quinta-feira, 3 de outubro de 2013

59 - O CAVALEIRO DESCARTADO


Todos de joelhos por Sua Magnificência Hizdahr zo Loraq, Décimo Quarto de seu Nobre Nome, Rei de Meereen, Filho de Ghis, Octarca do Antigo Império, Mestre do Skahazadhan, Consorte de Dragões e Sangue da Harpia - bradou o arauto. Sua voz ecoou pelo chão de mármore e circundou os pilares.
Sor Barristan Selmy escorregou a mão por baixo da dobra de seu manto e soltou a espada da bainha. Nenhuma lâmina era permitida na presença do rei, salvo aquelas de seus protetores. Parecia que ainda era considerado entre esse grupo, a despeito de sua demissão. Pelo menos, ninguém tentara tirar sua espada.
Daenerys Targaryen preferia conceder audiências em um banco de ébano polido, liso e simples, coberto com as almofadas que Sor Barristan encontrara para torná-lo mais confortável. O Rei Hizdahr substituíra o banco por dois imponentes tronos de madeira dourada, os altos encostos esculpidos com o formato de dragões. O rei sentava-se no trono da direita, com uma coroa de ouro na cabeça e um cetro incrustado com pedras preciosas em uma de suas mãos pálidas. O segundo trono permanecia vazio.
O trono importante, pensou Sor Barristan. Nenhuma cadeira de dragão pode substituir um dragão, não importa quão elaboradamente ela seja esculpida.
À direita dos tronos gêmeos estava Goghor, o Gigante, um brutamontes imenso de rosto selvagem, marcado por cicatrizes. À esquerda estava o Gato Malhado, com uma pele de leopardo pendurada no ombro. Atrás deles, estava Belaquo Quebra-Ossos e Khrazz, com seus olhos frios. Todos matadores experientes, pensou Selmy, mas uma coisa é encarar um inimigo em uma arena, com sua chegada anunciada com cornetas e tambores, e outra é encontrar um assassino escondido antes que ele ataque.
O dia estava fresco e apenas começando, mas, mesmo assim, ele sentia os ossos cansados, como se tivesse lutado a noite inteira. Quanto mais velho ficava, menos sono Sor Barristan parecia precisar. Quando era escudeiro, podia dormir dez horas por noite e ainda estar bocejando quando tropeçava para dentro do pátio de treinamento. Com sessenta e três, achava que cinco horas por noite eram mais do que suficientes. Na noite passada, mal conseguira dormir. Seu quarto era uma pequena cela do lado de fora dos aposentos da rainha, originalmente alojamentos de escravos; seus móveis consistiam em uma cama, um penico, um armário para as roupas e uma cadeira se quisesse se sentar. Em uma mesa ao lado da cama, mantinha uma vela de cera de abelha e uma pequena escultura do Guerreiro. Embora não fosse um homem piedoso, a escultura o fazia sentir-se menos sozinho nessa estranha cidade estrangeira, e era para ela que se voltava nas vigílias negras da noite. Proteja-me destas dúvidas que me corroem, rezara, e me dê forças para fazer o que é certo. Mas nem a oração nem a alvorada lhe trouxeram certezas.
O salão estava lotado como o velho cavaleiro jamais vira, mas foram os rostos ausentes que Barristan Selmy mais notou: Missandei, Belwas, Verme Cinzento, Aggo, Jhogo e Rakharo, Irri e Jhiqui, Daario Naharis. No lugar do Cabeça-Raspada estava um homem gordo com uma placa peitoral musculosa e uma máscara de leão, as pernas pesadas saindo debaixo de uma saia de tiras de couro: Marghaz zo Loraq, o primo do rei, novo comandante das Bestas de Bronze. Selmy já desenvolvera um saudável desprezo pelo homem. Conhecera esse tipo em Porto Real - bajulador com seus superiores, duro com os inferiores, tão cego quanto arrogante, e orgulhoso demais para o pouco que tinha a oferecer.
