quarta-feira, 2 de outubro de 2013

47 - TYRION


- Lote noventa e sete. - O leiloeiro estalou o chicote. - Um par de anões, bem treinados para sua diversão.
O leilão fora organizado no ponto em que o largo e marrom Skahazadhan fluía para a Baía dos Escravos. Tyrion Lannister podia sentir o cheiro de sal no ar, misturado com o fedor das valas que serviam como latrinas atrás dos cercados dos escravos. Não se incomodava com o calor tanto quanto com a umidade. O próprio ar parecia pesar sobre ele, como um cobertor quente e úmido sobre a cabeça e os ombros.
- O cachorro e o porco estão incluídos no lote - o leiloeiro anunciou. - Os anões os cavalgam. Delicie seus convidados no próximo banquete, ou use-os para uma loucura.
Os compradores sentavam-se em bancos de madeira, bebericando sucos de frutas. Alguns eram abanados por escravos. Muitos usavam tokar, aquela peculiar vestimenta amada pelo sangue antigo da Baía dos Escravos, tão elegante quanto pouco prática. Outros se vestiam de maneira mais simples; homens com túnicas e mantos com capuzes, mulheres com sedas coloridas. Prostitutas ou sacerdotisas, a maioria delas; neste extremo oriente era difícil distinguir umas das outras.
Atrás dos bancos, trocando piadas e zombando do modo das pessoas presentes, estava um grupo de ocidentais. Mercenários, Tyrion sabia. Viu espadas longas, punhais e adagas, um suporte de machado de arremesso, cotas de malha sob os mantos. Os cabelos e as barbas deles indicavam que a maioria era de homens das Cidades Livres, mas aqui e ali havia um que poderia ser westerosi. Estão comprando? Ou vêm aqui só para ver o espetáculo?
- Quem dará o primeiro lance por este par?
- Trezentos - falou uma matrona em um palanquim antigo.
- Quatrocentos - disse um yunkaíta monstruosamente gordo, de uma liteira na qual se espalhava como um leviatã. Todo coberto de seda amarela com franjas de ouro, parecia mais largo do que quatro Illyrios. Tyrion ficou com pena dos escravos que o carregavam. Ao menos, seremos poupados deste dever. Que alegria ser um anão.
- E um - disse uma velha com um tokar violeta. O leiloeiro lhe deu um olhar azedo, mas não desautorizou o lance.
Os marinheiros-escravos do Selaesori Qhoran, vendidos individualmente, alcançaram preços que variavam de quinhentas a novecentas peças de prata. Homens do mar experientes eram uma mercadoria valiosa. Nenhum deles esboçara alguma reação de luta quando os traficantes de escravos abordaram o navio destruído. Para eles, era apenas uma mudança de dono. Os imediatos do navio eram homens livres, mas a viúva do cais assinara um compromisso, prometendo pagar o resgate deles em um caso como este. Os três dedos ardentes sobreviventes ainda não tinham sido vendidos, mas eram propriedade do Senhor da Luz e tinham certeza que seriam comprados por algum templo vermelho. As chamas tatuadas no rosto eram seus compromissos.
Tyrion e Merreca não tinham essa garantia.
- Quatrocentos e cinquenta - veio o lance.
- Quatrocentos e oitenta.
- Quinhentos.
Alguns lances eram dados em Alto Valiriano, alguns na língua mestiça de Ghis. Alguns compradores assinalavam com o dedo, com a torção do pulso ou com o abano de um leque pintado.
- Estou feliz de nos manterem juntos - Merreca sussurrou.
O mercador de escravos olhou para eles.
- Sem conversas.
Tyrion estreitou os ombros de Merreca. Fios de cabelo, loiro-claro e negro, grudavam na testa dele, e os trapos de sua túnica estavam colados nas costas. Um pouco era suor, um pouco era sangue seco. Ele não fora tão tolo de lutar contra os traficantes de escravos como Jorah Mormont fizera, mas isso não significava que tivesse escapado impune. Em seu caso, fora a boca que lhe garantira algumas chibatadas.
- Oitocentos.
- E cinquenta.
-E um.
Valemos tanto quanto um marinheiro, Tyrion ponderou. Embora talvez fosse a Porca Bonita que os compradores desejassem. Uma porca bem treinada é difícil de achar. Eles certamente não estavam pagando por peso.
Em novecentas peças de prata, os lances começaram a escassear. Em novecentos e cinquenta e um (da velha) parou. O leiloeiro tinha um pressentimento, no entanto, e não faria nada antes que os anões dessem à multidão um gostinho de seu espetáculo. Triturador e Porca Bonita foram colocados na plataforma. Sem selas ou freios, montá-los provou-se complicado. No momento em que a porca começou a se mover, Tyrion escorregou de cima dela e caiu de costas, provocando tempestades de risos entre os compradores.
- Mil - disse o homem grotesco de gordo.
- E um. - A velha, novamente.
