segunda-feira, 8 de julho de 2013

POLLYANNA - Capítulo XXV - O jogo de espera


No dia seguinte à visita de John Pendleton, Miss Polly começou preparar Pollyanna para a visita do especialista.
– Pollyanna, minha querida – começou ela docemente – decidimos que outro médico, além do doutor Warren, deve examiná-la. Talvez ele possa nos dizer algo novo para tornar a sua recuperação mais rápida.
Uma luz de felicidade iluminou o rosto de Pollyanna.
– O doutor Chilton! Ah, tia Polly, gosto tanto do doutor Chilton! Sempre quis que ele viesse, mas estava receosa que a senhora não quisesse por tê-la visto no solário naquele dia. Foi por isso que eu não disse nada. Mas estou muito contente que a tia queira que ele venha me ver!
Primeiro a tia Polly ficou branca, depois vermelha e depois, de novo branca. Mas quando falou, mostrava claramente que estava tentando falar com naturalidade e alegria.
– Não, querida! Eu não me referia ao doutor Chilton. É outro médico, um médico muito famoso de Nova Yorque que conhece muito sobre ferimentos como os teus.
O rosto de Pollyanna mostrava seu desapontamento.
– Não acredito que ele saiba metade do que sabe o doutor Chilton.
– Ah, sabe sim, tenho certeza, querida.
– Mas foi o doutor Chilton que cuidou da perna quebrada de Mr. Pendleton. Se não se importar, eu gostaria que o doutor Chilton viesse me visitar!
Miss Polly ficou embaraçada. Por momentos, não disse nada, depois, respondeu amavelmente, embora com um toque do seu antigo tom de seriedade:
– Mas eu me importo, Pollyanna, me importo muito. Por você sou capaz de fazer qualquer coisa que for preciso, mas tenho razões, que não quero falar agora, para não chamar o doutor Chilton e você deve acreditar que ele não sabe tanto como este médico que vem de Nova Iorque amanhã.
Pollyanna olhava pouco convencida.
– Mas, tia Polly, se a senhora amasse o doutor Chilton...
– O quê? – a voz da tia Polly soou muito áspera. E também estava muito vermelha.
– Eu dizia: se uma pessoa amasse o doutor Chilton e não amasse o outro, acho que isso faria muita diferença no tratamento. E eu amo o doutor Chilton.
Nesse momento, a enfermeira entrou no quarto e a tia se levantou bruscamente com uma expressão de alívio.
– Sinto muito, Pollyanna, mas receio que seja eu que julgue o que convém fazer. Além disso, já está tudo combinado. O médico de Nova Iorque chega amanhã.
Mas isso não aconteceu. O médico não veio no dia seguinte. No último momento receberam um telegrama comunicando que o próprio especialista tinha adoecido e não poderia vir por enquanto. Isto levou Pollyanna a insistir na substituição dele pelo doutor Chilton.
A tia Polly, entretanto, balançava a cabeça e dizia um “não querida” bastante decisivo, mesmo depois de declarar que faria qualquer coisa, tudo mesmo, para agradar a querida Pollyanna.
E enquanto os dias passavam Miss Polly, de fato, empenhava-se em fazer tudo quanto possível para agradar sua sobrinha.
– Eu nem queria acreditar – dizia Nancy ao velho Tom numa manhã. – A Miss Polly está permanentemente ansiosa em fazer qualquer coisa que agrade à menina, já deixa até subir o gato e o cão deixando-os passear em cima da cama da menina Pollyanna! E quando não tem mais nada que fazer, anda pelo quarto de um lado para o outro com os vidrinhos fazendo “a dança do arco-íris”, como a menina chama. Já mandou o Timothy comprar flores por três vezes e, no outro dia, encontrei-a sentada na cama com a enfermeira a penteá-la, seguindo as instruções de Miss Pollyanna. Juro que daqui por diante Miss Polly não usará outro penteado. Será só aquele que Miss Pollyanna gosta, aquela menina abençoada.
O velho Tom deu uma risada.
– Bem, eu também fiquei surpreendido quando vi Miss Polly muito bonita com aqueles cachos na testa – observou ele friamente.
– Claro que está muito melhor! – respondeu Nancy indignada. – Até parece gente. Agora ela é quase...