Skahaz pode estar no salão também, Selmy percebeu, com aquela cara feia escondida atrás de uma máscara. Dois grupos de Bestas de Bronze estavam entre os pilares, as luzes das tochas brilhando no bronze polido das máscaras. O Cabeça-Raspada podia ser qualquer um deles.
O salão zumbia com o som de uma centena de vozes baixas, ecoando nos pilares e no chão de mármore. Era um som sinistro, raivoso. Fazia Selmy se lembrar do som que um ninho de vespas fazia um instante antes dos insetos saírem agitados. E, nos rostos na multidão, via raiva, tristeza, desconfiança, medo.
Nem bem o arauto do rei pediu à corte que declarasse e o horror teve início. Uma mulher começou a chorar por um irmão que morrera na Arena de Daznak, outro pelos danos causados ao seu palanquim. Um homem gordo arrancou seus curativos para mostrar à corte seu braço queimado, ainda em carne viva e supurando. E quando um homem em um tokar azul e dourado começou a falar de Harghaz, o Herói, um liberto atrás dele o empurrou no chão. Foram necessárias seis Bestas de Bronze para separá-los e arrastá-los para fora do salão. Raposa, falcão, foca, gafanhoto, leão, sapo. Selmy se perguntava se as máscaras tinham significado para os homens que as usavam. O mesmo homem usava a mesma máscara todos os dias, ou escolhiam novas faces a cada manhã?
- Silêncio! - Reznak mo Reznak suplicava. - Por favor! Eu responderei se vocês ...
- É verdade? - uma liberta gritou. - Nossa mãe está morta?
- Não, não, não - Reznak guinchou. - A Rainha Daenerys retornará a Meereen em seu próprio tempo, em todo o seu poder e majestade. Até esse momento, Sua Veneração o Rei Hizdar deve ...
- Ele não é nenhum rei para mim - um liberto gritou.
Os homens começaram a empurrar uns aos outros.
- A rainha não está morta - o senescal proclamou. - Seus companheiros de sangue foram enviados pelo Skahazadhan para encontrar Sua Graça e trazê-la de volta para seu amado senhor e seus leais súditos. Cada um tem dez cavaleiros escolhidos, e cada homem tem três cavalos velozes, então viajarão rápido e para longe. A Rainha Daenerys será encontrada.
Um ghiscari alto em uma veste brocada falou em seguida, em uma voz tão sonora quanto fria. O Rei Hizdahr se mexeu em seu trono de dragão, seu rosto impenetrável, enquanto fazia o melhor possível para parecer atento mas imperturbável. Mais uma vez, o senescal respondeu.
Sor Barristan deixou as palavras oleosas de Reznak passarem por ele. Seus anos na Guarda Real o haviam ensinado o truque de ouvir sem escutar, especialmente útil quando quem falava tinha a intenção de provar que as palavras eram realmente vento. De volta ao fundo do salão, espiou o príncipe dornense e seus dois companheiros. Eles não deveriam ter vindo. Martell não percebe o perigo. Daenerys era sua única amiga nesta corte, e ela se foi. Ele se perguntava o quanto eles entendiam do que estava sendo dito. Nem mesmo ele conseguia compreender sempre a língua mestiça ghiscari que os traficantes de escravo falavam, especialmente quando falavam rápido.
O Príncipe Quenryn estava ouvindo atentamente, pelo menos. Este um é filho de seu pai. Baixo e atarracado, rosto liso, parecia ser um rapaz decente, sóbrio, sensível, obediente ... mas não o tipo que fazia o coração de uma jovem garota bater mais rápido. E Daenerys Targaryen, o que mais ela pudesse ser, ainda era uma jovem garota, como ela mesma afirmava quando pretendia bancar a inocente. Como todas as boas rainhas, colocava seu povo antes de qualquer coisa - caso contrário, jamais teria se casado com Hizdahr zo Loraz - mas a garota nela ainda ansiava por poesia, paixão e risos. Ela quer fogo, e Dorne lhe manda lama.