A boca de Merreca estava congelada em um esgar de sorriso. Bem treinada para seu divertimento. O pai dela tinha algo pelo que responder, em qualquer que fosse o pequeno inferno reservado aos anões.
- Mil e duzentos. - O leviatã em amarelo. Um escravo ao lado dele entregou-lhe uma bebida. Limão, sem dúvida. O jeito como aqueles olhos amarelos estavam fixos sobre eles fizeram Tyrion se sentir desconfortável.
- Mil e trezentos.
- E um. - A velha.
Meu pai sempre dizia que um Lannister valia dez vezes mais do que qualquer homem comum.
Em mil e seiscentos, o ritmo começou a diminuir, então o comerciante de escravos convidou alguns dos compradores para dar uma olhada mais de perto nos anões.
- A fêmea é jovem - prometeu. - Vocês podem cruzar os dois e conseguir um bom dinheiro pelos filhotes.
- Metade do nariz dele se foi - reclamou a velha, depois que olhou mais de perto. Seu rosto enrugado se contorceu de desprazer. A carne dela parecia um verme branco; enrolada no tokar violeta, parecia uma ameixa bichada. - Os olhos dele não combinam. Uma coisa desfavorável.
- Minha senhora ainda não viu minha melhor parte. - Tyrion agarrou sua própria virilha, para o caso dela não ter entendido.
A bruxa sibilou em indignação, e Tyrion ganhou uma lambida do chicote nas costas, um golpe que o fez cair de joelhos. O gosto de sangue encheu sua boca. Ele sorriu e cuspiu.
- Dois mil - gritou uma voz diferente, de trás dos bancos.
E o que um mercenário pode querer com um anão? Tyrion se levantou para olhar melhor. O novo comprador era um homem mais velho, já de cabelos brancos, alto e em forma, com a pele marrom curtida e uma barba escura cortada rente e salpicada de branco. Semiocultas sob um manto púrpura desbotado estavam uma espada longa e um par de adagas.
- Dois mil e quinhentos. - Uma voz feminina dessa vez; uma garota, baixa, com a cintura grossa e peitos pesados, vestida com uma armadura ornamentada. Sua placa peitoral em aço negro esculpido era incrustada de ouro e mostrava uma harpia levantando-se com correntes penduradas em suas patas. Um par de soldados escravos a erguia em um escudo, na altura dos ombros.
- Três mil. - O homem de pele marrom avançou pela multidão, seus companheiros mercenários empurrando os compradores de lado para abrir caminho. Sim. Chegue mais perto. Tyrion sabia como lidar com mercenários. Não imaginava nem por um momento que este homem o queria para divertir suas festas. Ele me conhece. Pretende me levar de volta para Westeros e me vender para minha irmã. O anão esfregou a boca para esconder o sorriso. Cersei e os Sete Reinos estavam a meio mundo de distância. Muito e ainda mais podia acontecer antes de chegarem lá. Fiz Bronn mudar de lado. Me dê meia chance e talvez possa fazer esse aí virar também.
A velha e a garota no escudo desistiram da disputa nos três mil, mas não o gordo de amarelo. Ele mediu os mercenários com seus olhos amarelos, passou a língua pelos dentes amarelos e disse:
- Cinco mil peças de prata pelo lote.
O mercenário franziu o cenho, deu de ombros e foi embora.
Sete infernos. Tyrion tinha quase certeza de que não queria se tornar propriedade do imenso Lorde Pançamarela. Apenas a visão daquela flacidez esparramada na liteira, uma montanha de carne lívida com olhos amarelos de leitão e peitos maiores do que Porca Bonita pressionando a seda do tokar, era suficiente para fazer a pele do anão se arrepiar. E o cheiro que vinha dele era palpável até onde estavam.
- Se não há mais lances ...
- Sete mil- gritou Tyrion.
Risos ecoaram por todos os bancos.
- O anão quer comprar a si mesmo - a garota no escudo observou.
Tyrion deu um sorriso lascivo para ela.
- Um anão esperto merece um mestre esperto, e vocês todos parecem tolos.
Aquilo provocou mais risos dos compradores, e uma carranca do leiloeiro, que manuseava seu chicote, indeciso, tentando descobrir se aquilo podia ser usado a seu favor.
- Cinco mil é um insulto! - Tyrion exclamou. - Eu disputo justas, canto, digo coisas divertidas. Foderei sua esposa e a farei gritar. Ou a esposa do seu inimigo, se preferir, que melhor maneira de envergonhá-lo? Sou mortal com uma besta, e homens com três vezes o meu tamanho se intimidam e tremem quando nos encontramos em um tabuleiro de cyvasse. Até sou conhecido por cozinhar de tempos em tempos. Ofereço dez mil peças de prata por mim mesmo! Sou bom nisso, sou, sou. Meu pai me dizia que sempre tenho que pagar minhas dívidas.
O mercenário de manto púrpura se virou. Seu olhar encontrou o de Tyrion atravessando as fileiras de compradores, e ele sorriu. Um sorriso caloroso, aquele, o anão refletiu. Amigável. Por outro lado, aqueles olhos são frios. Pode ser que eu não queira que ele nos compre, no final das contas.
