sexta-feira, 4 de outubro de 2013

71 - DAENERYS


O morro era uma ilha de pedra em um mar verde.
Dany levou metade da manhã para descê-lo. Quando chegou ao fim, estava sem fôlego. Seus músculos doíam, e sentia-se como se estivesse com um início de febre. As rochas haviam deixado suas mãos em carne viva. Estão melhores do que estavam, pensou, enquanto cutucava uma bolha estourada. Sua pele estava rosada e macia, e um claro líquido leitoso vazava das rachaduras nas palmas, mas as queimaduras estavam sarando.
O morro era maior dali. Dany começara a chamá-lo de Pedra do Dragão, por causa da antiga citadela onde nascera. Não tinha lembranças daquela Pedra do Dragão, mas não esqueceria dessa tão cedo. Um matagal de gramíneas e arbustos espinhosos cobria as encostas inferiores; mais acima, um emaranhado irregular de rochas nuas se erguia íngreme e repentinamente para o céu. Lá no alto, entre pedregulhos quebrados, cumes afiados e pináculos finos, Drogon fizera seu covil em uma caverna rasa. Ele morava lá havia algum tempo, Dany percebeu na primeira vez em que viu o morro. O ar cheirava a cinzas, cada pedra e árvore à vista estava queimada e enegrecida, o chão repleto de ossos queimados e partidos, mesmo assim, era um lar para ele.
Dany conhecia a atração de um lar.
Dois dias atrás, subindo em um pináculo de pedra, vislumbrara água ao sul, uma linha tênue que brilhara brevemente enquanto o sol se punha. Um córrego, Dany reconheceu. Pequeno, mas poderia levar a um riacho maior, e esse riacho poderia desaguar em algum rio pequeno, e todos os rios nessa parte do mundo eram vassalos do Skahazadhan. Uma vez que encontrasse o Skahazadhan, precisaria apenas seguir a jusante até a Baía dos Escravos.
Preferia ter retornado para Meereen nas asas do dragão, é claro. Mas aquele era um desejo que Drogon não parecia partilhar.
Os senhores de dragões da antiga Valíria controlavam suas montarias com feitiços de ligação e cornos mágicos. Daenerys fizera com uma palavra e um chicote. Montada nas costas do dragão, frequentemente se sentia como se estivesse aprendendo a montar novamente. Quando chicoteava sua égua prateada no flanco direito, a égua ia para a esquerda, por causa do instinto primitivo dos cavalos de fugir do perigo. Quando acertava o chicote do lado direito de Drogon, ele desviava para a direita, pois o primeiro instinto do dragão é sempre atacar. Mas, algumas vezes, parecia não fazer diferença onde ela o acertava; algumas vezes ele ia para onde queria e a levava consigo. Nem chicote nem palavras podiam virar Drogon, se ele não quisesse ser virado. O chicote mais irritava o animal do que o feria, ela viera a perceber; suas escamas haviam ficado mais duras do que um chifre.
E não importava o quão longe o dragão voasse cada dia, chegando o anoitecer algum instinto levava-o para casa em Pedra do Dragão. A casa dele, não a minha. Sua casa estava em Meereen, com seu marido e seu amante. Era o local ao qual pertencia, certamente.
Continuar andando. Se olhar para trás, estarei perdida.
As lembranças caminhavam com ela. Nuvens vistas de cima. Cavalos tão pequenos quanto formigas andando pela grama. Uma lua prateada, quase perto o suficiente para ser tocada. Rios correndo brilhantes e azuis embaixo, resplandecendo ao sol. Verei essas coisas novamente? Nas costas de Drogon, ela se sentira inteira. Lá em cima, no céu, os infortúnios do mundo não podiam tocá-la. Como poderia abandonar aquilo?
Já era tempo, no entanto. Uma garota passaria a vida nessa brincadeira, mas ela era uma mulher crescida, uma rainha, uma esposa, mãe de milhares. Seus filhos precisavam dela. Drogon se dobrara diante do chicote, e ela também devia. Tinha que vestir sua coroa novamente e retornar para seu banco de ébano e para os braços de seu nobre marido.
Hizdahr, dos beijos tépidos.
O sol estava quente naquela manhã, e o céu, azul e sem nuvens. Aquilo era bom. As roupas de Dany eram dificilmente mais do que trapos e forneciam muito pouco calor. Uma de suas sandálias escorregara durante a luta selvagem em Meereen, e deixara a outra na caverna de Drogon, preferindo andar descalça do que meio calçada. O tokar e os véus, ela abandonara na arena, sua roupa de baixo de linho não fora feita para enfrentar os dias quentes e as noites frias do mar dothraki. Suor, grama e sujeira a mancharam, e Dany havia rasgado uma faixa da bainha para fazer uma bandagem para sua canela. Devo parecer uma coisa esfarrapada e faminta, pensou, mas se os dias permanecerem quentes, não congelarei.
A jornada dela fora solitária, e na maior parte do tempo estivera machucada e com fome ... mesmo assim, apesar de tudo sentira-se estranhamente feliz ali. Algumas dores, uma barriga vazia, frio à noite... o que isso importa quando você pode voar? Eu faria tudo novamente.