Era possível fazer um cataplasma de lama para baixar a febre. Era possível plantar sementes na lama e conseguir uma colheita para alimentar os filhos. Lama podia nutrir, enquanto fogo apenas consumia, mas tolos, crianças e jovens garotas sempre escolheriam o fogo.
Atrás do príncipe, Sor Gerris Orinkwater sussurrava alguma coisa para Yronwood. Sor Gerris era o que seu príncipe não era; alto, esbelto e agradável, com a graça de um espadachim e a sagacidade de um cortesão. Selmy não duvidava que muitas donzelas dornenses haviam corrido os dedos por aqueles cabelos riscados pelo sol e beijado aquele sorriso provocante que ele tinha nos lábios. Se esse aí fosse o príncipe, as coisas poderiam ter sido diferentes, não podia deixar de pensar... mas havia algo agradável demais em Drinkwater para o gosto dele. Moeda falsa, o velho cavaleiro pensou. Havia conhecido muitos homens assim antes.
O que quer que ele estivesse sussurrando devia ser engraçado, pois seu grande amigo careca deu um repentino ronco, segurando o riso, alto o suficiente para que o rei virasse a cabeça na direção dos dornenses. Quando viu o príncipe, Hizdahr zo Loraq franziu o cenho.
Sor Barristan não gostou daquela expressão. E quando o rei chamou seu primo Marghaz mais perto, inclinou-se e sussurrou em seu ouvido, gostou menos ainda.
Não tenho nenhum juramento com Dome, Sor Barristan disse a si mesmo. Mas Lewyn Martell havia sido seu Irmão Juramentado, nos dias do passado em que os laços entre os membros da Guarda Real ainda eram profundos. Não pude ajudar o Príncipe Lewyn no Tridente, mas posso ajudar seu sobrinho agora. Martell estava dançando em um ninho de víboras e nem mesmo via as cobras. Sua presença constante, depois que Daenerys dera a si mesma para outro diante dos olhos dos deuses e dos homens, seria uma provocação para qualquer marido, e Quentyn não tinha mais a proteção da rainha para livrá-lo da ira de Hizdahr. Embora ...
O pensamento o atingiu como um tapa em seu rosto. Quentyn crescera na corte de Dorne. Conspirações e venenos não eram estranhos para ele. Nem o Príncipe Lewyn era seu único tio. Ele é parente da Víbora Vermelha. Daenerys tomara outro como seu consorte, mas, se Hizdahr morresse, ela estaria livre para se casar novamente. O Cabeça-Raspada poderia estar errado? Quem disse que os gafanhotos eram destinados a Daenerys? Estavam no camarote do próprio rei. E se era para ser ele a vítima o tempo todo? A morte de Hizdahr teria esmagado a frágil paz. Os Filhos da Harpia teriam retomado seus assassinatos; os yunkaítas, sua guerra. Daenerys não teria alternativa melhor do que Quentyn e seu pacto nupcial.
Sor Barristan ainda estava lutando com a suspeita quando ouviu o som de pesadas botas subindo os degraus da escada íngreme no fundo do salão. Os yunkaítas haviam chegado. Três Sábios Mestres lideravam a procissão da Cidade Amarela, cada um com sua própria comitiva armada. Um mercador de escravos vestia um tokar de seda castanho-avermelhada com franjas de ouro, o outro um tokar listrado de verde-escuro e laranja, e o terceiro uma placa peitoral ornamentada com cenas eróticas feitas em âmbar-preto, jade e madrepérola. O capitão mercenário Barbassangrenta os acompanhava carregando um saco de couro pendurado em um ombro maciço e exibindo um olhar de júbilo e morte no rosto.
Nada do Príncipe Esfarrapado, Selmy reparou. Nada de Ben Mulato Plumm. Sor Barristan olhou Barbassangrenta friamente. Me dê qualquer motivo para dançar com você, e veremos quem vai rir no final.