A enormidade amarela se contorcia em sua liteira, um olhar de aborrecimento na enorme cara de torta. Murmurou algo azedo em ghiscari, que Tyrion não entendeu, mas o tom era bastante claro.
- Isso foi outro lance? - O anão inclinou a cabeça. - Ofereço todo o ouro de Rochedo Casterly.
Ouviu o chicote antes de senti-lo, um assobio no ar, fino e agudo. Tyrion grunhiu com o golpe, mas dessa vez conseguiu permanecer em pé. Seus pensamentos voltaram para o início da jornada, quando seu problema mais urgente era decidir qual vinho tomar com os caracóis do meio da manhã. Veja o que acontece por perseguir dragões. Uma risada explodiu de seus lábios, borrifando a primeira fila de compradores com sangue e saliva.
- Estão vendidos - anunciou o leiloeiro. Então o acertou com o chicote novamente, simplesmente porque podia. Dessa vez, Tyrion caiu.
Um dos guardas o ergueu com um puxão. Outro cutucou Merreca para fora da plataforma com o punho de sua lança. A próxima peça do leilão já estava sendo levada para seu lugar. Uma garota, quinze ou dezesseis anos, ninguém do Selaesori Qhoran dessa vez. Tyrion não a conhecia. A mesma idade de Daenerys Targaryen, ou quase isso. O comerciante de escravos a deixara nua. Pelo menos, fomos poupados dessa humilhação.
Tyrion olhou pelo acampamento yunkaíta, até as muralhas de Meereen. Aqueles portões pareciam tão próximos ... e, se a conversa no cercado dos escravos era verdadeira, Meereen permanecia uma cidade livre. Dentro daquelas muralhas que se desintegravam, a escravidão e o comércio de escravos ainda eram proibidos. Tudo o que tinha que fazer era alcançar aqueles portões e atravessá-los, e seria um homem livre novamente.
Mas isso era quase impossível, a menos que abandonasse Merreca. Ela iria querer levar o cão e o porco com eles.
- Não será tão terrível, não é? - Merreca sussurrou. - Ele pagou tanto por nós. Ele será gentil, não será?
Enquanto nós o divertirmos.
- Somos muito valiosos para sermos maltratados - assegurou-lhe, com sangue ainda escorrendo pelas costas, das duas últimas chibatadas. Quando nosso espetáculo ficar velho, no entanto ... e vai, vai ficar velho ...
O capataz de seu novo mestre estava esperando por eles, com uma charrete puxada por uma mula e dois soldados. Tinha um rosto comprido e estreito e um cavanhaque atado com fio de ouro, e seu cabelo vermelho e negro era esculpido a partir das têmporas, no formato de um par de mãos com garras.
- Que queridas criaturinhas são vocês - ele disse. - Me lembram meus próprios filhos ... ou lembraria, se meus pequeninos não estivessem mortos. Tomarei conta de vocês. Digam-me seus nomes.
- Merreca. - A voz dela era um sussurro, pequena e assustada.
Tyrion da Casa Lannister, legítimo senhor de Rochedo Casterly, seu verme rastejante.
- Yollo.
- Ousado Yollo. Resplandecente Merreca. Vocês são propriedade do nobre e valoroso Yezzan zo Qaggaz, erudito e guerreiro, reverenciado entre os Sábios Mestres de Yunkai. Considerem-se afortunados, pois Yezzan é um mestre gentil e benevolente. Pensem nele como se fosse o pai de vocês.
Alegremente, pensou Tyrion, mas dessa vez segurou a língua. Teriam que se apresentar em breve para seu novo mestre, não duvidava, e não poderia levar outra chibatada.
- Seu pai ama seus tesouros especiais mais do que tudo e vai cuidar de vocês - o capataz estava dizendo. - Quanto a mim, podem pensar em mim como a babá que cuidou de vocês na infância. Babá é como todos os meus filhos me chamam.
- Lote noventa e nove - o leiloeiro chamou. - Um guerreiro.
A garota fora vendida rapidamente, e estava sendo empacotada para seu novo dono, segurando as roupas contra os pequenos seios de pontas rosadas. Dois traficantes de escravos arrastaram Jorah Mormont para cima da plataforma, no lugar da moça. O cavaleiro estava nu, com exceção de uma tanga, as costas riscadas pelo chicote, o rosto tão inchado que estava quase irreconhecível. Correntes prendiam seus pulsos e tornozelos. Uma pequena amostra da refeição que cozinhou para mim, Tyrion pensou, embora descobrisse que não tinha prazer com a miséria do grande cavaleiro.
Mesmo acorrentado, Mormont parecia perigoso, um brutamontes com grandes braços grossos e ombros curvados. O pelo negro e áspero que cobria seu peito o fazia parecer mais animalesco do que humano. Seus olhos estavam escurecidos, dois fossos na face grotescamente inchada. Sobre uma bochecha, levava uma marca: uma máscara de demônio.