Jhiqui e lrri deviam estar esperando no topo da pirâmide em Meereen, disse para si mesma. Sua doce escriba, Missandei, também, e seus pequenos pajens. Eles lhe trariam comida, e ela poderia se banhar na piscina sob o caquizeiro. Seria bom sentir-se limpa novamente. Dany não precisava de um espelho para saber que estava imunda.
Estava faminta também. Em uma manhã, encontrara algumas cebolas selvagens crescendo a meio caminho da encosta sul e, mais tarde, naquele mesmo dia, um frondoso vegetal avermelhado que podia ser algum tipo estranho de repolho. O que quer que fosse não a deixara doente. Além daquilo, e de um peixe que pegara na lagoa temporária do lado de fora da caverna de Drogon, tivera que sobreviver da melhor maneira possível dos restos do dragão, ossos queimados e pedaços de carne esfumaçada, meio torradas e meio cruas. Precisava de mais, sabia. Um dia, chutou o crânio partido de uma ovelha com a lateral do pé descalço e a mandou saltando pela beira do morro. Enquanto observava o crânio rolar pela encosta íngreme até o mar de grama, percebeu que poderia seguir por ali.
Dany partiu pela grama alta em um ritmo acelerado. A terra estava quente entre os dedos de seus pés. A grama era tão alta quanto ela. Não parecia tão alta quando eu estava montada na minha prata, cavalgando ao lado do meu sol-e-estrelas na frente de seu khalasar. Conforme andava, batia em suas coxas com o chicote do mestre da arena. Aquilo e os trapos em suas costas era tudo o que trouxera de Meereen.
Embora caminhasse entre um reino verde, não era o profundo e rico verde do verão. Mesmo aqui o outono marcava sua presença, e o inverno não estava muito longe. A grama era mais clara do que ela se lembrava, um verde abatido e doentio, em vias de se tornar amarelo. Depois disso, viria o marrom. A grama estava morrendo.
Daenerys Targaryen não era estranha ao mar dothraki, o grande oceano de grama que se estendia da floresta de Qohor até a Mãe das Montanhas e o Ventre do Mundo. Vira-o pela primeira vez quando ainda era uma garota, recém-casada com Khal Drogo e a caminho de Vaes Dothraki para ser apresentada às anciãs do dosh khaleen. A visão de toda aquela grama se espalhando diante dela lhe tirara o fôlego. O céu era azul, a grama era verde, e eu estava cheia de esperanças. Sor Jorah estava com ela, seu velho urso rude. Tinha Irri, Jhiqui e Doreah para cuidar dela, seu sol-e-estrelas para abraçá-la à noite, seu filho crescendo dentro de si. Rhaego. Eu ia chamá-lo de Rhaego, e o dosh khaleen disse que ele seria o Garanhão que Monta o Mundo. Nunca, desde aqueles dias de poucas lembranças em Bravos, quando vivera na casa com a porta vermelha, havia sido tão feliz.
Mas, no deserto vermelho, toda sua alegria se transformara em cinzas. Seu sol-e-estrelas caíra do cavalo, a maegi Mirri Maz Duur matara Rhaego em seu útero, e Dany asfixiara a casca vazia de Khal Drogo com as próprias mãos. Depois, o grande khalasar de Drogo fora aniquilado. Ko Pono nomeara-se Khal Pono e levara muitos cavaleiros consigo, e muitos escravos também. Ko Jhaqo nomeara-se Khal Jhaqo e cavalgara com muitos mais. Mago, companheiro de sangue de Khal Jhaqo, estuprara e matara Eroeh, uma garota que Daenerys salvara dele. Apenas o nascimento dos dragões entre o fogo e a fumaça da pira funerária de Khal Drogo poupara Dany de ser arrastada de volta a Vaes Dothrak para viver o restante de seus dias entre as anciãs do dosh khaleen.
O fogo queimou meu cabelo, mas, fora isso, não tocou em mim. Acontecera o mesmo na Arena de Daznak. Disso ela se lembrava, embora muito do que se seguiu estivesse obscuro. Tantas pessoas, gritando e empurrando. Lembrava-se de cavalos empinando, de uma carroça de comida espalhando melões quando tombou. Por baixo, uma lança veio voando, seguida por flechas de bestas. Uma passou tão perto que Dany sentiu raspar em sua bochecha. Outras escorregaram pelas escamas de Drogon, alojaram-se entre elas ou atravessaram a membrana de suas asas. Lembrava-se do dragão torcendo-se embaixo dela, estremecendo aos impactos, enquanto ela tentava desesperadamente se agarrar às costas do animal. Os ferimentos soltavam fumaça. Dany viu uma das flechas queimando em chamas súbitas. Outra caiu, soltando-se com a batida das asas. Embaixo, via homens girando, envoltos em chamas, mãos para cima, como se apanhados em alguma dança louca. Uma mulher em um tokar verde alcançou uma criança que chorava, puxando-a para seus braços para protegê-la das chamas. Dany viu a cor vividamente, mas não o rosto da mulher. Pessoas a pisotearam enquanto se enroscavam nos tijolos. Alguns estavam em chamas.