Reznak mo Reznak rastejou para a frente.
- Sábios Mestres, vocês nos honram. Seu Iluminado, o Rei Hizdahr oferece suas boas vindas para seus amigos de Yunkai. Entendemos ...
- Entendam isso. - Barbassangrenta puxou uma cabeça decepada do saco e jogou-a no senescal.
Reznak deu um grito de susto e saltou de lado. A cabeça saltou por ele, deixando manchas de sangue no chão de mármore púrpura conforme rolava, até bater contra o pé do trono de dragão do Rei Hizdahr. Por todo o comprimento do salão, Bestas de Bronze abaixaram suas lanças. Goghor, o Gigante, moveu-se pesadamente para a frente, colocando-se na frente do trono do rei, e o Gato Malhado e Khrazz foram um para cada lado do Rei Hizdahr para formar uma parede.
Barbassangrenta riu.
- Ele está morto. Não morderá.
Cuidadosamente, bem cuidadosamente, o senescal se aproximou da cabeça, erguendo-a com delicadeza pelo cabelo.
- Almirante Groleo.
Sor Barristan olhou para o trono. Tinha servido tantos reis que não podia deixar de imaginar como cada um deles teria reagido a esta provocação. Aerys teria se encolhido de horror, provavelmente machucando-se nas farpas do Trono de Ferro, então gritaria para seus espadachins cortarem os yunkaítas em pedaços. Robert teria gritado por seu martelo para pagar a Barbassangrenta em espécie. Mesmo Jaehaerys, considerado fraco por muitos, teria ordenado a prisão de Barbassangrenta e dos mercadores de escravos yunkaítas.
Hizdahr sentava-se congelado, um homem paralisado. Reznak colocou a cabeça em uma almofada de cetim, aos pés do rei, e afastou-se rapidamente, a boca torcida em uma careta de desgosto. Sor Barristan podia sentir o pesado perfume floral do senescal a muitos metros de distância.
O morto olhava com reprovação. Sua barba estava marrom com sangue seco, mas um fio vermelho ainda escorria do pescoço. Só de olhar para ele, era fácil dizer que fora necessário mais de um golpe para separar a cabeça do corpo. No fundo do salão, peticionários começavam a sair. Uma das Bestas de Bronze arrancou a máscara de bronze de falcão e começou a vomitar o desjejum.
Barristan Selmy não era estranho a cabeças decepadas. Esta uma, no entanto ... ele tinha cruzado metade do mundo com o velho marinheiro, de Pentos para Qarth e de volta para Astapor. Groleo era um bom homem. Não merecia este fim. Tudo o que queria era voltar para casa. O cavaleiro ficou tenso, esperando.
- Isso - o Rei Hizdahr disse, finalmente - isso não é... não estamos satisfeitos, isso ... qual o significado dessa ... dessa ...
O mercador de escravos no tokar castanho-avermelhado pegou um pergaminho.
- Tenho a honra de trazer esta mensagem do conselho de mestres. - Desenrolou o rolo. - Está aqui escrito, Sete entraram em Meereen para assinar os acordos de paz e testemunhar os jogos comemorativos na Arena de Daznak. Como garantia por sua segurança, sete reféns foram ofertados a nós. A Cidade Amarela lamenta por seu nobre filho Yurkhaz zo Yunzak, que pereceu cruelmente enquanto era convidado de Meereen. Sangue deve pagar por sangue.
Groleo tinha uma esposa em Pentos. Filhos, netos. Por que ele, entre todos os reféns? Jhogo, Herói e Daario Naharis, todos comandavam guerreiros, mas Groleo era um almirante sem frota. Será que tiraram no palitinho, ou pensaram que Groleo era o menos valioso para nós, o menos propenso a provocar represálias? O cavaleiro se perguntava ... mas era mais fácil levantar essas questões do que respondê-las. Não tenho nenhuma habilidade em desfazer tais nós.