– Cuidado, Nancy – advertiu o velho jardineiro, com um sorriso. – Lembra quando eu disse que ela era bonita?
Nancy encolheu os ombros.
– Ela não é bonita, mas pelo menos não parece a mesma mulher.
– Eu disse que ela não era velha.
– É verdade. E eu respondi que se não era velha, imitava muito bem até Miss Pollyanna chegar. Diga, Mr. Tom, quem era o namorado dela? Ainda não consegui descobrir!
– Não conseguiu? – perguntou o velho, olhando-a com um olhar estranho. – Bem, acho que não será comigo que vais descobrir alguma coisa.
– Ah, Mr. Tom, tem muita gente por aí para perguntar.
– Talvez, mas pelo menos eu nunca vou dizer nada – resmungou o velho Tom. Depois, bruscamente, a luz dos seus olhos se apagaram. – Como está a menina hoje?
Nancy abanou a cabeça. O rosto também se fechou numa expressão triste.
– Está na mesma. Não se nota diferença nenhuma. Continua deitada, conversa alguma coisa, tenta ficar contente porque o sol ou a lua nasce ou por qualquer outro pretexto. É de partir o coração.
– Eu sei, é o jogo – disse o velho Tom.
– Ela também lhe contou sobre o jogo?
– Ah, sim, há muito tempo – o velho hesitou, e depois prosseguiu: – Um dia, quando eu estava resmungando e me lamentando por estar todo arqueado, a menina me contou.
– Essa eu não posso adivinhar. Como é que um velho todo arqueado pode ficar contente com isso?
– Ela arranjou uma maneira. Disse que eu devia ficar contente por não ter que me dobrar tanto para fazer o meu trabalho, porque já estava parcialmente curvado.
Nancy deu uma risada.
– Bem, isso não me surpreende. Ela sempre descobre alguma coisa. Desde que chegou que nós fazemos esse jogo, pois não havia mais ninguém com quem ela pudesse jogar, embora tivesse falado à tia.
– A Miss Polly?
Nancy disse que sim com a cabeça.
– A sua opinião sobre ela não deve ser muito diferente da minha – observou Nancy piscando o olho.
– Eu só estava pensando como esse jogo seria uma surpresa para ela – explicou ele com certa dignidade.
– Sim, acho que sim – retorquiu Nancy – mas não sei se agora ainda seria uma surpresa. Eu já não duvido de mais nada e até acredito que tudo é possível com a patroa, até mesmo ela jogar o jogo!
– Mas a menina ainda não lhe contou? Ela já ensinou o jogo para quase todo mundo. Desde que teve o acidente só se ouve falar nisso – disse Tom.
– Ela não contou para Miss Polly porque a senhora não queria que ela falasse do pai e, como foi um jogo ensinado pelo pai, ela tinha que falar dele e, por isso, nunca lhe ensinou o jogo.
– Ah, entendi – murmurou o velho balançando a cabeça. – Ninguém da família gostava do pastor que levou Miss Jenny embora. E Miss Polly, que era a mais nova e gostava muito de Miss Jenny, nunca o perdoou. Esse mundo...
– Sim, está tudo de cabeça para baixo – suspirou Nancy, voltando para a cozinha.
Aqueles dias de espera não foram fáceis para ninguém. A enfermeira tentava aparentar alegria, mas os olhos denunciavam preocupação. O médico revelava nervosismo e impaciência. Miss Polly pouco falava, mas mesmo os cachos do cabelo que lhe caíam sobre o rosto e os lindos laços no pescoço não escondiam o fato dela estar mais magra e mais pálida a cada dia. Quanto a Pollyanna, acariciava o cachorro e o gato, admirava as flores, comia as frutas e os doces que lhe mandavam e respondia às inúmeras mensagens de carinho que lhe traziam. Mas também estava cada vez mais magra e pálida, e a atividade nervosa dos seus braços e das mãozinhas apenas realçava a imobilidade dos membros inferiores sob os cobertores.
Quanto ao jogo, Pollyanna dissera a Nancy, num desses dias, como ficaria contente quando pudesse voltar à escola, visitar Mrs. Snow e Mr. Pendleton, andar de charrete com o doutor Chilton, etc. Parecia não se dar conta de que todo esse contentamento era no futuro e não no presente. Nancy, porém, dava-se conta disso e chorava quando ficava sozinha.

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