Então tudo aquilo desaparecera, os sons ficando mais baixos, as pessoas encolhendo, as lanças e flechas caindo embaixo deles, conforme Drogon arranhava seu caminho para o céu. Para cima, para cima, e para cima ele a levara, bem acima das pirâmides e das arenas, as asas estendidas para pegar o ar quente que se erguia dos tijolos da cidade cozidos pelo sol. Se eu cair e morrer, mesmo assim terá valido a pena, ela pensara.
Voaram para o norte, além do rio, Drogon deslizando com asas rasgadas e esfarrapadas, através de nuvens que se moviam como os estandartes de algum exército fantasmagórico. Dany vislumbrara a costa da Baía dos Escravos e a antiga estrada valiriana que corria ao lado por areia e desolação até desaparecer no oeste. O caminho para casa. Então não havia nada sob eles além de grama ondulando ao vento.
Esse primeiro voo foi há mil anos? Algumas vezes, parecia que sim.
O sol ficava mais quente conforme se levantava no céu, e, em pouco tempo, a cabeça dela latejava. O cabelo de Dany estava crescendo de novo, mas lentamente.
- Preciso de um chapéu - disse em voz alta. No alto da Pedra do Dragão, tentara fazer um, tecendo hastes de grama como vira as mulheres dothraki fazendo durante seu tempo com Drogo, mas estava usando o tipo errado de grama, ou simplesmente não tinha a habilidade necessária. Seus chapéus desfaziam-se aos pedaços em suas mãos. Tente novamente, dizia para si mesma. Você fará melhor da próxima vez. Você é o sangue do dragão, você pode fazer um chapéu. Tentou e tentou, mas sua última tentativa não fora mais bem sucedida do que a primeira.
Só à tarde Dany encontrou o córrego que vislumbrara do alto do morro. Era um ribeirinho, um regato, um fio d'água, não mais largo que seu braço ... e seu braço emagrecera cada dia que passara em Pedra do Dragão. Dany pegou um punhado de água e jogou no rosto. Quando colocou as mãos em concha na água, os nós de seus dedos se afundaram na lama no meio do regato. Ela desejara água mais fria e mais limpa... mas, não, se tivesse que se prender a esperanças e desejos, desejaria um resgate.
Ainda se agarrava à esperança de que alguém viria atrás dela. Sor Barristan poderia vir procurá-la; ele era o primeiro de sua Guarda da Rainha, jurado a defendê-la com a própria vida. Seus companheiros de sangue não eram estranhos ao mar dothraki, e as vidas deles estavam ligadas à dela. Seu marido, o nobre Hizdahr zo Loraq, devia enviar pessoas para buscá-la. E Daario ... Dany o imaginava cavalgando na direção dela através da grama alta, sorrindo, seu dente de ouro brilhando com a última luz do sol poente.
Só que Daario fora enviado para os yunkaítas, um refém para garantir que nenhum mal acontecesse aos capitães de Yunkai. Daario, Herói, Jhogo e Groleo, e três dos parentes de Hizdahr. Agora, certamente, todos os reféns deviam ter sido libertados. Mas ... Ela se perguntava se as lâminas de seu capitão ainda estavam penduradas na parede ao lado de sua cama, esperando que Daario voltasse para reivindicá-las.
- Deixarei minhas garotas com você - ele dissera. - Mantenha-as a salvo para mim, amada.
E ela se perguntara o quanto os yunkaítas sabiam sobre o tanto que seu capitão significava para ela. Fizera aquela pergunta a Sor Barristan na tarde em que os reféns foram enviados.
- Eles devem ter ouvido boatos - ele respondera. - Naharis pode até mesmo ter se gabado da grande... estima ... de Vossa Graça por ele. Se me perdoa dizer isso, a modéstia não é uma das virtudes do capitão. Ele tem muito orgulho de sua ... de sua habilidade na espada.
Ele se gaba de dormir comigo, você quer dizer. Mas Daario não seria tão tolo de vangloriar-se disso entre seus inimigos. Não importa. Neste momento, os yunkaítas devem estar marchando para casa. Fora por isso que ela fizera tudo o que fizera. Pela paz.
Virou-se para o caminho de onde tinha vindo, para onde Pedra do Dragão se erguia sobre as terras de grama como um punho cerrado. Parece tão perto. Estive andando por horas e, mesmo assim, parece que eu poderia alcançá-la e tocá-la. Não era muito tarde para voltar. Havia peixes no lago temporário na caverna de Drogon. Pegara um no primeiro dia ali, podia pegar mais. E haveria ossos despedaçados e carbonizados, com pedaços de carne ainda neles, os restos das matanças de Drogon.
Não, Dany disse para si mesma. Se olhar para trás, estou perdida. Podia viver anos entre as rochas cozidas pelo sol de Pedra do Dragão, montando nas costas de Drogon durante o dia e roendo suas sobras todo entardecer, enquanto o grande mar de grama passava de dourado para laranja, mas essa não era a vida para a qual nascera. Então, mais uma vez, virou as costas para o morro distante e fechou os ouvidos para a canção de voos e liberdade que o vento cantava enquanto brincava entre os cumes de pedra do morro. O córrego corria para sul e sudeste, tanto quanto podia dizer. Ela seguiu o curso. Leve-me para o rio, é tudo o que peço. Leve-me para o rio, e farei o resto.