Quando os traficantes de escravos chegaram a bordo do Selaesori Qhoran, Sor Jorah os encontrara com a espada longa na mão, matando três antes que fosse desarmado. Os marujos do navio de escravos o teriam matado de bom grado, mas o capitão proibiu: um lutador sempre valia uma boa prata. Então Mormont fora acorrentado a um remo, espancado em cada centímetro de seu corpo, passara fome e fora marcado.
- Grande e forte, este aqui - o leiloeiro declarou. - Muita fúria nele. Dará um bom espetáculo nas arenas de luta. Quem dá trezentos?
Ninguém deu.
Mormont não prestava atenção à multidão mestiça; seus olhos estavam fixos além das linhas do cerco, na distante cidade com suas antigas muralhas de tijolos multicoloridos. Tyrion podia ler aquele olhar tão facilmente quanto um livro: tão perto e, ao mesmo tempo, tão distante. O pobre desgraçado voltara tarde demais. Daenerys Targaryen estava casada, os guardas dos cercados haviam contado para eles, rindo. Ela tomara um comerciante de escravos meereenês como seu rei, tão rico quanto nobre, e então a paz fora assinada e selada, e as arenas de luta de Meereen seriam reabertas. Outros escravos insistiam que os guardas estavam mentindo, que Daenerys Targaryen nunca faria a paz com os traficantes de escravos. Mhysa, eles a chamavam. Alguém lhe dissera que aquilo significava Mãe. Logo a rainha prateada viria de sua cidade, esmagaria os yunkaítas e romperia suas correntes, sussurravam uns para os outros.
E então ela vai nos fazer torta de limão e beijar nossos dodóis e fazê-los sarar, o anão pensou. Não acreditava em salvamentos reais. Se necessário, iria atrás de sua própria libertação. Os cogumelos enfiados entre seus dedos, dentro da bota, seriam o suficiente para ele e Merreca. Triturador e Porca Bonita teriam que se arranjar por conta própria.
Babá ainda estava dando instruções para os novos prêmios de seu mestre.
- Façam tudo o que lhes for pedido, e nada mais, e poderão viver como pequenos senhores, mimados e adorados - prometeu. - Desobedeçam ... mas não farão isso, não é mesmo? Não os meus queridos. - Ele se abaixou e apertou Merreca na bochecha.
- Duzentos, então - o leiloeiro disse. - Um brutamontes como este vale três vezes mais. Que guarda-costas dará! Nenhum inimigo ousará molestá-los.
- Venham, meus amiguinhos - o Babá disse - vou lhes mostrar sua nova casa. Em Yunkai, vocês viverão na pirâmide dourada de Qaggaz e jantarão em pratos de prata, mas aqui vivemos com simplicidade, em humildes tendas de soldados.
- Quem dá cem? - gritou O leiloeiro.
Conseguiu um lance finalmente, embora fossem apenas cinquenta peças de prata. O comprador era um homem magro com um avental de couro.
- E um - disse a velha no tokar violeta.
Um dos soldados ergueu Merreca para colocá-la na charrete.
- Quem é a velha? - o anão perguntou para ele.
- Zahrina - o homem disse. - Lutadores baratos, os dela. Carne para os heróis. Seu amigo estará morto logo.
Ele não era meu amigo. Mesmo assim, Tyrion Lannister pegou-se virando para Babá e dizendo:
- Não pode deixá-la ficar com ele.
O Babá olhou para ele.
- Que barulho foi esse que você fez?
Tyrion apontou.
- Aquele ali é parte do nosso espetáculo. O urso e a donzela. Jorah é o urso, Merreca é a donzela e eu sou o bravo cavaleiro que a salva. Chego dançando e acerto ele nas bolas. É muito engraçado.
O capataz olhou para o bloco de pedra do leilão.
- Ele? - O lance por Jorah Mormont alcançara duzentas peças de prata.
- E um - disse a velha no tokar violeta.
- Seu urso. Entendo. - O Babá atravessou a multidão com passos curtos, curvou-se sobre o imenso yunkaíta amarelo na liteira, sussurrou algo em seu ouvido. Seu mestre acenou com a cabeça, o queixo balançando, e ergueu o leque.
- Trezentos - disse com a voz ofegante.
A velha fungou e foi embora.
- Por que fez isso? - Merreca perguntou, na Língua Comum.
Uma boa pergunta, pensou Tyrion. Por que fiz isso?
- Seu espetáculo estava ficando sem graça. Toda trupe precisa de um urso dançarino.
Ela lhe deu um olhar de reprovação, foi para o fundo da charrete e se sentou com os braços em volta do Triturador, como se o cão fosse seu último amigo verdadeiro no mundo. Talvez seja.
O Babá retornou com Jorah Mormont. Dois dos soldados-escravos de seu mestre o jogaram na traseira da charrete puxada pela mula, entre os anões. O cavaleiro não lutou. Toda a vontade de lutar o abandonou quando soube que sua rainha tinha se casado, Tyrion percebeu. Uma palavra sussurrada fizera o que punhos e chicotes não haviam conseguido; quebrara-o. Eu devia ter deixado a velha levá-lo. Ele será tão útil quanto mamilos em uma placa peitoral.