- Vossa Graça - Sor Barristan chamou. - Se for do seu agrado se recordar, o nobre Yurkhaz morreu por acaso. Ele tropeçou nos degraus enquanto tentava fugir do dragão e foi esmagado pelos pés de seus próprios escravos e companheiros. Isso, ou seu coração estourou de terror. Ele era velho.
- Quem é esse que fala sem a permissão do rei? - perguntou o senhor yunkaíta no tokar listrado, um homem pequeno com um queixo retraído e dentes grandes demais para sua boca. Fazia Selmy se lembrar de um coelho. - Os senhores de Yunkai devem prestar atenção às conversas fiadas de guardas? - Balançou as pérolas da franja de seu tokar.
Hizdahr zo Loraq não conseguia desviar os olhos da cabeça. Apenas quando Reznak sussurrou algo em seu ouvido, ele finalmente se mexeu.
- Yurkhaz zo Yunkaz era seu supremo comandante - disse. - Qual de vocês fala por Yunkai agora?
- Todos nós - disse o coelho. - O conselho dos mestres.
O Rei Hizdahr encontrou alguma firmeza.
- Então todos vocês são responsáveis por esta violação da nossa paz.
O yunkaíta com a placa peitoral respondeu:
- Nossa paz não foi quebrada. Sangue paga sangue, uma vida por uma vida. Para mostrar nossa boa-fé, devolvemos três de seus reféns. - As fileiras de ferro atrás dele se abriram. Três meereeneses foram levados adiante, agarrando seus tokars - duas mulheres e um homem.
- Irmã - disse Hizdahr zo Loraq, rigidamente. - Primos. -- Fez um gesto para a cabeça sangrando. - Tirem isso da nossa visão.
- O almirante era um homem do mar - Sor Barristan o recordou. - Talvez Vossa Magnificência possa pedir aos yunkaítas que devolvam seu corpo para nós, para que possamos sepultá-lo sob as ondas.
O senhor dente-de-coelho acenou com a mão.
- Se for do agrado de Vosso Iluminado, isso será feito. Um sinal do nosso respeito.
Reznak mo Reznak limpou a garganta ruidosamente.
- Sua Magnificência, a Rainha Daenerys deu para vocês ... ah ... sete reféns. Os outros três ...
- Os outros permanecerão como nossos convidados - anunciou o senhor yunkaíta com a placa peitoral - até que os dragões sejam destruídos.
Um silêncio caiu no salão. Então vieram os murmúrios e os resmungos, xingamentos sussurrados, orações sussurradas, as vespas se movendo no vespeiro.
- Os dragões ... - disse o Rei Hizdahr.
- ... são monstros, como todos os homens viram na Arena de Daznak. Nenhuma paz verdadeira é possível enquanto eles viverem.
Reznak replicou:
- Sua Magnificência, a Rainha Daenerys, é Mãe de Dragões. Apenas ela pode...
O desprezo de Barbassangrenta o interrompeu.
- Ela se foi. Queimada e devorada. Ervas daninhas crescem em seu crânio quebrado.
Um rugido recebeu aquelas palavras. Alguns começaram a gritar e amaldiçoar. Outros batiam os pés e assobiavam em aprovação. Foi necessário que as Bestas de Bronze batessem com os cabos de suas lanças contra o chão para que o salão se acalmasse novamente.
Sor Barristan não tirou os olhos de Barbassangrenta nem por um instante. Ele veio saquear a cidade, e a paz de Hizdahr burlou sua pilhagem. Ele fará o que for necessário para iniciar o derramamento de sangue.
Hizdahr zo Loraq levantou-se lentamente de seu trono de dragão.
- Devo consultar meu conselho. Esta audiência está encerrada.
- Todos de joelhos por Sua Magnificência Hizdahr zo Loraq, Décimo Quarto de seu Nobre Nome, Rei de Meereen, Filho de Ghis, Octarca do Antigo Império, Mestre do Skahazadhan, Consorte de Dragões e Sangue da Harpia - o arauto bradou. As Bestas de Bronze saíram de entre os pilares para formar uma linha, então começaram um lento avanço conjunto, conduzindo os peticionários para fora do salão.