As horas passavam lentamente. O córrego dobrava por aqui e por ali, e Dany seguia, marcando o tempo em sua perna com o chicote, tentando não pensar sobre quão longe tinha que ir, ou no latejar em sua cabeça, ou em sua barriga vazia. Dê um passo. Dê o seguinte. Outro passo. Outro. O que mais poderia fazer?
Estava quieto em seu mar. Quando o vento soprava, a grama suspirava, como se os caules roçassem uns nos outros, sussurrando em uma língua que apenas os deuses podiam entender. Agora e novamente o pequeno córrego borbulhava onde fluía ao redor de uma pedra. A lama saía em jatos entre seus dedos dos pés. Insetos zumbiam em volta dela, preguiçosas libélulas, brilhantes vespas verdes e mosquitos quase pequenos demais para se ver. Ela os golpeava distraidamente, quando pousavam em seus braços. Uma vez, foi para cima de um rato que bebia do córrego, mas ele fugiu quando ela apareceu, correndo entre os caules e desaparecendo na grama alta. Algumas vezes ouvia pássaros cantando. O som fazia sua barriga roncar, mas não tinha redes para fazer uma armadilha e, até agora, não vira nenhum ninho. Uma vez sonhei que estava voando, ela pensou, e agora já voei, e sonho em roubar ovos. Aquilo a fez gargalhar.
- Homens são loucos e deuses são mais loucos - disse para a grama, e a grama murmurou concordando.
Por três vezes naquele dia, ela avistou Drogon. Da primeira vez, ele estava tão longe que poderia ter sido uma águia, deslizando para dentro e para fora das nuvens distantes, mas Dany o reconhecia agora, mesmo quando não era mais do que um pontinho. Da segunda vez, ele passou diante do sol, as asas negras estendidas, e o mundo escureceu. Da última vez, ele voou bem sobre ela, tão perto que pôde ouvir o som de suas asas. Por meio segundo, Dany pensou que ele a estivesse caçando, mas ele voou sem tomar qualquer conhecimento dela e desapareceu em algum lugar no leste. Ainda bem, ela pensou.
A noite a pegou quase desprevenida. Enquanto o sol dourava os pináculos distantes de Pedra do Dragão, Dany tropeçou em um muro de pedra baixo, quebrado e coberto de mato. Talvez tivesse sido parte de um templo, ou o salão do senhor do vilarejo. Mais ruínas estavam além; um velho poço e alguns círculos na grama que marcavam os locais onde os casebres estiveram. Haviam sido construídos de lama e palha, ela julgou, mas longos anos de vento e chuva os desgastaram completamente. Dany encontrou oito antes que o sol desaparecesse, mas poderia haver mais por ali, escondidos na grama.
O muro de pedra durara mais que o resto. Embora não tivesse mais do que noventa centímetros de altura, o ângulo onde ele se encontrava com outra parede mais baixa ainda oferecia algum abrigo dos elementos, e a noite chegava rapidamente. Dany encolheu-se em um canto, fazendo um ninho com vários tipos de grama que cresciam ao redor das ruínas, arrancados aos punhados. Estava muito cansada, e novas bolhas haviam aparecido em seus pés, incluindo um conjunto combinado em cima dos seus dedos rosados. Deve ser do jeito que ando, pensou, dando uma risadinha.
Quando o mundo escureceu, Dany se instalou e fechou os olhos, mas o sono se recusava a vir. A noite estava fria, o chão duro, sua barriga vazia. Pegou-se pensando em Meereen, em Daario, seu amante, e Hizdahr, seu marido, em lrri e Jhiqui e na doce Missandei, em Sor Barristan, em Reznak e em Skahaz Cabeça-Raspada. Será que temem que eu esteja morta? Eu voei nas costas de um dragão. Eles pensarão que ele me comeu? Ela se perguntava se Hizdahr ainda era rei. A coroa dele vinha dela, ele poderia mantê-la em sua ausência? Ele queria Drogon morto. Eu o ouvi. “Matem ele”, ele gritava, “matem a besta”, e o olhar em seu rosto era lascivo. E Belwas, o Forte, estava de joelhos, arfando e estremecendo. Veneno. Tinha que ser veneno. Os gafanhotos no mel. Hizdahr insistiu que eu os provasse, mas Belwas comeu todos eles. Ela fizera de Hizdahr seu rei, levou-o para sua cama, abriu as arenas por ele, ele não tinha razão para querê-la morta. No entanto, quem mais poderia ter sido? Reznak, seu senescal perfumado? Os yunkaítas? Os Filhos da Harpia?
Ao longe, um lobo uivou. O som a fez se sentir triste e sozinha, mas não menos faminta. Quando a lua se ergueu sobre as terras da grama, Dany mergulhou finalmente em um sono agitado.
Ela sonhou. Todas as preocupações a deixaram, assim como todas as dores, e parecia flutuar em direção ao céu. Estava voando mais uma vez, rodopiando, rindo, dançando, enquanto as estrelas giravam em torno dela e lhe sussurravam segredos ao ouvido.