O Babá subiu na frente da charrete, pegou as rédeas, e começaram a atravessar o acampamento do cerco em direção ao complexo de seu novo mestre, o nobre Yezzan zo Qaggaz. Quatro soldados-escravos marchavam ao lado deles, dois de cada lado da charrete.
Merreca não chorava, mas seus olhos estavam vermelhos e infelizes, e ela não os tirava do Triturador. Será que ela acha que tudo isso vai sumir se não olhar? Sor Jorah Mormont não olhava para ninguém nem para nada. Sentava-se encolhido, remoendo com suas correntes.
Tyrion olhava para tudo e para todos.
O acampamento yunkaíta não era exatamente um acampamento, mas centenas de barracas erguidas lado a lado em um semicírculo ao redor das muralhas de Meereen; uma cidade de sedas e lonas, com suas próprias avenidas e becos, tavernas e prostíbulos, distritos bons e maus. Entre as linhas do cerco e a baía, as tendas brotavam como cogumelos amarelos. Algumas eram pequenas e pobres, não mais do que um pedaço de lona velha manchada para manter afastados chuva e sol, mas, ao lado dessas, estavam tendas grandes o suficiente para abrigar uma centena de homens, e pavilhões de seda tão grandes quanto palácios com harpias brilhando no topo dos mastros centrais. Alguns acampamentos eram ordenados, com tendas dispostas ao redor de uma fogueira em círculos concêntricos, armas e armaduras empilhadas ao redor do anel interno, os cavalos amarrados do lado de fora. Nos outros lugares, o caos puro parecia reinar.
As planícies secas e queimadas em torno de Meereen eram planas, nuas e sem vegetação por vários quilômetros, mas os navios yunkaítas haviam trazido madeira e couro cru do sul, suficientes para erguer seis imensos trabucos. Estavam reunidos em três lados da cidade, com exceção do lado do rio, cercados por pilhas de pedras quebradas e barris de piche e resina apenas aguardando uma tocha. Um dos soldados que andava ao lado da charrete viu para onde Tyrion olhava e, orgulhosamente, contou para ele que cada um dos trabucos recebera um nome: Matadragões, Prostituta, Filha da Harpia, Irmã Vingativa, Fantasma de Astapor e Punho de Mazdhan. Elevando-se mais de doze metros acima das tendas, os trabucos eram os marcos principais do acampamento do cerco.
- Só a visão deles fez a rainha dragão se ajoelhar - ele se gabou. - E assim ficará ela, chupando o pau do nobre Hizdahr, ou então transformaremos suas muralhas em escombros.
Tyrion viu um escravo sendo açoitado, golpe após golpe, até que suas costas fossem apenas sangue e carne rasgada. Uma fila de homens passou marchando em ferros, tilintando a cada passo; carregavam lanças e espadas curtas, mas correntes os prendiam pulso com pulso e tornozelo com tornozelo. O ar cheirava a carne assada, e ele viu um homem esfolando um cão para seu cozido.
Viu os mortos, também, e ouviu os moribundos. Sob a fumaça que pairava no ar, o cheiro de cavalos e o acentuado odor de sal da baía, havia um fedor de sangue e merda. Algum fluxo, percebeu, enquanto olhava dois mercenários carregarem o cadáver de um terceiro de uma das tendas. Aquilo fez seus dedos se contraírem. Uma doença podia dizimar um exército mais rápido do que qualquer batalha, ouvira seu pai dizer certa vez.
Mais uma razão para escapar, e logo.
Meio quilômetro adiante, encontrou uma boa razão para reconsiderar. Uma multidão se formara ao redor de três escravos que haviam sido presos enquanto tentavam escapar.
- Sei que meus pequenos tesouros serão doces e obedientes - disse o Babá. - Vejam o que acontece com aqueles que tentam fugir.
Os cativos haviam sido amarrados em uma fileira de vigas cruzadas, e dois fundeiros os usavam para testar suas habilidades.
- Tolosinos - um dos guardas explicou para eles. - Os melhores fundeiros do mundo. Atiram bolas de chumbo macio em vez de pedras.
Tyrion nunca vira vantagem nas fundas, quando arcos tinham um alcance tão melhor... mas nunca vira tolosinos com essas armas antes. Suas bolas de chumbo causavam danos muito maiores do que as pedras lisas que outros fundeiros usavam, e muito mais do que qualquer arco. Um deles acertou o joelho de um dos cativos, que explodiu em uma mancha de sangue e ossos que deixou a parte de baixo da perna do homem pendurada por uma corda de tendão vermelho-escuro. Bem, ele não fugirá novamente, Tyrion concluiu, enquanto o homem começava a gritar. Seus berros se misturavam no ar da manhã com os risos dos seguidores de acampamento e com as maldições dos que apostaram um bom dinheiro no erro dos fundeiros. Merreca virou o rosto, mas o Babá agarrou seu queixo e virou sua cabeça de volta.
