecia
conhecer a estrada tão bem quanto Meribald. Os gritos das
andorinhas-do-mar chegavam até eles, trêmulos, pelo ar da manhã,
enquanto a maré subia com rapidez.
Perto do
meio-dia pararam numa minúscula aldeia, a primeira que encontraram,
onde oito das casas construídas sobre estacas erguiam-se por cima de
um pequeno riacho. Os homens estavam fora, pescando em seus barcos de
couro, mas as mulheres e os garotos pequenos desceram oscilantes
escadas de corda e reuniram-se em volta do Septão Meribald para
rezar. Após o serviço, ele os absolveu de seus pecados e
deixou-lhes alguns nabos, uma saca de feijão e duas de suas
preciosas laranjas.
De volta
à estrada, o septão disse:
-
Faríamos bem em manter uma vigia esta noite, amigos. Os aldeões
dizem ter visto três desertores esgueirando-se em volta das dunas, a
oeste da antiga torre de vigia.
- Só
três? - Sor Hyle sorriu. - Três são moleza para a nossa
espadachim. Não é provável que incomodem homens armados.
- A não
ser que estejam morrendo de fome - disse o septão. - Há comida
nestes pântanos, mas só para quem tem olho para encontrá-la, e
esses homens são forasteiros, sobreviventes de uma batalha qualquer.
Se nos abordarem, sor, suplico-lhe, deixe-os comigo.
- O que
fará com eles?
- Eu os
alimentarei. Pedirei para que confessem seus pecados, a fim de poder
perdoá-los. E os convidarei a virem conosco até a Ilha Silenciosa.
- Isso é
o mesmo que convidá-los para que abram nossas goelas enquanto
dormimos - Hyle Hunt replicou. - Lorde Randyll tem maneiras melhores
de lidar com desertores... aço e corda de cânhamo.
- Sor?
Senhora? - Podrick os interrompeu. - Um desertor é um fora da lei?
- Mais ou
menos - Brienne respondeu.
O Septão
Meribald discordou.
- Mais
menos do que mais. Há muitas espécies de fora da lei, assim como há
muitas espécies de pássaros. Tanto um borrelho como uma águia
marinha têm asas, mas não são a mesma coisa. Os cantores adoram
cantar sobre bons homens forçados a sair da lei para combater um
senhor malvado qualquer, mas a maioria dos fora da lei são mais
parecidos com esse Cão de Caça voraz do que com o senhor do
relâmpago. São homens maus, movidos pela ganância, amargurados
pela maldade, que desprezam os deuses e só se preocupam consigo. Os
desertores são mais merecedores de nossa piedade, embora possam ser
igualmente perigosos. Quase todos são plebeus, gente simples que
nunca tinha estado a mais de uma milha da casa onde nasceu até que
algum senhor veio levá-los para a guerra. Mal calçados e
malvestidos, partem marchando sob seus estandartes, muitas vezes sem
melhores armas do que uma foice, uma enxada afiada ou um martelo que
eles mesmos fizeram atando uma pedra a um pedaço de madeira com
tiras de pele de animal.
“Irmãos
marcham com irmãos, filhos com pais, amigos com amigos. Ouviram as
canções e as histórias, e por isso vão se embora de coração
ansioso, sonhando com as maravilhas que verão, com as riquezas e as
glórias que conquistarão. A guerra parece uma bela aventura, a
melhor que a maioria deles alguma vez conhecerá. Então experimentam
o sabor da batalha. Para alguns, essa única experiência é
suficiente para quebrá-los. Outros resistem durante anos, até
perderem a conta de todas as batalhas em que lutaram, mas mesmo um
homem que sobreviveu a cem combates pode fugir no centésimo
primeiro. Irmãos veem os irmãos morrer, pais perdem os filhos,
amigos veem os amigos tentando manter as entranhas dentro do corpo
depois de serem rasgados por um machado. Veem o senhor que os levou
para aquele lugar abatido, e outro senhor qualquer grita que agora
pertencem a ele. São feridos, e quando a ferida ainda está apenas
meio cicatrizada, sofrem outro ferimento. Nunca há o suficiente para
comer, os sapatos se desfazem devido às marchas, as roupas estão
rasgadas e apodrecendo, e metade deles anda cagando nos calções por
beber água ruim. Se quiserem botas novas ou um manto mais quente ou
talvez um meio-elmo de ferro enferrujado, têm de tirá-los de um
cadáver, e não demora muito para que comecem também a roubar dos
vivos, do povo em cujas terras combatem, homens muito parecidos com
os que eram. Matam suas ovelhas e roubam suas galinhas, e daí é um
pequeno passo até levarem também suas filhas.
“E um
dia, olham ao redor e percebem que todos os seus amigos e familiares
se foram, que estão lutando ao lado de estranhos, sob um estandarte
que quase nem reconhecem. Não sabem onde estão nem como voltar para
casa, e o senhor por quem combatem não sabe seus nomes, mas ali vem
ele, gritando-lhes para se posicionarem, para fazerem uma fileira com
as lanças, foices e enxadas afiadas, para aguentarem. E os
cavaleiros caem sobre eles, homens sem rosto vestidos de aço, e o
trovão de ferro de seu ataque parece encher o mundo... E o homem
quebra. Vira-se e foge, ou rasteja para longe, depois por cima dos
cadáveres, ou escapole na calada da noite e encontra um lugar
qualquer para se esconder. Toda noção de casa está perdida a essa
altura, e reis, senhores e deuses significam menos para ele do que um
naco de carne estragada que lhes permita sobreviver mais um dia, ou
um odre de vinho ruim que possa afogar-lhes o medo durante algumas
horas. O desertor sobrevive dia a dia, de refeição em refeição,
mais animal do que homem. A Senhora Brienne não erra. Em tempos como
estes, o viajante deve ter atenção aos desertores, e temê-los...
mas também deve ter piedade por eles.”
Quando
Meribald terminou, um profundo silêncio caiu sobre o pequeno bando.
Brienne ouvia o vento farfalhando através de um grupo de salgueiros
e, mais distante, o tênue grito de um mergulhão. Ouvia o Cão
arquejar suavemente enquanto saltitava ao lado do septão e de seu
burro, com a língua pendendo-lhe da boca. O silêncio estendeu-se,
até que, por fim, ela disse:
- Que
idade tinha quando o levaram para a guerra?
- Ora,
não era mais velho do que seu garoto - Meribald respondeu. - Novo
demais para tal coisa, na verdade, mas meus irmãos iam todos, e eu
não quis ser deixado para trás. Willam disse que eu podia ser seu
escudeiro, apesar de Will não ser nenhum cavaleiro, só um criado
armado com uma faca de cozinha que tinha roubado da estalagem. Morreu
nos Degraus, e não chegou a desferir um golpe. Foi a febre que deu
conta dele, e de meu irmão Robin. Owen morreu de uma maça que lhe
rachou a cabeça, e o amigo dele, Jon Bexigas, foi enforcado por
violação.
- A
Guerra dos Reis de Nove Moedas? - perguntou Hyle Hunt.
- Foi
assim que a chamaram, apesar de eu nunca ter visto um rei nem ganhado
uma moeda. Mas foi uma guerra. Lá isso foi.
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