- Para ir para o norte, você deve viajar para o sul. Para alcançar o oeste, você deve ir para leste. Para ir adiante, você precisa ir para trás. Para tocar a luz, você precisa passar sob a sombra.
- Quaithe? - Dany chamou. - Onde você está, Quaithe?
Então ela viu. Sua máscara é feita da luz das estrelas.
- Lembre-se de quem você é, Daenerys - as estrelas sussurraram, em uma voz de mulher. - Os dragões sabem. Você sabe?
Na manhã seguinte, despertou dura, ferida e com dores, com formigas rastejando em seus braços, pernas e rosto. Quando percebeu que estavam ali, chutou de lado os gravetos e a grama marrom seca que haviam lhe servido de cama e lençol e fez um grande esforço para ficar de pé. Tinha mordidas por todo o corpo, pequenos inchaços vermelhos, inflamados e coçando. De onde vieram todas estas formigas? Dany se esfregou para tirá-las dos braços, das pernas e da barriga. Passou a mão pelo couro cabeludo, onde seu cabelo havia se queimado, e sentiu mais formigas na cabeça, e uma delas rastejando para baixo, pelo seu pescoço. Jogou-as no chão e as esmagou com seus pés descalços. Havia tantas ...
Descobriu que o formigueiro estava do outro lado da sua parede. Perguntava-se como as formigas conseguiram escalar tudo aquilo para encontrá-la. Para elas, essas pedras em ruínas deviam parecer tão grandes quanto a Muralha de Westeros. A maior muralha em todo o mundo, seu irmão Viserys costumava dizer, tão orgulhoso como se ele mesmo a tivesse construído.
Viserys contava para ela histórias de cavaleiros tão pobres que tinham que dormir sob as antigas sebes que cresciam ao longo dos caminhos secundários dos Sete Reinos. Dany teria dado muito e ainda mais por uma bela e grossa sebe. De preferência, uma sem um formigueiro.
O sol estava apenas nascendo. Algumas estrelas brilhantes permaneciam no céu cobalto. Talvez uma delas seja Khal Drogo, sentado em seu garanhão de fogo nas terras da noite e sorrindo para mim. Pedra do Dragão ainda estava visível sobre as terras da grama. Parece tão perto. Devo estar a quilômetros de distância agora, mas é como se eu pudesse estar de volta em uma hora. Ela queria se deitar, fechar os olhos e entregar-se ao sono. Não. Preciso continuar. O córrego. Apenas siga o córrego.
Dany levou um momento para se assegurar da direção. Não podia ir pelo caminho errado e perder seu córrego.
- Meu amigo - disse em voz alta. - Se permanecer perto do meu amigo, não me perderei.
Teria dormido ao lado da água, se ousasse, mas alguns animais iam ao córrego para beber durante a noite. Vira os rastros deles. Dany daria uma refeição minguada para um lobo ou um leão, mas mesmo uma refeição minguada era melhor do que nenhuma.
Assim que teve certeza de qual lado era o sul, contou os passos de volta. O córrego apareceu no oito. Dany colocou as mãos em concha para beber. A água fez sua barriga se contrair, mas cólicas eram mais fáceis de suportar do que a sede. Ela não tinha outra bebida que não o orvalho da manhã que brilhava na grama alta, e absolutamente nenhuma comida, a menos que gostasse de comer grama. Eu podia tentar comer formigas. As amarelinhas eram pequenas demais para garantir qualquer tipo de sustento, mas havia formigas vermelhas na grama, e aquelas eram maiores.
- Estou perdida no mar - disse, enquanto mancava ao lado do regato sinuoso - então, talvez, encontre alguns caranguejos, ou um belo e gordo peixe.
O chicote batia suavemente contra sua coxa, tap, tap, tap. Um passo por vez, e o riacho a levaria para casa.
Um pouco depois do meio-dia, chegou a um arbusto que crescia ao lado do córrego, seus galhos retorcidos cobertos com duras bagas verdes. Dany olhou para elas com desconfiança, então pegou uma e a mordiscou. Sua polpa era azeda e mastigável, com um gosto residual amargo que lhe pareceu familiar.
- No khalasar, eles usavam estas bagas para temperar os assados - lembrou-se.
Dizer isso em voz alta a fez ter mais certeza daquilo. Sua barriga roncava, e Dany pegou a si mesma arrancando as bagas com as duas mãos e enfiando-as na boca.
Uma hora mais tarde, seu estômago começou a se contrair tão violentamente que não pôde continuar. Passou o resto do dia vomitando gosma verde. Se ficar aqui, morrerei. Posso estar morrendo agora. Será que o deus cavalo dos dothrakis partira a grama e a reivindicara para seu khalasar estrelado, para que pudesse cavalgar nas terras da noite com Khal Drogo? Em Westeros, os mortos da Casa Targaryen eram dados às chamas, mas quem acenderia uma pira para ela ali? Minha carne alimentará os lobos e os corvos carniceiros, pensou, tristemente, e vermes cavarão meu ventre. Seus olhos se voltaram para Pedra do Dragão. Parecia menor. Podia ver fumaça se erguendo do cume esculpido pelo vento, a quilômetros de distância. Drogon retornou de sua caçada.