Os dornenses não tinham que ir tão longe quanto a maioria. Como convinha à sua posição social e título, o Príncipe Martell havia recebido alojamentos dentro da Grande Pirâmide, dois níveis abaixo; um belo conjunto de quartos com sua própria latrina e terraço murado. Talvez fosse por isso que ele e seus companheiros permaneceram, esperando até que a multidão tivesse diminuído antes de começar a seguir em direção às escadas.
Sor Barristan os observou, pensativo. O que Daenerys iria querer? Perguntou a si mesmo. Achava que sabia. O velho cavaleiro atravessou o salão, seu longo manto branco ondulando atrás dele. Alcançou os dornenses no topo dos degraus.
- A corte de seu pai nunca foi nem metade tão animada - ouviu Drinkwater brincar.
- Príncipe Quentyn - Selmy chamou. - Posso pedir uma palavra?
Quentyn Martell se virou.
- Sor Barristan. É claro. Meus aposentos estão um nível abaixo.
Não.
- Não é minha função aconselhá-lo, Príncipe Quentyn ... mas, se eu fosse você, não retornaria para meus aposentos. Você e seus amigos devem descer esses degraus e partir.
O Príncipe Quentyn o encarou.
- Partir da pirâmide?
- Partir da cidade. Voltar para Dorne.
Os dornenses trocaram um olhar.
- Nossas armas e armaduras estão em nossos aposentos - disse Gerris Drinkwater. - Sem mencionar a maior parte do dinheiro que nos resta.
- Espadas podem ser substituídas - disse Sor Barristan. - E posso providenciar para vocês dinheiro suficiente para a passagem de volta para Dorne. Príncipe Quentyn, o rei reparou em você hoje. Ele franziu o cenho.
Gerris Drinkwater riu.
- Devemos ter medo de Hizdahr zo Loraq? Você acaba de vê-lo. Ele se intimidou diante dos yunkaítas. Mandaram uma cabeça para ele, e ele não fez nada.
Quentyn Martell acenou com a cabeça, em concordância.
- Um príncipe faz bem em pensar antes de agir. Este rei ... não sei o que pensar dele. A rainha me avisou sobre ele, é verdade, mas ...
- Ela o avisou? - Selmy franziu a testa. - Por que ainda está aqui?
O Príncipe Quentyn corou.
- O pacto nupcial...
- ... foi feito por dois homens mortos, e não tem nem uma palavra sobre a rainha ou você. A mão de sua irmã foi prometida ao irmão da rainha, outro homem morto. Não tem validade. Até que você aparecesse aqui, Sua Graça era ignorante da existência disso. Seu pai mantém bem seus segredos, Príncipe Quentyn. Bem demais, temo. Se a rainha tivesse sabido deste pacto em Qarth, talvez ela jamais tivesse vindo para a Baía dos Escravos, mas você veio tarde demais. Não tenho nenhum desejo de colocar sal em suas feridas, mas Sua Graça tem um novo marido e um antigo amante, e parece preferir ambos a você.
A raiva brilhou nos olhos escuros do príncipe.
- Este fidalgote ghiscari não é um consorte adequado para a rainha dos Sete Reinos.
- Isso não cabe a você julgar. - Sor Barristan parou, perguntando-se se já havia falado demais. Não. Diga-lhe o restante. - Naquele dia, na Arena de Daznak, uma parte da comida do camarote real foi envenenada. Foi um acaso que Belwas, o Forte, tenha comido tudo. As Graças Azuis dizem que apenas seu tamanho e sua força descomunal o salvaram, mas chegou perto. Ele ainda pode morrer.
O choque era claro no rosto do Príncipe Quentyn.
- Veneno ... para Daenerys?