- Assista - ordenou. - Você também, urso.
Jorah Mormont ergueu a cabeça e encarou o Babá. Tyrion podia ver seus braços contraídos. Ele vai esganá-lo, e será o fim de todos nós. Mas ele apenas fez uma careta e virou-se para assistir ao sangrento espetáculo.
A leste, as maciças muralhas de tijolos de Meereen brilhavam no calor da manhã. Aquele era o refúgio que os pobres tolos esperavam alcançar. Mas por quanto tempo ainda será um refúgio?
Todos os três candidatos a fugitivos estavam mortos antes que o Babá pegasse as rédeas novamente. A charrete seguiu adiante.
O acampamento do novo mestre deles ficava a sudeste da Prostituta, quase à sombra do trabuco, e espalhava-se por vários hectares. A humilde tenda de Yezzan zo Qaggaz provou ser um palácio de seda cor de limão. Harpias douradas ficavam no topo de cada mastro do telhado de nove pontas, brilhando ao sol. Tendas menores a cercavam por todos os lados.
- Estas são as habitações dos cozinheiros, concubinas e guerreiros do nosso nobre mestre, e de alguns de seus parentes menos favorecidos - Babá contou para eles - mas vocês, queridinhos, terão o raro privilégio de dormir dentro do pavilhão do próprio Yezzan. Ele gosta de manter seus tesouros por perto. - Franziu o cenho para Mormont.
- Você não, urso. Você é grande e feio e ficará acorrentado aqui fora. - O cavaleiro não respondeu. - Primeiro, precisam colocar as coleiras.
As coleiras eram feitas de ferro, levemente douradas para brilhar na luz. O nome de Yezzan estava gravado em grifos valirianos, e um par de pequenos sinos estava afixado embaixo das orelhas, então cada passo que davam produzia um alegre tilintar. Jorah Mormont aceitou sua coleira com um silêncio sombrio, mas Merreca começou a chorar enquanto o armeiro colocava a dela no lugar.
- É tão pesada - reclamou.
Tyrion apertou a mão dela.
- É de ouro maciço - mentiu. - Em Westeros, damas de alto nascimento sonham com um colar destes. - Melhor uma coleira do que uma marca. Uma coleira pode ser removida. Lembrou-se de Shae, e de como a corrente dourada brilhava enquanto ele a torcia mais e mais apertada ao redor do pescoço dela.
Depois, o Babá deixou Sor Jorah acorrentado em um poste perto da fogueira do cozinheiro e escoltou os dois anões para dentro do pavilhão do mestre. Mostrou onde dormiriam, em uma alcova acarpetada separada da tenda principal por paredes de seda amarela. Dividiriam este espaço com os outros tesouros de Yezzan: um garoto com retorcidas e peludas “pernas de bode” uma garota de duas cabeças de Mantarys, uma mulher barbada e uma graciosa criatura chamada Doces, que estava vestida com pedras preciosas e rendas de Myr.
- Vocês estão tentando decidir se sou homem ou mulher - Doces disse, quando foi trazida diante dos anões. Então levantou as saias e mostrou para eles o que tinha por baixo. - Sou ambos, e o mestre me ama mais.
Uma coleção de seres grotescos, Tyrion percebeu. Em algum lugar um deus está rindo.
- Adorável - falou para Doces, que tinha o cabelo púrpura e os olhos violeta - mas esperávamos ser os mais bonitos desta vez.
Doces riu, mas o Babá não estava se divertindo.
- Guarde suas piadas para esta noite, quando se apresentará para nosso nobre mestre. Se vocês o agradarem, serão bem recompensados. Senão ... - Deu um tapa na cara de Tyrion.
- Você precisa ser cuidadoso com o Babá - falou Doces, quando o capataz partiu. - Ele é o único monstro verdadeiro aqui. - A mulher barbada falava uma variedade incompreensível de ghiscari, o menino-bode um tipo gutural de gíria de marinheiro chamado língua mercantil. A menina de duas cabeças tinha retardo mental: uma cabeça não era maior do que uma laranja e não falava nada, a outra tinha uma fileira de dentes e rosnava para qualquer um que chegasse perto demais de sua gaiola. Mas Doces era fluente em quatro idiomas, um deles Alro Valiriano.
- Como é o mestre? - Merreca perguntou, ansiosa.
- Seus olhos são amarelos e ele fede - disse Doces. - Há dez anos, fomos para Sothoros, e ele está apodrecendo por dentro desde essa época. Faça-o esquecer que está morrendo, mesmo que por um instante, e ele pode ser bastante generoso. Não negue nada a ele.
Tiveram apenas a tarde para aprender a ser propriedade de alguém. Os escravos de Yezzan encheram uma banheira com água quente, e os anões puderam se banhar; primeiro Merreca, depois Tyrion. Depois, outro escravo passou um unguento nos cortes nas costas do anão, para evitar que doessem, e cobriu-os com um cataplasma gelado. O cabelo de Merreca foi cortado, e a barba de Tyrion, aparada. Por fim, ambos receberam chinelos macios e roupas frescas, simples, mas limpas.