O pôr do sol a encontrou de cócoras na grama, gemendo. Cada uma de suas fezes era mais solta do que a anterior, e cheirava pior. Quando a lua chegou, estava evacuando água marrom. Quanto mais bebia, mais evacuava, mas, quanto mais evacuava, sua sede aumentava, e a sede a fez rastejar até o córrego para sugar um pouco de água. Quando finalmente fechou os olhos, Dany não sabia se teria forças suficientes para abri-los novamente.
Sonhou com seu irmão morto.
Viserys parecia exatamente como era da última vez que o vira. Sua boca estava retorcida de angústia, o cabelo estava queimado e o rosto estava negro e esfumaçado onde o ouro derretido escorrera por sua testa, bochechas e pelos olhos.
- Você está morto - Dany falou.
Assassinado. Embora os lábios dele não se movessem, de alguma forma podia ouvir sua voz, sussurrando no ouvido dela. Você nunca me velou, irmã. E duro morrer sem ser velado.
- Eu o amei uma vez.
Uma vez, ele disse, tão amargamente que a fez estremecer. Você devia ter sido minha esposa, me dar filhos com cabelos prateados e olhos cor de púrpura, manter o sangue do dragão puro. Tomei conta de você. Ensinei quem você era. Eu a alimentei. Vendi a coroa da nossa mãe para mantê-la alimentada.
- Você me machucava. Você me assustava.
Apenas quando você acordava o dragão. Eu amava você.
- Você me vendeu. Você me traiu.
Não. Você é a traidora. Você se virou contra mim, contra seu próprio sangue. Eles me trapacearam. Seu marido cavalo e seus bárbaros fedorentos. Eram trapaceiros e mentirosos. Me prometeram uma coroa de ouro e me deram isso. Ele tocou o ouro derretido que se espalhara por seu rosto, e a fumaça se levantou de seu dedo.
- Você podia ter tido sua coroa - Dany lhe disse. - Meu sol-e-estrelas a teria conquistado para você, se você tivesse esperado.
Eu esperei tempo demais. Esperei minha vida inteira. Eu era rei deles, o legítimo rei. Eles riram de mim.
- Você devia ter ficado em Pentos com o Magíster Illyrio. Khal Drogo teria me apresentado para o dosh khaleen, mas você não tinha que ir conosco. Essa foi sua escolha. Seu erro.
Quer acordar o dragão, sua putinha estúpida? O khalasar de Drogo era meu. Eu o comprei dele, mil gritadores. Paguei por eles com sua virgindade.
- Você nunca entendeu. Dothrakis não compram e vendem. Eles dão presentes e os recebem. Se você tivesse esperado ...
Eu esperei. Por minha coroa, por meu trono, por você. Todos estes anos, e tudo o que consegui foi um pote de ouro derretido. Por que deram os ovos de dragão para você? Eles deviam ter sido meus. Se eu tivesse um dragão, teria ensinado ao mundo o significado do nosso lema. Viserys começou a rir, até que sua mandíbula caiu de seu rosto, soltando fumaça, e sangue e ouro derretido escorreram de sua boca.
Quando ela acordou, ofegante, suas coxas estavam escorregadias de sangue.
Por um momento, não percebeu o que era aquilo. O mundo apenas começava a clarear, e a grama alta farfalhava suavemente ao vento. Não, por favor, deixe-me dormir mais. Estou tão cansada. Tentou se enterrar sob a pilha de grama que havia feito quando foi dormir. Alguns dos talos estavam molhados. Estava chovendo novamente? Sentou-se, com medo de ter se sujado enquanto dormia. Quando levou os dedos da mão ao rosto, pôde sentir o cheiro de sangue neles. Estou morrendo? Então viu a pálida lua crescente flutuando alta sobre a grama e percebeu que aquilo não era nada mais do que sangue da lua.
Se não estivesse tão doente e assustada, poderia ter sido um alívio. Em vez disso, começou a tremer violentamente. Esfregou os dedos na terra e agarrou um punhado de grama para secar entre as pernas. O dragão não chora. Estava sangrando, mas era apenas sangue de mulher. A lua ainda está crescente, no entanto. Como pode ser? Tentou se lembrar da última vez que havia sangrado. Na última lua cheia? Na anterior? Na anterior ainda? Não, não pode ter sido há tanto tempo assim.
- Sou o sangue do dragão - disse para a grama, em voz alta.
Antes, a grama sussurrou de volta, até que você acorrentou os dragões na escuridão.
- Drogon matou uma garotinha. O nome dela era ... seu nome... - Dany não conseguia se lembrar do nome da criança. Aquilo a deixou tão triste que teria chorado se todas as suas lágrimas não tivessem sido queimadas. - Nunca terei uma garotinha. Eu era a Mãe dos Dragões.
Sim, a grama disse, mas você se virou contra seus filhos.