- Para ela ou para Hizdahr. Talvez para ambos. O camarote era dele, no entanto. Sua Graça fez todos os arranjos. Se o veneno foi coisa dele... bem, ele precisaria de um bode expiatório. Quem melhor do que um rival de uma terra distante, sem amigos nesta corte? Quem melhor que um pretendente que a rainha rejeitou?
Quentyn Martell ficou pálido.
- Eu? Eu nunca ... você não pode pensar que tomei parte em qualquer...
Essa é a verdade, ou ele é um mestre da encenação.
- Outros poderiam - disse Sor Barristan. - A Víbora Vermelha era seu tio. E você tem boas razões para querer o Rei Hizdahr morto.
- Assim como outros - sugeriu Gerris Drinkwater. - Naharis é um deles. o...
- ... amante da rainha - Sor Barristan completou, antes que o cavaleiro dornense dissesse qualquer coisa que pudesse manchar a honra da rainha. - É assim que vocês chamam em Dorne, não é? - Não esperou uma resposta. - O Príncipe Lewyn era meu Irmão Juramentado. Naqueles dias havia poucos segredos entre os homens da Guarda Real. Sei que ele tinha uma amante. Ele não achava que havia qualquer vergonha nisso.
- Não - disse Quentyn, com o rosto vermelho - mas ...
- Daario mataria Hizdahr em um piscar de olhos, se pudesse. - Sor Barristan continuou. - Mas não com veneno. Nunca. E, de todo modo, Daario não estava lá. Hizdahr ficaria satisfeito em culpá-lo pelos gafanhotos, do mesmo jeito... mas o rei ainda precisa dos Corvos Tormentosos, e os perderia se aparentasse cumplicidade na morte de seu capitão. Não, meu príncipe. Se Sua Graça precisar de um envenenador, olhará para você. - Disse tudo o que podia dizer em segurança. Em mais alguns dias, se os deuses sorrissem para eles, Hizdahr zo Loraq não governaria mais Meereen ... mas nada de bom haveria em ter o Príncipe Quentyn preso no banho de sangue que estava vindo. - Se deve permanecer em Meereen, deveria ficar bem distante da corte e esperar que Hizdahr o esqueça. - Sor Barristan completou: - Mas um navio para Volantis seria mais sábio, meu príncipe. Qualquer que seja sua escolha, desejo-lhe o melhor.
Antes que tivesse descido três degraus, Quentyn Martell o chamou.
- Barristan, o Ousado, eles o chamam.
- Alguns, sim. - Selmy ganhara aquele nome quando tinha dez anos, recém-feito escudeiro, ainda tão vaidoso, orgulhoso e tolo que colocou na cabeça que podia disputar justas contra cavaleiros provados e comprovados. Então, pegou emprestado um cavalo de guerra e umas partes de armadura do arsenal de Lorde Dondarrion e integrou as listas em Portonegro como um cavaleiro misterioso. Até o arauto riu. Meus braços eram tão finos que quando abaixei a lança, tudo o que podia fazer era evitar que a ponta arrastasse no chão. Lorde Dondarrion estaria no direito de arrancá-lo do cavalo e espancá-lo, mas o Príncipe das Libélulas ficara com pena do garoto desorientado na armadura mal ajustada e concedeu-lhe o direito de seguir adiante com o desafio. Uma corrida bastou. Depois, o Príncipe Duncan o ajudara a ficar em pé e a tirar o elmo. “Um garoto”, proclamou para a multidão. “Um garoto ousado”. Cinquenta e três anos atrás. Quantos dos homens que estavam em Porto negro ainda estão vivos?
- Que nome você acha que me darão, se eu voltar para Dorne sem Daenerys? - o Príncipe Quentyn perguntou. - Quentyn, o Cauteloso? Quentyn, o Covarde? Quentyn, a Codorna?
O Príncipe que Chegou Tarde Demais, o velho cavaleiro pensou ... mas, se um cavaleiro da Guarda Real não sabe mais nada, aprende a segurar a língua.
- Quentyn, o Sábio - sugeriu. E desejou que fosse verdade.

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