Quando a noite caiu, o Babá retornou para dizer que era hora de vestirem suas roupas de espetáculo. Yezzan era anfitrião do supremo comandante yunkaíta, o nobre Yurkhaz zo Yunkaz, e a apresentação deles era aguardada.
- Devemos desacorrentar seu urso?
- Não esta noite - Tyrion respondeu. - Deixe-nos disputar uma justa para nosso mestre primeiro, e guardamos o urso para outra hora.
- Que seja. Depois que a apresentação estiver terminada, vocês ajudarão a servir e a recolher os pratos. Cuidado para não sujarem os convidados, ou isso acabará mal para vocês.
Um malabarista começou os folguedos da noite. Então veio um trio de vigorosos acrobatas. Depois, o menino-bode apareceu e fez uma dança grotesca, enquanto um dos escravos de Yurkhaz tocava uma flauta de osso. Tyrion quase lhe perguntou se sabia As Chuvas de Castamere. Enquanto esperava por sua vez, o anão observava Yezzan e seus convidados. A ameixa seca humana no lugar de honra era, evidentemente, o supremo comandante yunkaíta, que parecia tão formidável quanto fezes moles. Uma dúzia de senhores yunkaítas o cercava. Dois capitães mercenários estavam por perto também, cada um acompanhado por uma dúzia de homens de sua companhia. Um deles era um elegante pentoshi, grisalho e todo vestido em seda, com exceção do manto, que era uma coisa esfarrapada, feita de várias faixas costuradas de tecido rasgado e manchado de sangue. O outro capitão era o homem que tentara comprá-los naquela manhã, o de pele marrom e barba salpicada de branco.
- Ben Mulato Plumm - Doces lhe disse seu nome. - Capitão dos Segundos Filhos.
Um westerosi e um Plumm. Cada vez melhor.
- Vocês são os próximos - o Babá os informou. - Sejam divertidos, meus queridinhos, ou vão desejar tê-lo sido.
Tyrion não dominava metade dos velhos truques de Tostão, mas podia cavalgar no porco, cair quando devia, rolar e se levantar novamente. Tudo aquilo foi bem recebido. A visão de pequenas pessoas correndo como bêbados e batendo um no outro com armas de madeira parecia ser tão hilariante em um acampamento de cerco na Baía dos Escravos quanto fora no banquete de casamento de Joffrey, em Porto Real. Desdém, pensou Tyrion, a língua universal.
Seu mestre, Yezzan, ria mais alto e por mais tempo sempre que um dos anões caía ou sofria um golpe, todo seu vasto corpo balançando como sebo em um terremoto; os convidados esperavam para ver como Yurkhaz zo Yunzak reagiria antes de se juntarem ao riso. O supremo comandante parecia tão frágil que Tyrion ficou com medo de que o riso pudesse matá-lo. Quando o elmo de Merreca foi arrancado e voou até o colo de um yunkaíta de cara azeda e tokar de listras verdes e douradas, Yurkhaz cacarejou como uma galinha. Quando o tal senhor colocou a mão dentro do elmo e tirou uma grande polpa babosa de melão roxo, o supremo comandante riu tanto que seu rosto ficou da mesma cor da fruta. Virou-se para seu anfitrião e sussurrou algo que fez o mestre deles gargalhar e lamber os lábios ... embora, para Tyrion, parecesse ter uma ponta de raiva naqueles olhos amarelos.
Depois do espetáculo, os anões tiraram a armadura de madeira e a roupa que traziam por baixo, encharcada de suor, e colocaram frescas túnicas amarelas que foram providenciadas para que pudessem servir. Tyrion recebeu um jarro de vinho tinto e Merreca um jarro de água. Moviam-se pela tenda enchendo taças, seus pés com chinelos sussurrando sobre carpetes grossos. Era um trabalho mais duro do que parecia. Em pouco tempo, Tyrion estava com terríveis câimbras nas pernas, e um dos cortes em suas costas voltara a sangrar, o vermelho atravessando o linho amarelo de sua túnica. O anão mordeu a língua e continuou a servir.
A maioria dos convidados não prestava mais atenção neles do que nos outros escravos ... mas um dos yunkaítas, bêbado, declarou que Yezzan deveria fazer os dois anões foderem, e outro exigiu saber como Tyrion perdera o nariz. Eu o enfiei na boceta da sua esposa e ela o mordeu, ele quase respondeu ... mas a tempestade o convencera de que não queria morrer ainda, por isso, em vez disso, respondeu:
- Foi cortado como punição por insolência, senhor.
Então, um senhor com um tokar azul com franjas de pedras olho-de-tigre lembrou que Tyrion se vangloriara de suas habilidades no cyvasse durante o leilão.