Sua barriga estava vazia, os pés doloridos e com bolhas, e parecia que suas cólicas estavam ficando piores. Suas entranhas estavam cheias de cobras que se contorciam e mordiam seus intestinos. Pegou um punhado de lama e água com as mãos trêmulas. Ao meio-dia, a água estaria tépida, mas no frio do amanhecer era quase gelada e a ajudaria a manter os olhos abertos. Quando molhou o rosto, viu sangue fresco nas coxas. A bainha esfarrapada de sua túnica de baixo estava manchada com ele. A visão de tanto vermelho a assustou. Sangue da lua, é apenas meu sangue da lua, mas não se lembrava de ter um fluxo tão intenso. Poderia ser a água? Se fosse a água, estava condenada. Tinha que beber, ou morrer de sede.
- Ande - Dany ordenou a si mesma. - Siga o riacho e ele o levará ao Skahazadhan. É onde Daario encontrará você. - Usou toda a força que tinha para ficar em pé, e quando conseguiu, tudo o que pôde fazer foi ficar parada ali, febril e sangrando. Ergueu os olhos para o céu azul vazio, olhando o sol. Metade da manhã já se foi, percebeu, consternada. Obrigou-se a dar um passo, depois outro, e então estava caminhando novamente, seguindo o pequeno riacho.
O dia ficava mais quente, e o sol batia sobre sua cabeça e queimava o que restava de seus cabelos. A água espirrava contra a sola de seus pés. Estava caminhando no riacho. Por quanto tempo estava fazendo aquilo? A suave lama marrom era agradável entre os dedos e ajudava a aliviar as bolhas. No riacho ou fora dele, tenho que continuar andando. A água segue a jusante. O riacho me levará para o rio, e o rio me levará para casa.
Só que não, não realmente.
Meereen não era a casa dela, e nunca seria. Era uma cidade de homens estranhos, com deuses estranhos e cabelos estranhos, de senhores de escravos enrolados em tokars, onde a graça era obtida pela prostituição, a matança era uma arte, e cachorro era uma iguaria. Meereen sempre seria a cidade da harpia, e Daenerys não podia ser uma harpia.
Nunca, disse a grama, no tom rude de Jorah Mormont. Você foi advertida, Vossa Graça. Deixe a cidade, eu disse. Sua guerra é em Westeros, eu lhe falei.
A voz não era mais do que um murmúrio, mesmo assim, de algum modo, Daenerys sentia que ele estava andando bem atrás dela. Meu urso, ela pensou, meu doce e velho urso, que me amou e me traiu. Sentia tanta falta dele. Queria ver seu rosto feio, enrolar os braços em torno dele e se apertar contra seu peito, mas sabia que se virasse para trás, Sor Jorah teria partido.
- Estou sonhando - disse. - Um sonho acordada, um sonho acordada. Estou só e perdida.
Perdida, porque permaneceu em um lugar que não era para ser, murmurou Jorah Mormont, tão suavemente quanto o vento. Sozinha, porque me expulsou do seu lado.
- Você me traiu. Você dava informações sobre mim, por ouro.
Pelo lar. Lar era tudo o que sempre quis.
- E a mim. Você me queria. - Dany vira isso em seus olhos.
Queria, a grama sussurrou, com tristeza.
- Você me beijou. Eu nunca disse que podia, mas você fez. Você me vendeu aos meus inimigos, mas foi a sério que me beijou.
Eu lhe dei bons conselhos. Consegui suas lanças e espadas para os Sete Reinos, eu lhe disse. Deixe Meereen para os meereeneses e vá para oeste, eu falei. Você não ouviu.
- Eu tinha que tomar Meereen ou ver meus filhos morrerem de fome ao longo da marcha. - Dany ainda podia ver a trilha de cadáveres que deixara para trás quando cruzara o deserto vermelho. Não era uma visão que desejava ter novamente. - Tive que tomar Meereen para alimentar meu povo.
Você tomou Meereen, ele retrucou, e, mesmo assim, permaneceu.
- Para ser uma rainha.
Você é uma rainha, seu urso disse. Em Westeros.
- É um caminho muito longo - ela reclamou. - Eu estava cansada, Jorah. Estava farta da guerra. Queria descansar, rir, plantar árvores e vê-las crescer. Sou apenas uma garota jovem.
Não. Você é o sangue do dragão. O sussurro estava ficando mais baixo, como se Sor Jorah estivesse ficando para trás. Dragões não plantam árvores. Lembre-se disso. Lembre-se de quem você é, para o que você foi feita. Lembre-se do seu lema.
- Fogo e Sangue - Daenerys disse para a grama que balançava.
Uma pedra virou embaixo de seu pé. Tropeçou, caiu sobre um joelho e gritou de dor, na esperança de que seu urso viesse até ela e a ajudasse a ficar em pé. Quando virou a cabeça para olhá-lo, tudo o que viu foi a água corrente marrom ... e a grama, ainda se movendo um pouco. O vento, disse para si mesma, o vento agita os caules e os fazem balançar. Só que nenhum vento estava soprando. O sol estava a pino, o mundo imóvel e quente. Mosquitos invadiam o ar, e uma libélula voava sobre o riacho, pousando aqui e ali. E a grama se movia quando não havia motivo para se mover.
Tateou na água, encontrou uma pedra do tamanho de seu punho, tirou-a da lama.
Era uma arma frágil, mas melhor do que uma mão vazia. Do canto do olho, Dany viu a grama se mover novamente, bem à sua direita. A grama balançava e se inclinava, como se estivesse diante de um rei, mas nenhum rei apareceu para ela. O mundo estava verde e vazio. O mundo estava verde e silencioso. O mundo estava amarelo, morrendo. Eu devia me levantar, disse a si mesma. Tenho que andar. Tenho que seguir o riacho.
Através da grama veio um suave tilintar de prata.
Sinos, Dany pensou, sorrindo, lembrando-se de Khal Drogo, seu sol-e-estrelas, e os sinos trançados em seus cabelos. Quando o sol nascer no ocidente e se puser no oriente, quando os mares secarem e as montanhas forem sopradas pelo vento como folhas, quando meu ventre voltar a ganhar vida para dar à luz um filho vivo, Khal Drogo retornará para mim.
Mas nenhuma daquelas coisas acontecera. Sinos, Dany pensou novamente. Seus companheiros de sangue a haviam encontrado.
- Aggo - murmurou. - Jhogo. Rakharo. - Daario teria vindo com eles?
O mar de grama se abriu. Um cavaleiro apareceu. Sua trança era negra e brilhante, a pele tão escura quanto cobre polido, os olhos no formato de amêndoas amargas. Sinos tocavam em seu cabelo. Ele vestia um cinto de medalhões e um colete pintado, tinha um arakh em um quadril e um chicote no outro. Um arco de caça e uma aljava de flechas estavam pendurados em sua sela.
Um cavaleiro, e sozinho. Um batedor. Era quem cavalgava diante do khalasar para encontrar a caça e a grama bem verde, e farejar inimigos onde quer que pudessem estar escondidos. Se a encontrasse ali, ele a mataria, a estupraria, ou a escravizaria. Na melhor das hipóteses, ele a mandaria de volta para as anciãs do dosh khaleen, aonde supunha-se que as boas khaleesi deveriam ir depois que seus khals morriam.
Ele não a vira, no entanto. A grama a escondeu, e ele estava olhando para outro lado. Dany seguiu seu olhar, e a sombra voou, com suas asas estendidas. O dragão estava a quilômetros de distância, e mesmo assim o batedor congelou até que seu garanhão começou a relinchar de medo. Então despertou, como se estivesse sonhando, virou sua montaria e correu pela grama alta a galope.
Dany o observou partir. Quando o som dos cascos tinham sumido no silêncio, começou a gritar. Gritou até que sua voz ficou rouca ... e Drogon veio, bufando nuvens de fumaça. A grama se prostrou diante dele. Dany saltou em suas costas. Ela fedia a sangue, fedor e medo, mas nada disso importava.
- Para seguir em frente, tenho que voltar para trás - disse. Suas pernas nuas se apertaram no pescoço do dragão. Ela o chutou, e Drogon atirou-se no céu. Seu chicote se perdera, então usou as mãos e os pés para virá-lo para noroeste, o caminho que o batedor tomara. Drogon foi com suficiente boa vontade; talvez tivesse sentido o medo do cavaleiro.
Em uma dúzia de segundos, ultrapassaram o dothraki, que galopava bem abaixo. Para a direita e para a esquerda, Dany vislumbrava lugares em que a grama havia sido queimada e transformada em cinzas. Drogon já veio por este caminho, percebeu. Como uma corrente de ilhas cinzentas, as marcas de suas caçadas pontilhavam o mar de grama verde.
Um vasto rebanho de cavalos apareceu embaixo deles. Havia cavaleiros também, um grupo ou mais, mas eles se viraram e fugiram ao primeiro sinal do dragão. Os cavalos pararam e fugiram quando a sombra passou sobre eles, galopando através da grama até que suas laterais ficassem brancas de espuma, rasgando o chão com seus cascos ... mas por mais velozes que fossem, não podiam voar. Logo um cavalo começou a ficar para trás. O dragão desceu sobre ele, rugindo, e imediatamente a pobre besta estava em chamas, mas, de alguma forma, continuou correndo, gritando a cada passo, até que Drogon pousou sobre ele e quebrou seu pescoço. Dany agarrou o pescoço do dragão com todas as suas forças, para não escorregar.
A carcaça era muito pesada para que pudesse levar para sua toca, então Drogon consumiu sua caça ali, rasgando a carne carbonizada enquanto a grama queimava ao redor deles, o ar grosso com a fumaça que subia e com o cheiro de pelo de cavalo queimado. Dany, faminta, desceu de suas costas e comeu com o dragão, arrancando pedaços de carne defumada do cavalo morto com as mãos queimadas e nuas. Em Meereen eu era uma rainha, em sedas, mordiscando tâmaras e cordeiro no mel, lembrou-se. O que meu nobre marido pensaria se pudesse me ver agora? Hizdahr ficaria horrorizado, sem dúvida. Mas Daario ...
Daario daria risada, tiraria um pedaço de carne de cavalo com seu arakh e se agacharia para comer ao lado dela.
Quando o céu no ocidente ficou com a cor de um hematoma sangrento, ouviu o som de cavalos se aproximando. Dany se levantou, limpou as mãos na túnica esfarrapada e foi para o lado do dragão.
Foi como Khal Jhaqo a encontrou, quando meia centena de guerreiros montados emergiram das nuvens de fumaça. 

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