- Vamos colocá-lo em teste - disse. Um tabuleiro e um conjunto de peças foram providenciados. Alguns momentos depois, o senhor, com o rosto vermelho, empurrou a mesa em fúria, espalhando peças pelo carpete ao som dos risos dos yunkaítas.
- Você deveria ter deixado ele ganhar - Merreca sussurrou.
Ben Mulato Plumm levantou a mesa caída, sorrindo.
- Tente comigo agora, anão. Quando era jovem, os Segundos Filhos fizeram um contrato com Volantis. Aprendi a jogar lá.
- Sou apenas um escravo. Meu nobre mestre decide quando e com quem jogo. - Tyrion se virou para Yezzan. - Mestre?
O senhor amarelo pareceu se divertir com a ideia.
- Que apostas propõe, capitão?
- Se eu ganhar, dê este escravo para mim - disse Plumm.
- Não - Yezzan zo Qaggaz respondeu. - Mas se você conseguir derrotar o anão, pode ter o preço que paguei nele, em ouro.
- Feito - o mercenário falou. As peças espalhadas foram apanhadas do carpete e eles se sentaram para jogar.
Tyrion ganhou a primeira partida. Plumm ficou com a segunda, pelo dobro das apostas. Enquanto se preparavam para a terceira rodada, o anão estudou seu oponente. Com a pele marrom, queixo e bochechas cobertos por uma barba eriçada cortada rente, cinzenta e branca, rosto amassado por mil rugas e algumas cicatrizes antigas, Plumm tinha um olhar amigável, especialmente quando sorria. Um partidário fiel, Tyrion decidiu. O tio favorito de qualquer homem, cheio de risadas, ditos antigos e sabedoria popular. Era tudo uma farsa. Aqueles sorrisos nunca tocavam os olhos de Plumm, onde a ganância se escondia atrás de um véu de cautela. Guloso, mas cuidadoso, esse aí.
O mercenário era um jogador quase tão ruim quanto o senhor yunkaíta fora, mas suas jogadas eram apáticas e obstinadas, em vez de ousadas. Seus arranjos iniciais foram diferentes a cada vez, mas sempre do mesmo jeito: conservadores, defensivos, passivos. Ele não joga para ganhar, Tyrion percebeu. Joga de forma a não perder. Funcionou na segunda partida, quando o homenzinho excedeu-se com um ataque insano. Não funcionou na terceira, nem na quarta, nem na quinta vez, que se provou ser a última.
Perto do fim da quarta competição, com sua fortaleza em ruínas, seu dragão morto, elefantes diante dele e um cavalo pesado circulando em seu traseiro, Plumm olhou, sorrindo, e disse:
- Yollo vence novamente. Morte em quatro.
- Três. - Tyrion bateu seu dragão. - Eu estava com sorte. Talvez devesse dar uma boa esfregada na minha cabeça antes da nossa próxima partida, capitão. Um pouco desta sorte pode passar-lhe pelos seus dedos. - Você ainda perderá, mas talvez me dê um melhor embate. Sorrindo, empurrou o tabuleiro de cyvasse, pegou sua jarra de vinho, e voltou a servir, com Yezzan zo Qaggaz consideravelmente mais rico e Ben Mulato Plumm consideravelmente empobrecido. Seu gigantesco mestre caíra no sono, bêbado, durante a terceira partida, sua taça escorregando dos dedos amarelados para derrubar o conteúdo no carpete, mas talvez ele ficasse satisfeito quando acordasse.
Quando o supremo comandante Yurkhaz zo Yunzak partiu, ajudado por um par de escravos corpulentos, aquilo pareceu um sinal geral para os outros convidados tomarem seus rumos também. Depois que a tenda esvaziou, o Babá reapareceu para dizer aos serventes que podiam fazer seu próprio banquete com os restos.
- Comam rapidamente. Tudo isto precisa estar limpo antes que vocês durmam.
Tyrion estava de joelhos, suas pernas doloridas e suas costas ensanguentadas gritando de dor, tentando esfregar a mancha que o vinho derramado pelo nobre Yezzan deixara sobre seu próprio carpete, quando o capataz deu um tapinha gentil em sua bochecha com a ponta do chicote.
- Yollo. Vocês se saíram muito bem. Você e sua esposa.
- Ela não é minha esposa.
- Sua puta, então. Em pé, vocês dois.
Tyrion ergueu-se cambaleando, uma perna tremendo sob ele. Suas coxas estavam com tantas câimbras que Merreca teve que dar uma mão para ajudá-lo a ficar em pé.
- O que fizemos?
- Muito e ainda mais - disse o capataz. - O Babá disse que seriam recompensados se agradassem ao nosso pai, não disse? Embora o nobre Yezzan deteste perder seus pequenos tesouros, como vocês viram, Yurkhaz zo Yunzak o convenceu que seria egoísmo manter tal gracejo incomum apenas para ele. Alegrem-se! Para celebrar a assinatura da paz, vocês terão a honra de disputar uma justa na Grande Arena de Daznak. Milhares verão vocês! Dezenas de milhares! E, oh, como vamos rir! 

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